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Lula critica greve e nega 3º mandato

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ENTREVISTA - O presidente Lula  da Silva garantiu que não quer alterar a Constituição para se manter no cargo

Brasília (ABr) – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva concedeu ontem a primeira entrevista coletiva do segundo mandato, 135 dias após a posse. Em cerca de uma hora e meia, Lula respondeu perguntas de 15 jornalistas. Falou sobre o conceito do governo de coalizão, as greves de servidores públicos e o debate sobre o aborto. Foi indagado diversas vezes pelos jornalistas sobre o futuro político do país e sobre como vai se posicionar na eleição de 2010. Reafirmou a posição contra a reeleição e uma possível mudança constitucional para permitir um terceiro mandato. Admitiu que vai trabalhar para fazer o sucessor e reconheceu que este não precisa ser do Partido dos Trabalhadores.

“Não é por nada não, é porque a Constituição não permite. A lei não permite e eu acho imprudente alguém tentar apresentar qualquer mudança permitindo um terceiro mandato”, disse. Afirmou ainda que, embora tenha sido contrário à reeleição, criada durante o governo FHC, acabou “obrigado” a se candidatar a um novo mandato “porque a situação política exigia”. Questionado sobre a possibilidade de fazer um sucessor, Lula respondeu: “Meu Deus, eu esqueci de perguntar para o papa. Mas eu posso dizer para vocês que eu quero fazer o sucessor e por uma razão muito simples: porque eu quero que tenha continuidade o que nós estamos fazendo no país”.

A primeira pergunta dos jornalistas foi sobre a proposta de regulamentação de greve dos servidores públicos. Lula disse o governo pretende “responsabilizar” o direito de greve no Brasil. De acordo com ele, a paralisação no setor público não pode ser feita como na fábrica, pois nesse caso o prejuízo não é do patrão, e sim dos brasileiros, que deixam de ter acesso a assistência médica, transporte coletivo e educação.

Lula também voltou ao tema da legalização do aborto. Colocou-se contra o aborto como cidadão, mas defendeu que o Estado tenha uma política pública “adequada” para a população que tenha uma gravidez indesejada. “Acho que essa legislação [que define os casos que o aborto é permitido] não trata da veracidade dos acontecimentos do país. Todos vocês sabem, todo cidadão católico ou não sabe que existe no Brasil uma quantidade exagerada de jovens e pessoas que praticam aborto porque tiveram uma gravidez indesejada. Não apenas porque foram violentadas. Porque às vezes ficaram grávidas e não querem ter um filho”, disse.

No campo internacional, o presidente reforçou a postura adotada durante o primeiro mandatosobre a integração regional. A prioridade, segundo ele, é a integração da América Latina, que consistiu até agora no fato de que houve crescimento das economias e discussão de temas comuns. “Todas as economias do continente cresceram e, ao mesmo tempo, deixamos de estar de costas uns para os outros. A relação comercial com os vizinhos é maior do que em relação a Estados Unidos e Europa, embora estas tenham crescido em média 20%.”

Fez também um enfático discurso contra a idéia de culpar os Estados Unidos pelas mazelas dos demais países do continente americano e colocou a responsabilidade nas elites. Os latino-americanos precisam buscar as causas do subdesenvolvimento internamente, olhar para o próprio umbigo, e não ficar culpando somente o “imperialismo” dos Estados Unidos. As elites latino-americanas são culpadas por governos que não distribuíram riquezas e não fizeram investimentos necessários. “Durante muito tempo, todos os discursos que eu fazia era o imperialismo americano que era o responsável pela minha pobreza, pelo meu analfabetismo, e de repente descobri que o problema não era o imperialismo”.

Num dia simbólico para a questão cambial, em que a cotação do dólar caiu abaixo de R$ 2, Lula defendeu o câmbio flutuante e afirmou que o governo pode até criar condições para que as empresas se fortaleçam frente à concorrência internacional, mas frisou que não existe “mágica” na política econômica. Leia abaixo os principais trechos da entrevista coletiva.

Segurança pública

“A questão da segurança pública não é o foco principal do governo federal. O governo federal só entra quando é pedido. Foi o caso do Espírito Santo e agora do Rio de Janeiro. É um problema delicado. Não foram poucas as coisas que a gente criou para a juventude brasileira. Vamos precisar discutir não só a questão do jovem, mas também da família. Uma questão de tempo de você combater o crime organizado. Quando chegar o Pan, nós vamos ter um modelo. O Rio poderá virar uma espécie de início de uma virada na política de segurança pública”.

Sucessão

“Primeiro tenho que cumprir meu mandato. Um ex-presidente da República precisa virar conselheiro dele mesmo, não pode ficar dando palpite. Ele precisa parar depois que chegou aqui. É o máximo. Então se recolhe, vai cuidar da família, vai fazer conferência, fazer alguma coisa.

“Só posso dizer: a base do governo terá candidato. É tão cedo para tratar disso, tem as eleições no ano que vem. Só posso garantir que a base terá candidato e espero estar com credibilidade para fazer campanha por esse país afora. Eu acho que muita coisa vai acontecer no Brasil para melhor.”

Dólar

“Primeiro temos de reconhecer algo que o ministro Mantega disse: temos de dizer que real está valorizado sem deixar de reconhecer que dólar está desvalorizado perante várias moedas.

“O câmbio vai continuar sendo flutuante e ele vai se ajustar. O que precisamos é ter medidas tributárias para permitir que empresas brasileiras que produzem e competem com produto chinês e estão perdendo competitividade, possam ter mais competitividade.

Coalizão

“O presidente da República conversa com as forças políticas. Obviamente, quando se faz alianças políticas, elas têm um preço. Eu perdi três eleições, mas chegou um dia que alguém me convenceu que eu não precisava mais fazer discurso para agradar o PT. Eu precisava ter do meu lado os 15% que faltavam. Eu não fiz acordo com pessoas individualmente, mas fiz com partidos. Eu queria o todo do PMDB, o todo do PR. Se as pessoas vierem a me dar problema, os partidos é que vão resolver.”

Governadores

“Mesmo que tivesse um acordo com os governadores, eu não poderia dizer. Estou pensando que para o próximo mês, vou convocar os governadores para uma reunião. Eu não acredito que os governadores estejam fazendo qualquer pressão. Nós precisamos fazer apenas a combinação perfeita. Eu duvido que tenha havido um momento na história em que um presidente do Brasil tenha tido uma relação com esta com os governadores.”

Greve no Ibama

“Por que Ibama está em greve? Não sei. Só sei que ministra resolveu fazer mudanças do que é licenciamento e o que é demarcação de parque. As pessoas deveriam permitir que mudanças fossem introduzidas para saber se alguém terá prejuízo. Acho que não vai prejudicar o que estamos fazendo.”

Reeleição

“Eu não brinco com democracia. Todos nós aprendemos que fui contra a reeleição. Fui obrigado a ser candidato à reeleição. Sou contra e não serei candidato em 2010, pois a Constituição não permite. Acho imprudente alguém apresentar um projeto permitindo um terceiro mandato. A melhor reforma é acabar com a reeleição e definir um mandato de cinco anos. Não cogito qualquer hipótese de um terceiro mandato. Acho uma provocação à democracia.”

Aborto

“Eu tenho comportamento como cidadão, sou contra o aborto, não acredito que nenhuma mulher seja favorável como chefe-de-estado. Sou favorável a que o Estado de atenção e trate o tema como saúde pública. Conheço casos de pessoas que perfuraram o estômago, tomaram chá de abacate e acabaram morrendo. O estado tem de ter responsabilidade. Minha visão continua inalterada, sou contra aborto e favorável ao debate.”

Greve de servidores

“Todo mundo sabe que o meu comportamento em relação à greve. Eu sempre discuti com meus companheiros, mas não deveria ser como se faz na fábrica no serviço público. Não pode ser como se faz em uma fábrica. Quando nós fizemos greve numa fábrica ou no comércio, tentamos causar um prejuízo econômico ao patrão, mas, no serviço público, não tem patrão, e o prejudicado não é o governo, mas a população.

“Algumas categorias ficam 40, 60, 80, cem dias de greve e recebem pagamentos. Isso não é greve, são férias. Todos temos direito de fazer greve, mas todos nós sabemos que podemos ganhar ou perder.”

Tendência é favorável ao fim da reeleição

Líder do PMDB na Câmara Federal, o deputado federal Henrique Eduardo Alves disse ontem que o fim da reeleição “é uma tese predominante no Congresso Nacional”. Mas a respeito da ampliação do mandato presidencial em mais um ano, Henrique Eduardo Alves disse que essa é uma questão que precisa ser bem avaliada, porque também existe é questão corrente a coincidência de mandatos nos três níveis de poder e para os cargos majoritários e proporcionais.

O senador Garibaldi Alves Filho (PMDB) concorda também com as declarações do presidente Lula sobre o fim da reeleição. “Eu também fui reeleito, como governador, e entendo que a reeleição contribui para uma situação de desigualdade”, disse o parlamentar.

A deputada federal Fátima Bezerra (PT) disse que a posição do seu partido já é pelo fim da reeleição. Quanto a ampliação do mandato presidencial de quatro para cinco anos, ela, pessoalmente, se diz “simpática” á medida.

Servidores prometem mobilização

As criticas do presidente Lula ao direito de greve no serviço público não surpreenderam, de certa forma, as categorias de trabalhadores do setor público, como é o caso do dirigente do Sindicado dos Servidores da Saúde do Rio Grande do Norte (Sindsaúde), Wilson Farias: “É mais um aperitivo para a mobilização em torno do Dia Nacional de Lutas, marcado para o dia 23”, resumia ele. O sindicalista Wilson Faria diz que as declarações de Lula “são mais um ataque ao movimento sindical brasileiro”, além de ser uma atitude de afronta “a uma concepção que o tornou o maior líder sindicalista do país. Para Farias, o fato dos servidores públicos prolongarem as greve por 30 ou mais dias, “é porque muitas vezes o governo não negocia” com a categoria. “Isso é algo desgastante para os sindicatos, para a população e para os servidores que são pagos para prestar melhores serviços”, completou ele.

Segundo Farias, o  presidente da República “está fazendo um discurso hegemônico de governo e dos empresários”, antecipando o pacote anti-greve, “como nos tempos áureos da ditadura militar”. Na opinião dele, o que o governo quer “é simplesmente liquidar com o único instrumento de lutar dos servidores, o direito de greve”.

A diretora do Sindicato dos Trabalhadores na Educação do Rio Grande do Norte (Sinte-RN), Fátima Cardoso, disse que as declarações de Lula “são um retrocesso” ao  direito democrático à organização dos servidores públicos. Ela considera que, ao contrário dos trabalhadores de empresas públicas e da iniciativa privada, os servidores públicos são os mais prejudicados, pois não têm direito à data-base e nem ao dissídio coletivo, quando se trata de negociação por melhores salários.

Já a diretora da Central Única dos Trabalhadores (CUT) no Estado, Francisca Elpídio, diz que a entidade aguarda uma posição oficial da direção nacional da CUT a respeito das declarações do presidente Lula, mas ela diz que, hoje, as centrais sindicais são contra e qualquer mudança na regulamentação do direito de greve.

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