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Nas catedrais

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Vicente Serejo
Venho, Senhor Redator, e como disse antes, daquele mistério que a medicina chama de check-up. Uma devassa na vida humana, imposta pela tecnologia. Enfiaram os olhos nas catedrais do coração e invadiram as cavernas mais íntimas; entraram nos corredores arteriais que na verdade deveriam ser insondáveis, e ouviram os seus ecos; testaram seus ritmos e, como se não bastasse, projetaram a vida como se a eles, os médicos, Deus tivesse concedido saber da nobreza da alma. 
Resignado, enfrentei os desafios, sob pena de uma luta maior que seria vencer os olhos de Rejane, Sylvia e Odyle. Nada foi encontrado, pelo visto e ouvido, mas, nem assim, saí com a certeza de viver ou desviver, como as mãos no poema de Mário de Andrade, mas compreendi com a paciência que um setentão precisa ter. Como saber dominar aqueles ruídos estranhos, os ecos guturais das entranhas mais íntimas, eu que levei a vida sem merecer a compreensão da ciência?
Não lembrei das catedrais imensas de que fala o poeta Augusto dos Anjos, nem fui além, a ponto de citar Pascal, quando adverte que o coração tem razões que a própria razão desconhece. Pra quê? Diriam, tenho certeza, no mais puro jaez da ciência: e daí? Calado, colecionei todos os resultados e, depois de tudo, marco agora a visita a Paulo Davin, meu velho amigo, mesmo sabendo que dentro de mais um ano ele vai desconfiar de tudo outra vez, em nome da ciência dos homens.  
Conformado, restou o consolo de lembrar duas histórias. Uma de Delfim Neto, nos seus mais de noventa anos, gordo e sedentário, vivendo a vida inteira entre o escritório e a biblioteca que chegou a ter cem mil volumes; do gabinete para as salas de reuniões. Um dia, alguém menos avisado das certezas, perguntou como fazia para viver gordo e bem. Delfim foi simples: o coração nasce programado para um determinado número de batidas. Só para quando chega no combinado.   
A outra. Um dia, preso a no máximo duas doses de uísque por semana, e já bem depois dos oitenta anos, Oswaldo de Souza reclamou a um clínico, muito amigo, da vida sem graça sem a boa companhia do seu malte. E ouviu a sugestão: mude de cardiologista. Fulano é radical – e disse o nome que já está morto. Oswaldo, discreto, foi ao médico indicado. Feitos os exames, perguntou se podia tomar uísque antes do almoço e quantos. O cardiologista respondeu: quantos a vida pedir. 
Ainda estava muito bem. Sem hipertensão, livre de taxa elevada de açúcar, sem qualquer doença crônica, a não ser a velhice, mas tocado de uma grande alegria de viver e receber os amigos. Ao confirmar que podia merecer a dádiva de duas ou três doses antes do almoço, ou então no fim da tarde, ouviu o novo médico dizer que se ele tinha boa saúde naquela idade, mais de oitenta anos, não era necessário proibir o cachimbo e o uísque. Oswaldo, feliz, arrematou: Que médico, hein?

ESTRONDO – O posto estadual de saúde, na Redinha, aquele próximo ao campo de futebol, não suportou o abandono e a caixa d’água desabou. Dizem os vizinhos que só se ouviu a água escorrer. 
LENINE – Hoje, das 9 ao meio dia, no calçadão do Sebo Vermelho, o editor Abimael Silva lança a segunda e bonita edição do ‘Reinvenção do Descobrimento’. Numa homenagem a Lenine Pinto. 
HISTÓRIA – Também com o selo do Sebo Vermelho ‘Os Amaral Gurgel – Fragmentos da história de uma família ao longo dos séculos’, livro de José Veríssimo Fernandes. Com seiscentas páginas.
PRESENÇA – Um detalhe singular da história dos Amaral Gurgel é a presença de Maury Gurgel Valente. Um carioca e diplomata brasileiro que foi marido da grande escritora Clarice Lispector.
ALIÁS – Na pesquisa, bem documentada pela riqueza de fontes, Veríssimo informa que Clarice era Gurgel Valente e voltou a ser Lispector no nome literário, ela que só depois pediu a separação.  
VERBO – Para o velho amigo e filósofo Ruben G. Nunes: gratíssimo pela força para o novo verbo monstrificar.  É assumir a síndrome da estupidez, a forma de torna-se um monstro da intolerância.   
CONY – Bibliotecários da Academia Brasileira de Letras localizaram os originais de um romance inédito de Carlos Heitor Cony – Título: ‘Paixão segundo Mateus’. Estava no acervo doado à ABL. 
DÚVIDA – E se depois de ganhar isenção da Prefeitura, o serviço de transportes coletivos de Natal, dentro de alguns meses, não apresentar melhora? Quem responderá pelo desrespeito aos usuários?    
CORAÇÃO – O Instituto Atena iniciou esta semana protocolo dirigido a pessoas com histórico de infarto e/ou que tenham sido submetidos a angioplastia. O medicamento em estudo é para as doenças coronarianas. Para mais detalhes os interessados devem ligar para o número 2020-3430.

ESTUDO – A pesquisa será acompanhada pela médica Sanali Paiva, a líder do Instituto Atena, único no Estado a fazer parte do grupo de 800 instituições científicas no mundo que estudarão o novo medicamento. A pesquisa vai cadastrar quarenta mil voluntários portadores de cardiopatias.  

SEXTOU – Resta preparar um uísque do jeito mais certo e na hora ideal, segundo nos ensinou o poetinha Vinícius de Morais: copo alto, gelo até a boca e dose suficiente para o gelo flutuar. Tomar às seis horas, fim da tarde, na hora da Ave Maria. Ficaremos protegidos das tentações do mundo.   
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