Livro mapeia horror nacional com uma seleção cronológica
Reunindo contos de autores clássicos como Machado de Assis, João do Rio e Afonso Arinos, além de nomes contemporâneos, como Roberto de Sousa Causo, Carlos Orsi e Márcia Kupstas, a antologia vem na esteira de um bom momento para o gênero no País. No cinema, As Boas Maneiras, de Juliana Rojas e Marco Dutra, O Juízo, de Andrucha Waddington, Morto Não Fala, de Dennison Ramalho, e O Animal Cordial, de Gabriela Amaral Almeida são apenas alguns exemplos de filmes nacionais que dialogaram com o horror e obtiveram certo sucesso – se não nas bilheterias, pelo menos com a crítica.
Na literatura, ao menos três obras recentes reuniram narrativas de horror escritas por grandes autores: Contos de Assombro (Carambaia) traz penas de peso pouco associadas ao gênero, como Virginia Woolf, Émile Zola, Luigi Pirandello e Ivan Turguêniev; Contos Macabros (Escrita Fina) prioriza os nomes já estabelecidos do panteão nacional, como Aluísio Azevedo, Lima Barreto e Humberto de Campos; e Contos Clássicos de Terror (Companhia das Letras) mescla brasileiros como Lygia Fagundes Telles a estrangeiros como Shirley Jackson.
Nesse cenário, o mérito do livro organizado por Marcello e César é mapear o horror nacional com uma seleção cronológica, perpassando várias décadas desde seus primórdios – o primeiro conto, A Vida Eterna, de Machado de Assis, data de 1870 – até hoje, sendo o mais recente, Bradador, de Braulio Tavares, publicado em 2014.
“O recorte cronológico salienta o desenvolvimento dos temas, como foram mudando ao longo do tempo os interesses dos autores e a forma de retratar o horror”, afirma Marcello ao Estado. Ele pontua uma interessante peculiaridade do horror brasileiro: as histórias mais antigas bebiam das superstições do ambiente rural e, mais recentemente, começaram a refletir os temores da vida urbana. César detalha os principais assuntos abordados em ambos os casos: “Na zona rural, monstros mitológicos que fazem parte do imaginário do homem do campo e seres importados das religiões de matriz africana ou mesmo das tradições indígenas. Já no espaço urbano, surge a questão da violência, principalmente de cunho sexual, mas também a violência cotidiana, a polícia, traços de psicopatia, brigas entre vizinhos, o trânsito. Autores ainda mais recentes começaram a trabalhar com as lendas urbanas também”, explica o organizador.
O caldo cultural brasileiro é rico, entre outros aspectos, por sua diversidade religiosa, o que se reflete na produção nacional de horror. “À medida que se invade o espaço do sobrenatural, lidando com fantasmas, espíritos, monstros, você está naturalmente mexendo no mesmo substrato religioso, então os conceitos surgem naturalmente”, explica César.
Machado de Assis
Acauã (1893)
Inglês de Sousa
Demônios (1893)
Aluísio Azevedo
Assombramento (História do Sertão) (1898)
Afonso Arinos
O Defunto (1907)
Thomaz Lopes
A Peste (1910)
João do Rio
Rag (1922)
M. Deabreu
O Espelho (1938)
Gastão Cruls
Tuj (1965)
Walter Martins
Geppeto (1987)
Márcia Kupstas
Bença, Mãe (1992)
Júlio Emílio Braz
Solo Sagrado (1995)
Carlos Orsi
Trem de Consequências (1995)
Roberto de Sousa Causo
O Fascínio (1997)
Tabajara Ruas
Os Internos (2007)
Gustavo Faraon
Bradador (2014)
Braulio Tavares