A mistura explosiva de humor negro com violência elevada ao quadrado pode não ser das mais digeríveis. Porém, quando o assunto é história em quadrinhos as coisas mudam de figura: tudo é permitido e nem sempre a fórmula é tão indigesta quanto parece. Longe do receio de ser taxado como um brutamontes impulsivo e sem escrúpulos, o personagem Negão, ou melhor The Negão, está de volta às bandas natalenses em mais uma aventura.
Recheada com muita pancadaria, humor ácido e doses homeopáticas de sentimentos nobres como o amor, a nova história do anti-herói acaba de ser lançada pela Kova Produções, selo independente criado pelo próprio autor da HQ, Eduardo Kowalewski, 27. “O The Negão não se prende a um estilo ou uma técnica, costumo dizer é uma grande salada de fruta com elementos do mangá e do gekigá (estilos de desenhos japoneses), dos comics norte-americanos e do cartoon”, explicou Kowalewski, carioca de descendência polonesa que mora em Natal há 15 anos.
O “indivíduo de boné, óculos escuros e cabelo rastafari, movido a uma boa briga e muita cachaça” — assim identificado pelo quadrinista — surgiu pela primeira vez em 1998, mas na época não passou do primeiro número. Em 2001, uma nova investida que também não vingou: The Negão brigou, literalmente, com nazistas no fanzine “100 Idéias”. “Dessa vez o selo (Kova) é meu, ou seja, não há perigo do The Negão desaparecer”, informa Eduardo, que não gosta de HQs melosos onde todos são felizes e tudo acaba bem.
“Gosto de histórias imprevisíveis, com surpresas a cada página. Neste terceiro ‘número um’ a aventura está mais surrealista que as anteriores. E muito mais engraçada também”, garante o autor.
The Negão mora na imaginária Meretrópolis (cidade que o leitor pode visualizar como uma mistura de Natal com Rio de Janeiro), e não perde a oportunidade de arrumar confusão. Na primeira aventura, Negão aceitou a missão de transportar uma mala. Depois de muito corre-corre e brigas homéricas, ele descobre que tudo não passou de uma pegadinha de um programa de televisão. No fim das contas, o apresentador do programa se dá mal nas mãos do implacável personagem.
“Na época o personagem fez muito sucesso, as pessoas vinham conversar comigo na rua, perguntavam quando sairia outra edição. Quero ver se recupero esses fãs do The Negão, só assim poderei publicar novas histórias”, disse Eduardo, que também incorpora a profissão de carteiro.
Kowalewski lamenta que os jornais locais deixaram de publicar HQs: “Temos ótimos desenhistas como Evaldo de Oliveira – que desenhou por anos o Recruta Zero -, Gilvan Lira, Ivan Cabral e Márcio José, e os leitores deveriam cobrar a volta da publicação das tiras”, observa.
Eduardo resolveu desengavetar seu personagem depois da abertura da Garagem Hermética, única loja de Natal especializada em HQs. “O roteiro, escrito por um professor que prefere ficar anônimo, é de 2000. Fiz algumas adaptações para dar uma atualizada, mas o enredo é o mesmo: The Negão enfrenta tudo e todos para conquistar a mocinha da história, filha do mestre em artes marciais Shimiju Omurukai”, conta.
A revista peca por ter um visual um tanto poluído — a capa é colorida e as páginas internas são em preto e branco. Boa parte dos personagens são inventados, mas alguns figurantes foram inspirados em pessoas reais. Questionado sobre a possibilidade das histórias do The Negão influenciarem a violência, Eduardo é realista: “Não acredito nisso, as pessoas que lêem quadrinhos são conscientes que tudo aquilo é ficção. Sou a favor da violência ficar só nas HQs”. Em tempo: “The Negão não mata, só aleja!”
Serviço
HQs The Negão, de Eduardo Kowalewski, à venda por R$ 3,25 na Garagem Hermética (av. Prudente de Morais, shopping Natal Sul, loja 70), livraria Siciliano do Midway Mall, bancas do Nordestão (Cidade Jardim e Lagoa Nova), Tabacaria Trapiche (Natal Shopping), Banca & Cia (por trás do Palácio dos Esportes) e Superbanca no Via Direta. Informações: 84 8849-4008 ou email [email protected].
