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No outono da memória

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Maria Betânia Monteiro repórter

Mesmo não sendo comunista, o jornalista Ubirajara Macedo foi preso durante o golpe militar de 1964. Na época, já estava à frente da editoria desta TRIBUNA DO NORTE, que contava 14 anos de fundação. Assim, com 90 anos de idade, completados nesta segunda-feira, dia 1º de março, Ubirajara Macedo é a memória viva das grandes transformações políticas e sociais da cidade, algo que nem a TN poderia testemunhar em seus 60 anos de existência que, aliás, são comemorados neste mês.

Ubirajara Macedo narra sua história para o escritor Nelson Patriota. O lançamento é na segunda-feira, dia em que o jornalista comemora 90 anosA data de aniversário marca também o lançamento da obra que dá vazão a toda a história de vida, a biografia “No Outono da Memória”, escrita por  Nelson Patriota. O lançamento acontece na livraria Siciliano, do Midway Mall às 18h.

O livro, que também descostura a bainha de uma Natal urbanizada, de um jornalismo pré-offset, será lançado no dia do aniversário de 90 anos deste decano: “Com muita alegria e orgulho declarado”, diz Ubirajara, que segue comentando as histórias contidas no livro.  Como esta do golpe de 1964, cuja justificativa, dada pelos militares para sua reclusão no 16° RI, foi motivada por suas ações subversivas — já que esteve engajado na campanha “O Petróleo é Nosso”, movimento lançado pelo escritor Monteiro Lobato em 1940, que também representava uma das bandeiras do Nacionalismo. Ubirajara Macedo foi preso pelo mesmo ideal que movia o poeta paraibano Zé da Luz  — “um Brasil brasileiro, sem mistura de estrangeiro, um Brasil nacionar”.

“Estive muito doente, tive pneumonia e em seguida uma infecção, que se espalhou por todo o corpo. Fui para UTI duas vezes, mas consegui contar a minha história”, disse o jornalista em visita à redação da TN, ontem pela manhã.

Lembranças

Nos dias em que Ubirajara teve sua liberdade tolhida, as idéias nacionalistas circulavam livremente no pátio da prisão. E foram estas idéias que facilitaram a aproximação do jornalista com Luiz Maranhão, Djalma Maranhão, Carlos Lima, Vulpiano Cavalcanti, entre outros nomes que fizeram parte da história política do Estado. “Eu era o mais velho do grupo. Já estava com cinquenta e poucos anos. Um militar me chamou para dizer que ficava impressionado por eu estar ali, sugerindo que um homem daquela idade estaria acima de qualquer suspeita. Foi quando eu disse a ele: ‘os canalhas também envelhecem’. Estava me referindo a ele, que também tinha os cabelos brancos”, lembrou Ubirajara, que depois disse ter levado uma bronca do pai, pela ousadia.

Em 11 de março de 1966 o advogado de Ubirajara, o jurista Ítalo Pinheiro, conseguiu um habeas-corpus em seu favor, transformando a prisão celular em prisão domiciliar, tendo ele que se apresentar todas as quartas-feiras ao quartel-general. De volta aos Correios, já que também era funcionário público, Ubirajara foi transferido para São Paulo. Lá trabalhou como jornalista na Rádio Piratininga e no jornal Folha de São Paulo. Buscando qualidade de vida, retornou para Natal, e junto com o amigo dos tempos de prisão, lançou a revista “Cadernos do Rio Grande do Norte”, que em seguida transformou-se no jornal “Folhas do Município”. Ubirajara também passou pelo Diário de Natal, dentre outros veículos de comunicação. Aposentou-se como jornalista e funcionário público dos Correios. “Tive uma vida trabalhista intensa ao longo de mais de 50 anos ininterruptos. Nesse ínterim, colhi frutos positivos e alguns poucos aborrecimentos… Mas quando me afastei em definitivo de qualquer atividade remunerativa, em 1987, resolvi investir os longos dias livres que se abriam à minha frente a cada manhã em coisas úteis, agradáveis, se possível culturais, re preferência musicais”, contou o biógrafo.

Ubirajara e a poesia

Mas nem tudo é prosa na vida do jornalista. Em ocasiões especiais, dedicou-se à poesia. Uma delas fala sobre a cidade de Natal. “Se eu fosse um poeta cantaria melhor/ Essa cidade-poema, essa cidade-vida/Poeta não sou, mas mesmo assim eu direi a ti/Natal, meu canto de amor/Minha paixão por ti”, trecho do poema de Ubirajara “Minha Cidade Amada”, publicada em sua biografia.

No livro, Nelson Patriota, escritor e jornalista, utilizou a primeira pessoa para “falar” sobre a vida do amigo “Bira”. “O livro foi surgindo a partir de conversas, mas é claro que nem tudo foi dito, até porque tem fatos que escapam da memória”, contou Nelson Patriota.

O tecido tramado por Nelson, onde são contadas as histórias de Ubirajara Nascimento, é bordado, ora por citações literárias, ora por uma descrição detalhada dos cenários que compuseram a vida do biografado. No trecho dedicado aos primeiros anos de vida de Ubirajara, Patriota descreve o momento em que inicia sua viagem, lançando mão da memória do amigo, à Macaíba, local de seu nascimento. O texto apresenta tantos detalhes de forma poética, que o leitor é conduzido àquela cidade potiguar. “Os meses que marcaram a estação chuvosa do Nordeste guardam ainda hoje um encanto especial para mim. Olhando através da janela de minha sala de estar, onde uma nesga de mar disputa com o Rio Potengi a atenção das minhas retinas cansadas, minha imaginação mergulha no azul esverdeado das águas, lá longe”. Esse exemplo da narrativa de Patriota é também o início da incursão à vida deste jornalista potiguar, que encanta, dentre outras razões, por ter a honestidade perpassada em todas as fases de sua vida.

“Ao olhar para trás, percebo que vivi muitos papeis na vida, alguns transitórios, como os de comerciário, militar e juiz classista; outros mais estáveis, como de jornalista e funcionário; e, finalmente, outros permanentes, como o de pai e o de marido. E aqui eu poderia citar também, se a modéstia o permitir, o de militante das causas das liberdades civis, pelo que paguei amargamente, mas sem qualquer arrependimento de minha parte. Assim, creio que falei de todos os papéis que desempenhei da vida, conforme a importância que teve cada um para mim”, concluiu Ubirajara Nascimento, falando de todo o seu percurso, no texto escrito por Nelson Patriota.

Serviço
Lançamento do livro No Outono da Memória
Data: 1° de março
Hora: 18h
Local: livraria Siciliano, do Midway Mall

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