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Jumento vira produto de exportação

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José de Paiva Rebouças
Jornal de Fato

Depois do melão, do camarão e do sal, o Rio Grande do Norte pode se tornar uma potência na exportação de jumentos. Há pelo menos oito meses, o Governo do Estado assinou um protocolo de intenções com a China para fornecer os animais que serão usados na indústria de alimentos e cosmético. A pretensão dos chineses é importar 300 mil asnos do Brasil por ano e o RN quer abocanhar ao menos 20% dessa fatia.

No Nordeste, os asiáticos garantiram a compra dos animais e até chegaram a discutir com políticos locais a criação de uma linha de crédito específica, que levaria o nome de Projegue. Atualmente, os chineses abatem 1,5 milhão de jumentos, de todas as raças, produzidos no próprio país, na Índia e Zâmbia.

O secretário-adjunto de Agricultura do Rio Grande do Norte, José Simplício Holanda, acredita que a comercialização de jumentos é uma ótima oportunidade para aquecer o mercado nordestino, mas ele alerta que só valerá a pena o comércio se o preço realmente for adequado e compatível com o mercado. “Pode-se tomar por base a arrouba de boi, chegando a 50% do valor atual”, sugere. O jumento adequado para o abate, segundo Simplício, tem em média quatro arrobas (60 quilos).

Simplício acredita que leva de três a cinco anos para que a cadeira produtiva asinina seja organizada no Estado, visto que o animal está muito desvalorizado devido a sua substituição pelos veículos, como trator, caminhonete e até motocicletas.

A demora no tempo de avaliação da proposta, solicitada pelos chineses, é algo que vem incomodando o Governo, que já pensa até que isso não virá mais. Mas, notícia veiculada recentemente na imprensa nacional deu conta de que já foi liberado o intercâmbio de asnos entre os dois países.

Com a desvalorização da tração animal no Nordeste, o jegue passou a ser rejeitado pelos trabalhadores e fazendeiros. Sem donos, é comum encontrar esses animais soltos pelas estradas, provocando graves acidentes de trânsito. Para Simplício Holanda, a comercialização do animal seria uma forma de reduzir esse problema, visto que os criadores teriam mais cuidado de não deixá-los fora dos currais.

Depois que essa notícia circulou em nível nacional, na última semana, o secretário-adjunto de Agricultura do RN recebeu vários e-mails de protestos. “As pessoas saem em defesa do animal, achando que sou eu o responsável pelo comércio”, explica Simplício Holanda.

Ele lembrou que o abate de animal é uma atividade comum no Brasil. Além do frango, do suíno e do boi, Simplício cita os bezerros que são abatidos para a fabricação de salsicha e o chamado “borrego mamão”, abatido com 15 ou 20 dias de nascido para ser servido como prato nobre.

Japão foi um dos primeiros importadores

Não é a primeira vez que os asiáticos se interessam pelos jumentos nordestinos. Há cerca de 20 anos, os japoneses começaram a comprar esses animais para o consumo humano. Os primeiros atravessadores eram de Belo Jardim (PE), que compravam os animais indiscriminadamente. Essa prática estava exterminando os rebanhos nordestinos porque os índices de abate eram de 7,25%, contra um crescimento de 4,5%. Um dos fatores para isso era o preço, que, na época, representava um décimo do valor do boi.

Para frear o ato predatório, um grupo de criadores fundou, em 1978, a Associação Brasileira de Criadores de Jumento Nordestino. Desde então, foi feita toda uma movimentação junto ao Ministério da Agricultura para evitar o desaparecimento do animal. Uma das medidas foi a portaria 980, que proibiu o abate de jumentas capazes de se produzir.

Ainda assim, na década de 1980, o comércio acabou por falta de matéria prima. A redução do rebanho foi brusca em todo o Nordeste, caindo de 4,5 milhões de cabeças em 1967 para pouco mais de 1,2 milhão em 1978. O RN, que em 1967 tinha 180 mil jumentos, terminou o ano de 1978 com menos de 52 mil.

Esses animais eram encaminhados para 16 abatedouros em todo o Brasil, desde o Paraná até o Maranhão. Os principais clientes do Nordeste eram de Pernambuco e Minas Gerais. “No pico, os abatedouros chegaram a sacrificar 760 mil cabeças”, disse Fernando Viana, que esteve à frente da única pesquisa brasileira com esse fim.

 Aposentado, o professor critica o abandono desse animal pelo nordestino. “É preciso se lembrar que o Nordeste foi feito pelo jumento”, argumenta. De acordo com ele, esse interesse repentino pelo animal é apenas “um modismo”, e defende um programa mais sério de valorização do jumento como instrumento de trabalho e matéria prima de exportação.

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