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O auge festivo da Ponta do Morcego

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Isaac Ribeiro
Repórter

As primeiras impressões do gaúcho Max Fonseca, 52 anos, ao chegar em Natal, em 1985, foram as melhores possíveis. Nascido em Porto Alegre, onde as pessoas são mais resguardadas e introspectivas, talvez devido ao frio, ele diz ter sido um grande impacto positivo. Praia, bares animados, pessoas nas ruas, o fez sentir em uma “cidade em festa”, que vivia intensamente e celebrava a vida, a sua própria condição de “paraíso”. Motivado por esse lado festivo, decidiu se dedicar à vida noturna, tornando-se proprietário de alguns bares, entre eles o Chernobyl, marco da balada alternativa natalense. Max, ex-presidente local e atual membro nacional da diretoria da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel/RN), viveu o auge da Ponta Morcego, trecho colado à Praia dos Artistas. É sobre esse ponto da cidade que trata o Minha Área de hoje. Confira.      

O “Baixo Natal” dos anos 80

“A Ponta do Morcego era, na década de 80, o foco da noite de Natal. Tinha a praia de dia, frequentada pelo o pessoal que descia de Petrópolis, a galera nova ia surfar, e à noite, tinha aquele movimento. Na época em que eu cheguei aqui foi quando abriu o Chaplin, que virou a grande atração noturna de Natal. Era o bar mais descolado, mais chique. A gente também tinha na Ponta do Morcego aqueles restaurantes mais tradicionais, tinha o Calamar, que era bem grande e muito frequentado durante o dia. E à noite, tinha tido, pouco tempo antes de chegar, o Tiraguzo, onde era o Chaplin, no verão anterior, e depois tinha tido um bar grande do Angelo Burrão, que teve outras boates em Natal. Aí eu fui trabalhar primeiro no Café de Paris, exatamente onde funcionou depois o Chernobyl. Do Café de Paris, eu vi o Boliviano, que era o pico alternativo da galera antigamente. Eu comprei o Boliviano, fiquei um tempo ali, e acabei vendendo e viajei. Quando voltei, por esse relacionamento com o dono do Café de Paris, ele me deu a garagem na lateral, no beco que dava nas pedras e no mar. Tinha todo um elã em torno do lugar. No verão anterior, quando eu tinha o Barumbas, foi quando abriu um bar do Flávio Rezende, o NuGrau; foi quando abriu o Moenda, que era um bar muito descolado, que tinha o Pedrinho Mendes e o Sueldo fazendo som lá. Continuava o Chaplin. Esse era o movimento noturno de Natal no final de 1985. Inclusive tinha alguns outros lugares na Praia dos Artistas, mais para lá, mas concentrou ali a partir de 1986, quando no final desse ano eu abri o Chernobyl. Aí sim consolidou geral aquele lugar.”

Tudo terminava na Ladeira do Sol

“Os comícios, aquelas grandes passeatas, outros acontecimentos na cidade, tudo terminava de manhã na praia. A Banda Gália terminava de manhã na praia. Tinha um foco na noite, madrugada, pois era uma época um pouco diferente de hoje, quando os bares fecham mais cedo. Hoje tem poucos lugares que amanhecem o dia. Naquele tempo, amanhecer o dia era algo absolutamente natural. O Chernobyl fechava 6h ou 7h da manhã, corriqueiramente. Não era exceção. O pessoal que morava em Petrópolis descia e subia a pé pra casa, normalmente. O Chernobyl era um bar eminentemente da rua! Era uma garagem pra dois carros que recebia mil pessoas. Não lá dentro, tudo na calçada. E tinha outro aspecto que era uma peculiaridade também da época, era o pessoal na rua mas com o consumo no bar.  Eu colocava música ao vivo sem cobrar couvert; pagava as bandas  com o consumo, que era todo concentrado no bar. Hoje você tem uma concorrência bem desleal, que não promove mais esse tipo de coisa. Você tem que fechar, cobrar entrada.”

O agito da noite era na rua

“A diferença que a gente vê na noite é que está cada vez mais fechada, não só pela questão da insegurança mas por essa questão da concorrência desleal. Hoje tudo é fechado. Tu tem que entrar no lugar pra ter alguma coisa. Aí, ao mesmo tempo, tem a lei do cigarro, que não permite fumar dentro do bar, tem que sair. É uma coisa que eu acho muito chata, desagradável. A gente se uniu em sociedade para a vida ficar mais fácil. Hoje, com esse cabedal de leis, de direitos e minorias, cada vez tem mais leis restritivas. Tudo hoje é mais difícil e complicado. E tem essa tradição do natalense, que gosta de estar na rua, ao ar livre… claro, a gente vive num ambiente tropical. Guardadas as devidas proporções, a gente não tem chuva, a gente tem um clima ameno. Então as pessoas querem estar nas ruas. E hoje se faz tudo para fechar. No fim do beco do Chernobyl eram as pedras e o mar. Você estava no bar e daqui a pouco ia ali pra dar uma namoradinha, pra não sei o que… Quer dizer, você tinha um contato com a natureza. Era uma coisa natural estar na rua e no bar. Tinha um banquinho ali nas pedras e era a coisa mais normal chegar lá e ter um casal no ‘desdobre’ e tal (risos). Uma coisa que não se imagina hoje; ficar namorando em uma pedras na Ponta do Morcego, alta madrugada. Quem é que faz isso hoje?”

Saindo da Ponta do Morcego

Quando o Chenobyl fechou, a Ponta do Morcego ainda estava no auge. Tanto que o Chaplin, com essas releituras e transformações, continua até hoje. Atualmente, é uma casa de eventos mas continua. Isso porque aquele lugar, geograficamente, é muito top. E tem a questão da proximidade com o grande público de Natal, que é Petrópolis/Tirol, onde mora muita gente. Mas hoje mudou. Há um envelhecimento da população desses lugares. A galera mais nova saiu para os bairros mais distantes, ficou um pessoal de idade mais avançada, que geralmente não vive a noite. Mas naquela época tinha todo um mercado consumidor de cultura, de arte, de noite, de festa, de balada. Acontecia alguma coisa lá em cima, depois descia para estar no ‘Baixo de Natal’ — uma alusão ao Baixo Leblon, no Rio de Janeiro, que tinha todo um charme. Tinha uma coisa orgânica muito forte da cidade com a Ponta do Morcego e com o princípio da Praia dos Artistas. Quanto a saída de lá, o dono do Café de Paris passou o ponto pra outra pessoa e essa, em vez de enxergar na parceria a manutenção do sucesso dos dois bares, resolveu me engolir. Como ele alugava 80% do local, decidiu negociar com o proprietário os 100% e me tirou; ao ponto de eu sair e na outra semana ele abrir o mesmo lugar e com o mesmo nome!!! Acabou que ele perdeu os dois bares. Eu já estava com outro local, com uma cara mais de restaurante, o Fórum Local, em Petrópolis, e aí fiquei lá.  E acabou que o movimento saiu da Ponta do Morcego e foi pra Ponta Negra. 

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