“Um belo dia acordei e achei que tivesse que escrever sobre a historia de minha vida. E a vida da gente é muito complexa. Pensei na questão do texto autobiográfico, e comecei a perceber que não era eu de fato, mas sim apenas um recorte autobiográfico. O texto não é de fato a pessoa inteira, mas um pedaço de nós. O ouvido do outro, a escuta nos resignifica. E isso mexeu demasiado comigo”.
Nesse processo surgiram dez canções: “Otobiografia”, “Cada Um”, “SweetReverie”, “Tomorrow”, “Paisagem” e “The LastPart”, assinadas pelo próprio Mariano e quatro outras em parceria com Humberto Luiz (“Sem Celular” e “Mango FieldsForever”), Luiz Gadelha (“Frankenstein”) e Marize Castro (“Nem Rosa Nem Azul”). Dessas, “Cada Um”, cuja repetição de acordes e palavras simulam um mantra pós-concreto, e “Frankenstein”, canção de amor de forte carga irônica, já haviam sido lançadas anteriormente,como singles.
O disco entrelaça sonoridades acústicas (violão e contrabaixo) com guitarras elétricas e bateria/percussão de timbres quase minimalistas, reafirmando sua busca por uma identidade autoral que possa transitar com fluidez entre a contemporaneidade e a tradição.
Entre as músicas, “Cada um”, é especial para Mariano. É um folk-rock que nasceu a partir da observação do cenário político no Brasil. “O impulso inicial para escrever a canção surgiu de uma crise pessoal intensa, num momento em que eu precisei ser forte em meio ao caos, e parecia poder contar apenas comigo mesmo para elaborar meus próprios mecanismos de enfrentamento, encontrar minha paz, e meu desejo de seguir em frente”, conta.
A canção-título do álbum é uma espécie de matriz dessa ideia: uma autobiografia que reclama a experiência, o repertório e o ouvido do outro para tomar forma, para se realizar enquanto “verdade” daquele que performa e assina na canção, sua história, seus amores, dores, tempestades, lamentos e utopias.
Poesia
Professor de literatura da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (UERN), Mariano, mergulha profundo no mundo das palavras, principalmente da poesia. Uma das músicas em especial é a parceria com a poeta Marize Castro. “Marize é uma artista muito importante na minha trajetória, tanto como compositor como de leitor, me lembro exatamente do dia que a li pela primeira vez, quando entrei em contato com a poesia dela, foi a afirmação de que poderíamos aspirar uma certa grandeza, um rigor artístico”, reflete.
A canção “Nem Rosa nem Azul”, do primeiro livro de Marize intitulado “Marrons, Crepons e Marfins”, é um de seus poemas favoritos. “Sempre senti como se esse texto também fosse meu; tão inexplicavelmente significativo pra mim que por isso precisei cantá-lo, me apropriar dele. Para além de qualquer homenagem, seus versos breves e profundos me dizem como eu me enxergo no mundo, como eu me percebo, são meu jeito de seguir em frente, é meu mantra e minha oração”.
“Os acordes
que me acordam
são meio bruxos
balada blue
o mar
em que eu navego
não é de rosa
nem é azul” (Nem Rosa, nem Azul: Marize Castro).
Mariano segue no mar do desconhecido de si, do outro, entre a vida, a morte e os renascimentos diários.
Banda
Além do próprio Mariano Tavares ao violão, o álbum contou com a participação dos músicos Ricardo Baya (guitarras, violões), Airton Guimarães (contrabaixo acústico), Humberto Luiz (sintetizador) e Artur Porpino (bateria, percussão). As ilustrações da capa e encarte foram criadas pelo artista Fernando Travis, com projeto gráfico do designer André Souza. “Otobiografia” estará disponível em lojas online e plataformas digitais a partir desta sexta-feira (13), além do website.