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Mais respeito com a historia

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Tomislav R. Femenick
[Mestre em economia, com extensão em sociologia e historia – Do IHGRN]

Sempre me senti incomodado com o sensacionalismo provocado por certas “descobertas” ou novas interpretações históricas, que são apresentadas como façanhas fantásticas, mas que, na verdade, são danças de picadeiro. Na minha opinião, ciência é coisa séria e assim deve ser tratada. Não custa destacar que, somente no século XX foi que a história, como relato e interpretação de fatos, deixou de ser “expressão literária” para ser uma “ciência”. Nesse percurso, o “campo de palpiteiros” perdeu lugar para outros elementos: a importância e confiabilidade das fontes que dão sustentação e exatidão da narrativa.

No entanto, a historiografia brasileira, de vez em quando, é sacudida por uma espécie de tremores de parque de diversão. O exemplo mais recente e esdrúxulo foi o pronunciamento do ministro da educação, Abraham Weintraub, em plena comemoração da Proclamação da República, chamando o movimento que depôs monarquia de golpe infame e traiçoeiro, perpetrado por militares; isso tudo se sabendo que o governo ao qual o senhor Ministro serve tem uma forte estrutura militar.

Na segunda metade do século passado, quando contestar era um modo novo de ver a vida, mandaram que todos esquecessem os longos cabelos e barbas de Tiradentes, pois ele os usaria curtos. “Joaquim José da Silva Xavier era militar e, como se sabe, cabelos compridos nunca foram tolerados nas Forças Armadas” – afirmou um desses arautos da nova história, esquecendo-se que o Tiradentes cultuado como herói é o revoltoso preso, enforcado e esquartejado; e esse tem barba e cabelos compridos. Por outro lado, cumprimento capilar não é história; no máximo é uma questão de estética.

Esses dois casos são excentricidades que até podem ser chamados de insignificâncias. Porém há outros. Em 1979 foi lançado um livro que “causou”, como se dizia então, entre os estudiosos de cabelos longos e barbichas (olhe aí, novamente a força capilar), bolsa à tiracolo e sandálias franciscanas. Trata-se de “Genocídio americano: a Guerra do Paraguai”, de Júlio José Chiavenatto. O livreto se sustenta na afirmação de que a guerra foi um conluio do Brasil com a Inglaterra, pois esta não via com bons olhos um suposto desenvolvimento industrial do Paraguai. O autor só se esqueceu de um detalhe: naquele momento Brasil e Inglaterra estavam com relações diplomáticas rompidas.

No bojo da Guerra do Paraguai, veio-me a lembrança outra desconstrução historiográfica. Trata-se da origem do nome do Município de Baraúna, de nosso Estado, cujo topônimo é bastante comum no Nordeste. Há cidades com esse nome no Rio Grande do Norte e na Paraíba, um bairro em Feira de Santana e um povoado em Barreiras, ambos na Bahia. A maioria deles deriva de uma arvore, a baraúna, ibaraúna ou braúna.

Alguns estudiosos criaram uma confusão desnecessária, ao porem em dúvida a origem do nome do Município potiguar. Afirmam que há três hipóteses: a) homenagem ao herói Alexandre Baraúna; b) uma planta por nome de ibiraúna, ou c) a existência de um Preto Velho conhecido pela alcunha de Baraúna. Não há hipóteses, há simplesmente especulação “em busca de ribalta”, como diria Nelson Rodrigues.

Vejamos os fatos. Em um artigo publicado na Revista do IHGRN (vols. XLI a XLIV, de 1944 a 1947), Vingt-un Rosado fez a biografia de Alexandre Baraúna, dizendo que o “Cel. Vicente da Motta [por acaso meu bisavô] conheceu pessoalmente Alexandre Baraúna” e ele “era filho de Luiz Francisco Paredão, ex-escravo do português Alexandre Soares do Couto” […]. Esse cidadão “seguiu para o Ceará, em cuja capital no ano de 1851 ingressou nas fileiras do Exército Imperial. Em 1865, encontrava-se o bravo filho de Mossoró a escrever, na tomada de Paysandu, com o seu sangue, uma das páginas mais belas da história militar do Brasil”.

Nove anos depois, quando Vingt Rosado era prefeito de Mossoró, foi criado o Distrito de Baraúna. Na época, Vingt-un fazia parte do governo do seu irmão e foi o redator do decreto. Pergunta com resposta óbvia: qual teria sido a inspiração do nome do novo distrito (hoje Município de Baraúna)), o herói, a planta ou o preto velho?

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