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“Nenhuma mulher é livre ainda”

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ESCRITORA - Danuza Leão

Por Anna Ruth Dantas

Entrevistar Danuza Leão é voltar um pouco à história, pela proximidade que ela teve com muitos dos políticos que deixaram sua marca no Brasil. A escritora, que rejeita o título de literata, fala de forma franca. Ainda que você não concorde com as opiniões dela, não há como negar que ela é uma mulher de posição.

E entre suas opiniões, muitas polêmicas. Danuza Leão defende uma reformulação da aposentadoria. “Aos 50 anos você é uma garota”, destaca ela, defendendo uma “aposentadoria” gradativa, com a redução da carga horária de trabalho.

Politicamente, Danuza Leão se mostra decepcionada com os líderes atuais e elegeu os políticos do PT para ganharem o Oscar. Por que? “Eles fingem, mentem muito”, completa. Nesse processo eleitoral, demonstra simpatia com a senadora Heloísa Helena.

Para a escritora, as mulheres são mais confiáveis. No entanto, longe delas está a liberdade. “Nenhuma mulher é livre. Eu não sou livre”, comenta ela, que esteve no Rio Grande do Norte para participar da Feira do Livro de Mossoró. O 3 por 4 desse domingo é com uma escritora, ex-modelo, mas principalmente com uma mulher que não teme as posições que assume.

Você lançou um livro intitulado “Quase Tudo”, o que faltou para ser tudo?
Faltou o que ainda está por acontecer.

Nesse livro você fala sobre suas amizades com líderes políticos que vão desde Juscelino Kubitchek até José Serra, entre outros. O que mudou na concepção dos líderes do passado e os atuais?
Hoje em dia rouba-se muito. Os escândalos são muito maiores. Sempre teve problema, a oposição sempre levantou questões, mas agora mais do que nunca. O Brasil está pior do que nunca. Vamos ver se essas eleições ajudam a melhorar um pouco, vamos ver se o povo vai votar direito.

Você acredita no sentimento de mudança do povo?
Não muito. Acho que infelizmente as coisas vão continuar iguais. O povo é acomodado e por outro lado a grande maioria não tem estudo para compreender. Como a grande maioria não estudou não compreende o que é a política. Então basta você dar R$50 todo mês, como ocorre com o Bolsa Família, e eles vão continuar achando tudo uma maravilha. Bem perto daqui, na Argentina, qualquer coisa que aconteça vai todo mundo para a rua. Aqui nem quando levaram a poupança de nós todos, nem assim, o povo foi para a rua.

Pelo que você analisa, nosso futuro político não é dos melhores?
Por um lado a primeira coisa que o brasileiro precisa é escola, aprender. Nesse ponto Cristovam Buarque seria a pessoa ideal para o país. Só que a gente sabe que não vai ser ele o presidente. Só se fosse algo suprapartidário e alguém o chamasse para ser ministro. Mas, ele foi ministro do Lula e foi demitido por telefone.

Heloísa Helena assusta os candidatos?
Eu adoro Heloísa Helena. Acho que ela talvez seja a responsável pelo segundo turno. Ela está chegando tão perto do Alckmin, sei lá se o segundo turno será com ela. O discurso dela é o discurso do Lula antes de se tornar presidente. Só que Lula frustrou muito todo mundo e ela (Heloísa Helena) saiu do PT na hora certa.

Você chegou a dizer que daria o Oscar para os políticos do PT. Você continua com essa opinião?
Continuo. Eles são muito fingidos, muito falsos. Mentem com a maior cara de pau.

Sua preferência por Heloísa Helena, é um indicativo de que nós mulheres somos mais confiáveis?
Eu acho. Bem verdade que temos muito mais políticos homens que mulheres. As mulheres são mais confiáveis.

Mas se elas são mais confiáveis, o que leva os homens a serem maioria no Congresso Nacional?
Culpa nossa, que não nos candidatamos mais, não entramos mais de cara na política.

O cenário que você descreve mostra que ainda há muito para a mulher desbravar.
Falta muita coisa ainda. Já se andou muito, mas o caminho ainda é muito longo. Estava lendo um livro que saiu agora das cartas de Simone de Bauvoir, que só poderiam ser abertas 20 anos depois. O livro se chama Tête a Tête e eu li esse livro e vi que mesmo Simone de Bauvoir não era livre. Nenhuma mulher é livre ainda.  Nem eu sou livre ainda.

O que falta para essa liberdade? O feminismo naufragou?
Não, mas mesmo que a gente faça todas as coisas que os homens fazem, ainda assim não seremos livres. Mulher é diferente de homem.

Você gostaria de ver uma mulher presidindo o Brasil?
Seria ótimo. Gostaria de ver isso. 

No seu mais recente livro você dedica um capítulo sobre a morte do seu filho. O que mudou na sua vida com esse fato?
Eu virei outra pessoa. Se essa tragédia não tivesse acontecido eu seria a outra Danuza, que eu sempre fui. Seria aquela pessoa que achava que a vida era para ser feliz, para festa. De repente eu levei essa paulada da vida tão grande e eu mudei. Mudei, passei 10 anos trancada dentro de casa. Só comecei a voltar à vida quando comecei a  escrever. Nesses 10 anos que passei trancada dentro de casa, nunca abri minha boca para falar esse fato (a morte do filho). No livro eu escrevi, falei tudo. Quando eu abri o computador e  comecei a escrever, vi que estava tudo lá, entocado (na cabeça). Coisas que eu evitava falar, evitava pensar, estava tudo intacto.

Você disse que antes pensava que a vida existia para a felicidade e festas. E a vida existe para que?
Para muito mais coisas, para pensar na gente, nos outros, no país, para a gente ter outras áreas.

Os artistas têm uma bandeira comum de manter a vida privada fora da mídia. Você expôs muito da sua vida no livro, você está rompendo esse rótulo?
A partir do momento que resolvi escrever não pensei duas vezes. Escrevi tudo, quase tudo, porque se fosse tudo não iria acabar nunca. Escrevi de tudo. Era importante esse livro na minha vida e não me preservei.

Você estaria na contra-mão dessa defesa?
Eu sempre fui um pouco na contra-mão.

Por falar em ir na contra-mão, você começou a escrever quando muitas pessoas estão já parando de trabalhar.
É verdade. Vejo as minhas contemporâneas parando, porque estão aposentadas e quando olho para elas vejo-as péssimas, vivem em depressão. Não tem o que fazer, não tem sentido para a vida.

Um dos males da terceira idade seria a aposentadoria?
Eu acho esse déficit da previdência um absurdo, alguém se aposentar aos 50 anos. Aos 50 anos você ainda é muito jovem. Não sei qual seria a idade. Mas com 50 anos não. Você ainda tem uma vida toda pela frente. Claro que o que vou dizer são pensamentos, porque eu não paro para pensar absurdos e o que seria a solução para isso ou para aquilo. Mas eu acho que a aposentadoria deveria ser feita gradativamente. Se você trabalha 8 horas por dia, quando você chegasse a uma determinada idade passaria a trabalhar 4 horas por dia. Mas com 50 anos não. Com 50 anos você é uma garota.

O que você busca sendo uma garota?
Eu não sei. Busco tudo o tempo todo. Estou adorando estar aqui (em Natal) e ir para Mossoró (participar da Feira do Livro), nem sei como é. Vocês têm tapioca aqui? Tudo que eu quero é comer tapioca.

Falando em 50 anos, você foi a primeira modelo a desfilar em Paris. Você concorda com os padrões de beleza atuais? Estamos numa ditadura da beleza ou da magreza? O que é belo hoje?
Quando eu tinha 17 e 18 anos eu via meu corpo e hoje em dia tinha quadril enorme, seios enormes. Hoje em dia você é reta. A vida é assim, nada fica parado.

E essa onda de violência, quando tudo isso vai parar?
Acho que isso não tem solução. Estava conversando ontem (sábado) com um grupo de amigos Millor Fernandes, Chico Caruso, Fernanda Montenegro, e a gente bate papo e fala de tudo. Eu fiz uma pergunta sobre a violência. E todos responderam que não tinha solução. 

Pelo grupo de amigos que você discutiu o assunto, podemos deduzir que você é intelectual?
Não. Não, não. Não me chame de intelectual. Essa palavra é pretensiosa. Intelectual “se acha”.

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