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O cordel encantado do jovem poeta

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Ramon Ribeiro
Repórter

Filipe Borges não para na cadeira. Saca o celular e faz uma selfie, mostra um detalhe de seu livro “Natureza em Versos”, pega o jornal do dia e faz uma piada sobre alguma imagem. Filipe tem a energia das crianças de sua idade, 10 anos. Na conversa ao VIVER, ele dá respostas curtas, está desconfortável. “Ele está um pouco nervoso e desconta nas gaiatices. Mas em casa ele é bem quietinho”, comenta a mãe Cláudia Borges. De fato, a praia de Filipe não é bater papo com jornalistas. É por meio dos versos, declamando cordéis que sabe de memória, que ele se sente à vontade – não importa se diante de outras crianças, nas escolas em que já foi convidado a se apresentar, ou dando uma canja no meio de marmanjos e marmanjas em eventos voltados para a cultura popular. Para quem assiste a uma de suas performances, é difícil não se encantar tamanho o desembaraço do garoto com as palavras, as rimas, o ritmo, a entonação e a movimentação gestual de sua interpretação.
Aos dez anos, Filipe Borges é promessa na literatura de cordel e se destaca pela memória e agilidade verbal, ao declamar versos antológicos
Parnamirinense, Filipe Borges reside em São José de Mipibu, onde cursa o 5º ano em uma escola municipal da cidade. Como os colegas, gosta de jogos eletrônicos e desenhos animados. Mas, vindo de uma linhagem de poetas (sua avó era violeira e repentista de feira no interior, e a mãe é contadora de histórias e cordelista), não é de se estranhar que o interesse pelos versos cedo ou tarde aparecesse – no seu caso, bem cedo. No entanto, cordelistas precoces não são algo inédito, o que surpreende em Filipe é o talento e a memória para decorar tantos e tão longos cordéis. Segundo o próprio, são pelo menos uns 17 cordéis decorados, alguns com mais de 30 estrofes, como o político e sensível “A Casa que a Fome Mora”, do mossoroense Antônio Francisco, poeta preferido do garoto.

“Sempre incentivei a leitura em casa. Mas não imaginei que ele fosse se identificar tanto e tão novo pela literatura de cordel”, diz a mãe Cláudia Borges. “Desde os cinco anos que ele lê cordéis em casa, foi alfabetizado assim. E desde novinho ele frenquenta recitais comigo. Mas no ano passado, em um evento de cultura popular, quando assistíamos algumas declamações, ele pede um espaço e recita um cordel inteiro de Antônio Francisco. Fui pega de surpresa, ele sempre foi tímido. Fiquei muito emocionada”. O cordel em questão foi “Os Animais tem Razão” (que Filipe começa a recitar no meio da entrevista). A declamação foi no Dia da Poesia em Natal, 14 de Março, e marcou a estreia do artista mirim.

Desde então o garoto vem aperfeiçoando sua performance com mais leituras, ouvindo os toques que a mãe lhe dá, mas sem baixar o rendimento na escola – onde já é bastante querido pelos colegas. E as apresentações não param, seja como convidado, ou fazendo intervenções de gaiato. Na Feira de livros e quadrinhos de Natal (Fliq) e no Festival Literário de Natal (Flin), ele já mandou os versos que gosta (além de Antônio Franciso, em seu repertório tem cordéis de sua mãe, de José Acaci, Bráulio Bessa, dentre outros). Fora Natal e S. José de Mipibu, o talento de Filipe também já foi visto em Parnamirim e em breve deve ser mostrado em Assu, onde foi convidado para se apresentar.

Para marcar um ano de declamações públicas, ele lançou no dia da poesia, o seu livro primeiro livro de cordel, “Natureza em Versos”, feito em quadras, sextilhas, setilhas e ilustrações suas. “As pessoas estão cortando as árvores, poluindo os rios. São muitos erros. Meu desejo é que as pessoas melhorem. Eu convido a todos a se juntarem a cuidar da natureza, porque somando somos mais fortes”, comenta o poeta mirim sobre a escolha do tema ambiental. O prefácio é em versos, feito pelo mestre Antônio Francisco.

O trabalho já está em seu repertório de declamações, apesar do poeta mirim esquecer de algumas estrofes à vezes. Filipe explica que para decorar tantos cordéis é preciso primeiro entender a história – o que ele gosta de fazer comentando com a mãe as metáforas. Depois ele vai por parte. Grava na mente a primeira estrofe, quando parte para a segunda, revisa a primeira, e assim faz sucessivamente até terminar todo o cordel. “Uma história de dez estrofes eu decoro em um dia, revisando no terceiro”, diz o garoto, comentado que o tipo de cordel que ele mais gosta de declamar é o galope à beira mar. Mas para escrever ele ainda está aprendendo.

Cláudia, que é membro da Academia Norte-riograndense de Literatura de Cordel (Anlic), conta que junto com o filho vem desenvolvendo o que ela chama de teatro de cordel, onde ela une sua experiência como cordelista e contadora de histórias ao talento interpretativo do filhote. “Diferente de outras crianças que também declamam cordel, o Fililpe é muito cênico. Sabe dar vida aos personagens, sabe a hora de fazer rir e de ser sério quando o os versos pedem. Sem contar que ele não tem medo de interagir com o público, o que faz com bastante desenvoltura para alguém da idade dele”, avalia a mãe.

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Assista o vídeo onde Filipe declama ‘A casa que a Fome Mora’, de Antônio Francisco.

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