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O desafio de quem escreve

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PADRE JOÃO MEDEIROS FILHO
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A palavra também move o mundo. É fonte de alegria ou tristeza, paz ou revolta, amor ou ódio, vida ou destruição. Inspiradamente afirmou o vate itabirano: “Lutar com palavras é a luta mais vã. Entanto lutamos mal rompe a manhã”. Temos compromisso com elas, firmado publicamente, quando assumimos o encargo e a honra de sentar na cadeira de Dom Nivaldo Monte, na Academia Norte-Rio-Grandense de Letras. Ali prometemos zelar pela forma e pelo conteúdo das mesmas. Na verdade, escrever é expor-se, ao revelar as próprias ideias e valores. De nossa parte é, também, como sacerdote, traduzir o pensamento cristão. Não que sejamos aqui obrigados a dissertar apenas sobre assuntos religiosos. O jornal é laico, tampouco possui oficialmente identidade de credo. Não obstante, trazemos frequentemente para este espaço temas ligados ao cristianismo. Por vezes, abordamos assuntos passíveis de discussão. A coluna se pretende um lugar de reflexão e não de catequese, proselitismo ou apologética. Buscamos fidelidade ao pensamento da Igreja à qual servimos. No entanto, isso não implica em subserviência, obscurantismo ou ausência de análises críticas e direito de sugerir. A Igreja, observados os dogmas e certos princípios morais ou disciplinares, respeita a liberdade de pensar e expor.

Desde nosso primeiro artigo neste diário, temos a nítida consciência de que nos dirigimos a um universo aberto, dentro de um espaço democrático, que acolhe diferentes ideias. Ele espelha, assim, a diversidade de seus leitores. Caber-lhes-á tirar as devidas conclusões a respeito do que leem, escrito por pessoas, às vezes, desconhecidas. Nesse trabalho de síntese, saberão seguir a oportuna orientação dada pelo apóstolo Paulo aos tessalonicenses: “Examinai tudo e ficai com o que é bom” (1Tes 5,21). Esperamos que essa tentativa de explicitar valores e fazer emergir apelos de justiça, honestidade, coerência e verdade social, seja útil aos leitores. Pretendemos modestamente enfatizar o pensar cristão. Vale citar novamente o apóstolo Paulo, quando pregou no Areópago de Atenas: “Ao Deus desconhecido. Esse, pois, que vós honrais, não o conhecendo, é o que eu vos anuncio” (cfr. At 17, 23).

É triste constatar aonde chegamos nestas duas décadas do terceiro milênio. Há os que querem destruir os outros, porque são de religião diferente. Não faltam os que pertencendo a partidos políticos opostos, exacerbam preconceitos, arrogância, violência e intransigência, atitudes indignas de um convívio social civilizado. Assistimos a quadros de quase delírios, exaltações despropositadas, que beiram à insanidade e se manifestam marcados de sandices. O que importa para certos políticos é sobretudo o partido, o projeto político e o poder, e não o Brasil. Presenciamos torcidas rivais, que deixam o espetáculo esportivo de lado, para se agredirem até com tiros. Tais absurdos vão longe, abusando-se do desrespeito ao próximo. É viável não concordar com o outro e até apresentar as razões da discordância. Não é lícito, porém, feri-lo em sua dignidade nem querer destruí-lo por pensar de modo contrário. Temos o direito de ser diferentes, sem intransigência e radicalismo. A diversidade é inerente ao ser e ao viver humano. O Papa Francisco advertiu recentemente, em sua homilia, na Casa Santa Marta: “hoje há muitos profetas da tristeza, da desgraça e da destruição”. A lição que Jesus deu à humanidade é insuperável. Ele se fez um de nós e apresentou-nos o Evangelho. O Mestre legou-nos o exemplo do diálogo e do perdão, como dimensão essencial da vida. As atrocidades, o desrespeito, a desonestidade, as injustiças que presenciamos não condizem com um país considerado católico e somado aos evangélicos forma a segunda maior nação cristã do mundo.

Ao escrever, oferecemos razões da própria esperança e tentamos construir comunhão. Desafio difícil e exigente. Mas, os apóstolos e os discípulos do Mestre colocaram por escrito a Palavra. E isto também é encarná-la. “E o Verbo de Deus se fez carne e habitou entre nós”! (Jo 1, 14). Concluímos com os versos de Drummond (31 de outubro era o aniversário do poeta), no mesmo poema “… e um sapiente amor me ensina a fruir de cada palavra a essência captada”.

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