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O de fora e o de dentro

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Lívio Oliveira – advogado público e poeta
O avesso é sempre o negativo? Ou pode ser a descoberta do porquê e de quem tem sentido verdadeiro? Como falar sobre o verso sem falar acerca do anverso e do inverso? O poeta Theo G. Alves, nascido em Natal e radicado na muito seridoense Currais Novos, conhece todos os lados. Exibe-nos. E nos diz coisas que precisamos saber sobre eles. Sobre nós, sobretudo. Retrata cidades, casas e corpos, por fora e por dentro, bem dentro. Lá no fundo da gruta em que se encontra sua palavra em pleno “peso mineral”. E no entorno. Tudo isso urdido nos poemas do seu novo livro “a máquina de avessar os dias”, edição engendrada meticulosamente pela “Flor do Sal”.
Nessa obra que, a meu ver já foi concebida e teve nascimento como um clássico das nossas letras potiguares, Theo lapida as pedras sobre as quais constrói/reconstrói a “cidade aniquilada” da memória e da não-memória, do sonho e do que já foi. E do que é desilusão e é pathos. O seu livro circunda um tempo e um espaço que estrondam como pedra grande partida sobre o solo. E que também está em movimento desembestado e em calmaria e em silêncio. Tudo junto. Tudo separado e esmiuçado. Grandezas e miudezas de Theo.
Tudo o que está no livro é o que brota da lavra íntima e intensa de Theo. Lavra a larva. Aquilo que queima dentro e que tem que se fazer ver no exterior, na margem oposta do açude caudaloso de um poeta de verdade, verdades. Há ruínas, escombros à margem desses dias ao avesso?! Muitos. Tantos. Por todo lado. Fora e dentro, porque é assim que nos propõe na origem. Assim é que miramos o horizonte de Theo. Horizonte de Deus, nome que pesa como rocha banhada de sol. Horizonte de crepúsculo seridoense. Só não se sabe se do nascer, se do morrer. É o dia que circula, dá voltas e traz a memória, os vivos, os mortos, a ancestralidade e as cicatrizes para “a pele antiga/da cidade?”.
O bom do livro de Theo é que não espalha respostas como armadilhas por aí. Apenas abre o seu “álbum de família”, fazendo-nos olhar e tatear cuidadosamente fotos antigas para que o peso da herança não rompa o “azul sonolento” dos fantasmas e sua “pele muito fina” e “veias frágeis”. Tudo requer certo cuidado, delicados procedimentos para que não venha abaixo “a pedra insustentável/de uma cidade aniquilada”.
Formalmente, o livro de Theo também distribui sutilezas, minudências, belezas que se revelam como numa máquina pequena e cheia de peças mínimas que precisam ser ajustadas por relojoeiro certeiro em seus gestos manuais especialmente articulados. Algumas sínteses são pepitas poéticas, como esses três poderosos, reveladores e aforismáticos versos: “o tempo/já não/conta”. 
O livro de Theo é mistura, amálgama, composição multicolorida e em cinza, depende das secas internas. Chuvas nem sempre molham a “carcaça de tua pedra”: é o que nos vem dito nesse livro sem data marcada no tempo, mesmo se sabendo que Theo – tal qual sua avó que inventou a máquina de avessar – “pôs-se a engendrar/memórias” e nos presenteou essa engenhosidade ancestral esse livro de “poema/mofo”, para que usemos com perspicácia e pertinência de atores que sabemos o papel a ser desempenhado no tempo teatral que nos é dado. Porque Theo já nos advertiu que somos todos “homem/persona/memória”.
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