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Longe dos olhos

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Diógenes da Cunha Lima Neto
advogado

De barraco em barraco, a favela cresce. É como num passe de mágica: uma invasão loteia o terreno e começam a pipocar centenas de casinhas. Logo, logo surge uma comunidade. Quase sempre distantes, escondidas, longe dos olhos. Tanto que muitos turistas acreditam que Natal não tem favela. Engano deles, a capital potiguar possui 73 favelas e a tendência é aumentar. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), 10% da população natalense moram em favelas, geralmente sem asfalto, esgoto e água encanada.

Como constatado, urbanizar uma favela é muito mais caro que planejar moradias populares dignas e sustentáveis. Todos merecem a oportunidade de morar bem, de educação e emprego para gerar renda. No entanto, 38% da área disponível na capital potiguar é de proteção ambiental.  A sociedade precisa de partes dessas áreas para viver ou elas virarão novas favelas.

A Organização Mundial da Saúde recomenda 12 m2 de área verde por habitante, Natal tem só de ZPA 64.000.000,00 de m2, seis vezes mais a recomendação da OMS. Será que em parte destas ZPA´S não tem capacidade de suporte ambiental para ser construídas habitações de interesse social.

Sabe-se que é preciso conter a expansão de favelas em áreas de preservação ambiental, cada vez mais invadidas de forma desorganizada e ilegal. As favelas crescem rapidamente, exigindo fiscalização constante para evitar que invadam os domínios de preservação. Não defendo que se ateie fogo nos barracos, mas tem de impedir antes de a comunidade se estabelecer. À ineficácia da fiscalização se junta a morosidade da Justiça. A pressão da favelização sobre áreas ambientais deveria ser uma das principais preocupações de qualquer  prefeitura.

As ações de planejamento urbano da cidade do Natal não acompanharam a demanda por área urbanizada. As políticas públicas voltadas à habitação não conseguiram atingir a toda a população. A falta ou deficiência dessas políticas permite o surgimento de assentamentos urbanos clandestinos em áreas de interesse ambiental.

O conflito entre o interesse público em garantir o ambiente equilibrado para as presentes e futuras gerações (defendido pelos ambientalistas, cientistas e protegido pela lei), o interesse particular de proprietários pela exploração imobiliária e a pressão social por moradia, nas áreas protegidas, se acirra cada vez mais com a participação dos diversos atores sociais.

A tolerância pelo Estado em relação à ocupação ilegal, pobre e predatória de áreas de proteção ambiental ou demais áreas públicas, por parte das camadas populares, está longe de significar uma política de respeito aos carentes de moradia ou aos direitos humanos. A população que aí se instala não compromete apenas os recursos que são fundamentais a todos os moradores da cidade, como é o caso dos mananciais de água. Mas ela se instala sem contar com qualquer serviço público ou obras de infraestrutura urbana.

Grandes partes das áreas urbanas de proteção ambiental estão ameaçadas pela ocupação com uso habitacional pobre, por absoluta falta de alternativas. As consequências de tal processo atinge toda a cidade, antes que a exceção vire a regra, temos que buscar soluções e não só apontar os problemas.

São muitos os responsáveis por toda essa situação e a dissipação dessa responsabilidade leva ao sentimento de que não há responsáveis. Nenhum segmento sente-se culpado pela situação. A complexidade que envolve os aspectos sociais, econômicos, políticos e jurídicos inerentes ao conflito estabelecido em invasões em áreas de preservação ambiental apontam para a dificuldade de se chegar a uma solução que salvaguarde o ambiente, proteja o cidadão carente de moradia e o proprietário do terreno. No ponto de vista de todos os atores envolvidos, parece uma crônica sobre uma morte anunciada.

O problema está longe dos olhos, mas perto do coração daquele que degrada o meio ambiente para construir seu barraco, que poderia muitas vezes ser a realização de seu maior sonho, se todos buscassem para todos no planejamento e não no colírio. Um Lar.

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