Cresci consumindo futebol, perdendo aulas para jogá-lo, ouvindo resenhas no rádio, assistindo jogos na TV, lendo jornais, colecionando livros e revistas, e aprendi a cultuar os craques que eu não vi ao vivo: Zizinho, Heleno, Ademir.
O primeiro era o espelho do rei Pelé, que quando menino brincava de ser o “Mestre Ziza”; o segundo, gênio enlouquecido do Botafogo do meu pai; e o terceiro, o mais feroz goleador que Recife emprestou ao Vasco e ao Brasil.
Ademir Menezes, ou Ademir Queixada, foi a mais exuberante joia do futebol pernambucano, o craque seminal do Sport Club do Recife que foi para o Rio encher o Vasco de glórias e os adversários de gols. Um impetuoso matador.
O craque de grandes mandíbulas, tipo gladiador, a personificação do “Expresso da Vitória” de São Januário, um aríete a desmontar defesas por baixo e por cima. Eram tantos os gols que contemplá-los não era prazer só de vascaínos.
O jornalista Armando Nogueira, mestre dos cronistas esportivos, um apaixonado botafoguense, escreveu: “Se o futebol me quisesse dar um presente, bastava que me desse um domingo inteirinho só de gols de Ademir”.
Protagonista de gols e jornadas épicas no Sport, no Vasco e na Seleção, Ademir gerou narrativas que se misturaram às fábulas. E como no clássico western O Homem que Matou o Facínora, lendas foram publicadas sobre ele.
A mais espetacular e que nenhum historiador teve coragem de desmentir, a não ser supor o imaginário, foi o pedido do técnico Gentil Cardoso à diretoria do Fluminense, em 1946: “Dê-me Ademir e eu lhes darei o campeonato”.
Entre o fato e a lenda, a verdade histórica é que o Flu tirou Ademir do Vasco e conquistou o título daquele ano. Mas em 1948, já estava de volta ao time da colina, devolvendo os gritos de gol à torcida. Em 1950, era o artilheiro da Copa.
A Copa perdida para o Uruguai interrompeu a memória emocional que alimenta os mitos, prejudicando para sempre as carreiras de gênios como ele e outros como Zizinho, Jair da Rosa Pinto e Danilo Alvim, além do goleiro Barbosa.
Ademir é até hoje o quarto maior artilheiro de uma Copa do Mundo e o maior de todos os goleadores brasileiros na competição da FIFA. Marcou 9 gols, dois a mais que Jairzinho na epopeia de 1970. O primeiro a tremer o Maracanã.
Dele veio o “rush”, termo dado à época para as corridas em direção ao gol, deixando para trás zagueiros atônitos. Dele veio a nomenclatura “ponta de lança”, para explicar sua capacidade de jogar em todas as posições do ataque.
O maestro Ary Barroso, flamenguista, compôs Ademir: “O futebol de Ademir é a música da terra, de ritmo marcante e beleza inconfundível. Que faz Ademir a caminho do arco, senão passes do mais puro samba, da mais brasileira das capoeiras…”. Hoje ele faria 98 anos.
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