Tádzio França
Repórter
Março começa com a promessa de nova movimentação teatral nos palcos da capital potiguar. No mês em que é celebrado o Dia Mundial do Teatro (27/03), são os projetos alternativos que estão garantido o abrir e fechar de cortinas na programação dramatúrgica da cidade. O fim de semana marca os dias mais concorridos do Festival Internacional Casa da Ribeira – FICA, que irão até domingo com a Mostra Internacional de Teatro e Dança. Já no Teatro de Cultura Popular, será apresentado na sexta a peça “Inkubus”, encerrando a Semana da Mulher no TCP. O feminino está sendo homenageado em todas as programações. Arte e mensagem dão as mãos no palco.
Cia Pão Doce voltará no domingo para apresentar o premiado ”A Casatória C’A Defunta”
Palco feminista
O FICA tem como tema de sua edição “A Feminização do Mundo”, uma reflexão sobre as conquistas da mulher e sua luta ainda necessária e constante por igualdade. A temática influenciou na escolha dos espetáculos apresentados, afirma Henrique Fontes, diretor artístico da Casa da Ribeira. “Não é apenas pelo 08 de março, mas a feminização também é uma ideia de luta para nós, que se estende a tudo. Portanto escolhemos espetáculos que, mesmo não sendo 100% feito por mulheres, levantassem discussões políticas que tangenciam a visão do feminino sobre a sociedade”, explica.
Antes da maratona teatral iniciada na última terça-feira (06/03), o Festival já havia começado no mês passado, primeiramente com a ideia de formação, oferecendo oficinas, cursos e palestras. “A gente acredita na formação, não queríamos que o FICA estivesse reduzido ao evento”, afirma Henrique. Segundo o ator e diretor, o plano seguinte é a volta do Circuito Cultural da Ribeira, entre abril e maio. Serão cinco edições em parceria com o Centro Cultural DoSol. “Estamos nos reinventando para ir em frente, diante de um cenário político pouco animador como o atual. É a luta, que é das mulheres e da arte em geral”, diz.
Elogiado espetáculo de rua, ”Meu Seridó” volta com novidade: fará sua estreia no palco
De sexta até domingo, o FICA terá sete apresentações teatrais. Nesta sexta tem “Bloom”, de Clarissa Rêgo, às 19h. Trata-se de uma performance de dança contemporânea concebida na Áustria e desenvolvida no âmbito do PACAP – Edição 1, com curadoria de Patrícia Portela. No palco, exibe um corpo de mulher que se forma e se deforma sob as pressões de processos sociais, sociais e políticos. Às 20h30 terá “Para não morrer”, de Nena Inoue. A atriz aborda temáticas femininas e feministas atreladas a questões políticas, especialmente na América Latina.
O sábado começará com “Bloom”, às 19h; seguido pela estreia nacional de “O torto andar do outro” (20h), peça da Cia Pão Doce, de Mossoró, e encerrando a noite com a peça inglesa “Tempo real” (21h30), de Ed Bailey. Na trama, Ed vive um homem (ou dois) que procura seu lugar no mundo. É uma obra do site Specific, adaptada para a ocasião. E no domingo, a Cia Pão Doce voltará para apresentar “A Casatória C’A Defunta”, às 17h, seguida de “Meu Seridó”, às 20h, do grupo Casa de Zoé.
Festival conta com estreia de ”O torto andar do outro”, da Cia Pão Doce
Contos do Oeste e Seridó
Romero Oliveira, ator do mossoroense Pão Doce, explica que os dois espetáculos escolhidos para o FICA são diferentes entre si – um é drama, o outro, comédia romântica -, mas ambos dialogam na abordagem do respeito às diferenças. “Em ‘O torto’ nós quisemos levar um ato político para o palco. A gente precisava falar sobre respeito. E usamos a linguagem do cordel para isso”, explica. A inspiração veio na troca de ideias com o renomado cordelista Antônio Francisco, que sugeriu a adaptação de seu texto “Um conto bem contado” para o teatro. Apesar de ambientado num tempo remoto, reflete os problemas do mundo atual. Na trama, uma criança é perseguida pela população de um reino encantado ao andar pra frente. Todos só andam de lado.
Já “A casatória c’a defunta” é uma comédia que assimila costumes, crenças e sonoridades dos sertões para contar uma história de amor sobre vida e morte segundo o imaginário popular. É uma peça originalmente feita para a rua. A Cia Pão Doce completou 15 anos em 2017, e se consolida como um nome de peso na dramaturgia potiguar. “Somos amigos dos grupos natalenses, e se posicionar é muito importante nesse momento de resistência artística. Abrir mais espaços, discutir preconceito, a mulher. É uma bela corrente positiva”, afirma Romero.
Inkubus, de Alice Carvalho, é inspirada na imagem mitológica do demônio
Já “Meu Seridó”, que desde sua estreia vem lotando espaços e arrancando elogios, garante uma pegada nova até para quem já viu a peça: será encenada pela primeira vez num palco italiano fechado, diferente das ruas e praças por onde já passou. Outro ‘plus’ é a volta de César Ferrario ao elenco, após encerrada sua participação na novela “O outro lado do paraíso”, na Globo.
A peça, que foi idealizada pela atriz Titina Medeiros, fala sobre a história do Seridó, sob um ponto de vista essencialmente feminino. “A trama aborda muito a questão da mulher oprimida pelo patriarcado sertanejo, dos coronéis. É uma história que todos sabem mas ninguém contava – até agora”, diz o ator Marcílio Amorim, que no espetáculo interpreta nada menos que cinco personagens. Marcílio conta que a peça se tornou um verdadeiro ponto de encontro de seridoenses. “São eles que chegam mais cedo, muito elegantes. E sempre identificam um personagem da peça com alguém da família. É um barato”, diz. O ator ressalta que o grupo está captando recursos para levar a peça a todos os municípios do Seridó.
Pesadelo feminino
Inspirada na imagem mitológica do demônio que suga a energia das mulheres em seus sonhos, a atriz Alice Carvalho concebeu o monólgo “Inkubus”, que será apresentado sexta, às 20h, no TCP. A trama apresenta Beatriz Mosquitto, uma jovem e talentosa artista de rua com histórico de abuso e assédio, além de uma relação conturbada com a mãe. A personagem surge ora moldada, ora moldando o tecido da violência, do ideal da família tradicional imposto por uma sociedade machista e alienada. Ela percorre todo um trajeto através de suas memórias e sentimentos. A peça é dirigida por Júnior Dalberto.
Antes do espetáculo, às 18h, no hall do teatro, tem a exposição “A cor que brota do feminino”, reunindo obras das artistas Liz Waves, Maíra Sara & Elaine Souza, além de um sarau poético com Regina Azevedo, Civone Medeiros, Lulu Albuquerque, Deua Medeiros, Claudia Magalhães, Renata Marques, Drika Duarte, Marília Negra Flor, Alessandra Augusta e Berê.
Serviço:
Festival Internacional Casa da Ribeira. De sexta a sábado às 19h, e domingo às 17h. Entrada: R$34 (inteira) e R$17 (meia).
Inkubus. Sexta, às 20h, no TCP. Entrada: R$40 (inteira) e R$20 (meia).