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Liminares nem sempre são justas

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BRA - Walter Folegatti conseguiu garantir obra de hotel na Via Costeira através de uma liminar judicial
Anna Ruth Dantas e Everton Dantas – Repórteres

Por uma liminar, parentes conseguem permanecer em cargos comissionados. Através desse tipo de instrumento jurídico construções são impedidas de serem feitas e outras têm assegurada sua continuidade. Por força de liminares, lagoas de sistemas de esgotamento são construídas, mesmo com argumentos técnicos indicando o prejuízo ao meio ambiente.

Um “remédio jurídico” comumente usado por advogados, Ministério Público e juízes, as liminares, em algumas circunstâncias, mostram-se uma “faca de dois gumes”. “A liminar precisa ter a ‘fumaça do bom direito’ e mostrar o perigo da demora”, comenta a promotora de Defesa do Meio Ambiente, Rossana Sudário.

Para ela, o perigo da demora está no foco do meio ambiente. Ela chama atenção para liminares que permitem a construção de casas em cima de dunas. “Depois do julgamento do mérito como recompor essa duna?”, questiona a promotora. O procurador geral do Município, Waldeni Xavier, também parte para esse argumento. “O meio ambiente é de difícil recuperação. A demora das ações coloca em risco, por isso a necessidade de liminares”, comenta.

Rossana Sudário lembra que há seis anos entrou com uma ação para impedir a instalação da estação de tratamento de esgoto de Ponta Negra em um terreno próximo a Lagoinha. No início conseguiu uma liminar suspendendo a obra, depois a Justiça cancelou. Hoje o processo ainda não teve seu julgamento do mérito.

Também por força de uma liminar, o hotel do grupo BRA, que está sendo construído na Via Costeira não teve sua obra paralisada. A Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo (Semurb) embargou a obra por considerar ilegal a construção do terceiro pavimento. A proibição não durou muito. Através de uma liminar o empreendimento continua sendo erguido. O que acontecerá se o julgamento do mérito for favorável à SEMURB? “O andar construído a mais terá que ser demolido”, explica Rossana Sudário.

Liminares são instrumento de uso legítimo

A TRIBUNA DO NORTE entrevistou representantes de entidades ligadas à Justiça no Rio Grande do Norte para questionar sobre o uso das liminares no judiciário potiguar. Todos foram unânimes em ressaltar a necessidade da liminar como instrumento, e avaliaram o possível “mau uso” que advogados e juízes podem fazer desse “remédio jurídico”.

O procurador-geral de Justiça, José Alves, considera que as liminares bem apreciadas, mostram ponderação do magistrado para o pedido relatado. Ele discorda do termo “indústria de liminares”. Para o conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil, Luís Gomes, a principal preocupação é na conduta irregular de advogados e juízes. “O advogado usar a liminar é legítimo. Mas há casos que verificamos condutas irregulares”.

O procurador Geral do Município, Waldeni Xavier, defende o instrumento da liminar como um objeto que dá “equilíbrio às partes”. Para ele não há indústria de liminares porque elas podem ser revogadas. Daniel Pessôa, avalia que o problema não está no instrumento da liminar em si, mas no “mau uso” .

Empresário consegue garantir obra

Muitas vezes o instrumento da liminar é a única alternativa para um empresário que vê seu direito atingido. Com a construção de um grande hotel em andamento – o que representa um investimento de R$ 50 milhões – o presidente do Grupo BRA, Walter Folegatti, viu-se com um grande problema quando a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Serviços Urbanos (Semurb) embargou sua obra na Via Costeira.

A Semurb emperrou o projeto do grupo BRA e durante quase 60 dias a obra do Natal Praia Resort, ficou paralisada por completo. A solução para o problema? Só houve uma: entrar com uma ação na Justiça, incluindo um pedido de liminar. Superando o embargo, a requisição foi deferida. A obra foi retomada e está sendo feita com o poder da liminar.

O presidente da BRA não teme pelo julgamento do mérito, já que a obra está amparada na legalidade e sem qualquer problema. “Lamentável é que os órgãos de Natal tenham feito esse embargo. Um hotel que deveria ser inaugurado em junho terá um atraso de quatro meses”, comenta. A briga jurídica não se encerrou com a liminar. A Prefeitura recorreu com um agravo de instrumento, que também foi negado. Mas a decisão do mérito ainda é aguardada. “Se a Prefeitura ganhar no julgamento do mérito, entendo que o que estiver errado terá que ser demolido”, comenta o procurador geral do Município, Waldeni Xavier.

Já tramita na 3ª Vara da Justiça Federal uma ação civil pública com pedido de liminar, onde o procurador da República, Fábio Nesi Venzon, pede a anulação do licenciamento para construção da obra. No processo, que ainda não foi apreciado pelo juiz Francisco Barros, o procurador ressalta que o projeto do hotel apresentado para licenciamento ambiental é diferente do que está sendo executado. Fábio Venzon observa que a área de construção prevista era 14.815,94 metros quadrados. Mas a que está sendo erguida é 28.984,69.

Amaury de Souza Sobrinho: “Liminares representam avanço”

Ninguém melhor para falar sobre o assunto “liminar” que um presidente de tribunal de justiça, Na entrevista a seguir, o presidente do TJ-RN, desembargador Amaury de Souza Moura Sobrinho, avalia o tema e esclarece que as liminares representam um avanço para o ordenamento jurídico brasileiro; e dependem de boa argumentação para serem concedidas.

TRIBUNA DO NORTE: Quando as liminares começaram a ser usadas?
Amaury de Souza Sobrinho: As liminares decorrem dos princípios constitucionais. Evidentemente que elas já eram previstas em legislações anteriores desde a lei do mandado de segurança, que é da década de 50 e já previa o uso de liminar. Não é algo assim tão recente. Agora, a partir da Constituição de 1988 se deu mais amplitude à questão da concessão de liminares. Hoje, basicamente, elas repousam no princípio constitucional que é o da inafastabilidade do Poder Judiciário, do controle do Poder sobre a possibilidade de lesão ao direito da parte

Houve crescimento no uso de liminares?
ASS: Houve sim. Primeiro pelo aumento na procura pelo Poder Judiciário. Depois pela ampliação que se deu no uso de liminares.

Há exagero no uso de liminares?
ASS: Eu penso que não. Porque a pretensão à liminar não pode ser destituída de uma fundamentação. Tem de ter uma fundamentação legal. O que ocorre é que quem está fora dos processo às vezes tem uma visão diferente porque às vezes tem uma notícia genérica a respeito do que realmente ocorre. Às vezes essa visão está distante da questão jurídica que está sendo debatida no processo.

Há algum estudo visando aprimorar mais o uso desse recurso?
ASS: Eu desconheço. E não sei se seria adequado porque as liminares foram um grande avanço no nosso ordenamento jurídico. Por que há questões que as partes não podem esperar o mérito.

Em alguns casos as liminares atrapalham o julgamento de ações?
ASS: Não posso deixar de reconhecer que há isso sim. Pelo menos no que diz respeito à discussão do mérito. Mas se faz em nome de se evitar um prejuízo irreparável das partes.

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