quinta-feira, 28 de março, 2024
27.1 C
Natal
quinta-feira, 28 de março, 2024

O bispo que revolucionou seu tempo

- Publicidade -

João Faustino – professor e senador

Dom Eugênio de Araújo Sales é uma das figuras humanas mais completas com quem convivi. Ele não foi apenas o bispo que revolucionou o seu tempo, com idéias e ações que até hoje marcam a história da Igreja Católica no Rio Grande do Norte e no Brasil, mas um ser capaz de conciliar a elegância e a austeridade de um príncipe com a simplicidade de um pastor de ovelhas que deseja o seu rebanho sempre unido, resistente e disciplinado. Nada o intimidou na sua ação pastoral, por sinal exemplar e determinada. As ideias que concebia rapidamente tomavam corpo, impregnando as pessoas de idealismo. Isto porque nasciam com uma forte marca, própria das daqueles cujas vidas se assemelham às dos sábios e profetas.

Com muita altivez fez prevalecer, em todos os momentos, a dignidade do líder que sempre foi. Nunca abdicou da representação que recebera, mesmo quando pressionado por poderosos governantes ou pela virulência da ditadura. Lutou por tudo o que concebeu e não permitiu que suas iniciativas fossem sepultadas pela força do arbítrio.

Somente um homem com essas características seria capaz de aglutinar tantas pessoas, na sua grande maioria jovens, alguns ainda saindo da adolescência, para realizar o maior e mais abrangente programa social da história do Rio Grande do Norte.

Fui um desses jovens a ser conquistado e atraído pelo idealismo de Dom Eugênio de Araújo Sales, talvez pela liderança estudantil que naquela época exercia. Aliás, todos líderes que militavam na Ação Católica eram por ele, convocados para uma efetiva integração no Serviço de Assistência Rural ou nos Movimentos de Educação de Base, por ele criados.

Em muitas ocasiões fui por ele designado para presidir assembleias de trabalhadores rurais e em cada uma delas via nascer um sindicato rural. A sensação era aquela de ver brotar, no meio dos mais pobres, um símbolo forte de cooperação, de solidariedade e de justiça social.

Por outro lado me sentia, como se mágico fosse, quando ensinava matemática nas escolas radiofônicas por ele criadas. Cada aula que gravava me imaginava diante de milhares de pessoas, reunidas em casa de taipa, sem água e sem luz, em redor de um pequeno rádio movido por uma bateria de automóvel. Era aquele radinho de baquelite marrom que modificava a vida das pessoas, enchendo-as de otimismo e de força interior, organizando-as nos seus objetivos de viver.

Quantas e quantas pessoas descobriam através das escolas radiofônicas que não eram escravas de ninguém, que tinham uma vida dada por Deus e que essa vida somente tinha significado quando se via repleta de felicidade e de liberdade.

Quantos trabalhadores de mãos calejadas, de faces prematuramente enrugadas, vítimas de injustiças gritantes, obtinham pela força do sindicato, salários mais justos e condições de trabalho mais humanas. Quantos homens e mulheres foram alfabetizados, concluíram o curso primário, fizeram exame de madureza, alguns até ingressaram no ensino superior. Isto quando o ensino ginasial era um privilégio de poucos.

Dom Eugênio dizia sempre que o segredo para que obtivesse êxito em qualquer projeto de promoção humana era cercar-se de jovens, confiar neles, dar-lhes atribuições, cobrar-lhes eficiência. Assim, construiu a grande universidade por onde passaram dezenas de jovens, hoje líderes políticos, profissionais bem sucedidos, professores universitários, escritores e cientistas. Somente um líder, um gestor eficiente, um sacerdote exemplar seria capaz de fazer tanto, de reconstruir esperanças, de acender na consciência coletiva a confiança no futuro.

- Publicidade -
Últimas Notícias
- Publicidade -
Notícias Relacionadas