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‘O governo de rua é uma revolução dentro da Revolução’

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Ignacio Ramonet – Fundador da Media Watch Global

»entrevista» Nicolás Maduro

Adital – Depois de ter fracassado em sua tentativa de deslegitimar a vitória de Nicolás Maduro, democraticamente eleito presidente da Venezuela em 14 de abril, a oposição já prepara as eleições municipais de 8 de dezembro. Nessa perspectiva, lançou recentemente, o boato de que o presidente Maduro não teria nascido na Venezuela e, por conseguinte, como estipula a Constituição, sua eleição não seria válida. Sobre essa nova campanha de intoxicação e vários outros temas da atualidade, o jornalista Ignacio Ramonet, fundador da fundador da Media Watch Global conversou com  Maduro  a bordo de um helicóptero que os conduzia de Caracas a Taguanes (Estado Guárico), no mesmo dia em que se cumpriam seus primeiros 100 dias de governo como Presidente da República Bolivariana.

Maduro foi eleito presidente  num dos momentos mais tensos da Venezuela. A eleição ocorreu pouco mais de um mês depois da morte do comandante Hugo Chavez, o militar que se converteu à política e fundou a República Bolivariana da Venezuela. As tentativas de anular os pleito foram em vão. Fiel escudeiro de Chávez, Maduro implantou mudanças. Venceu a batalha das eleições de 2013 e agora se  se prepara para um novo combate nas urnas.

A oposição venezuelana lançou uma campanha afirmando que o senhor não nasceu na Venezuela, mas, na Colômbia. Que comentários essa acusação lhe inspira?
O objetivo dessa loucura lançada por um demente da ultradireita panamenha é criar as condições para uma desestabilização política. Tentam conseguir o que não puderam fazer nem através das eleições, nem dos golpes de Estado, nem através das sabotagens econômicas. Estão desesperados. E se baseiam na ideologia anticolombiana que a burguesia e a direita venezuelanas sempre tiveram contra o povo da Colômbia. A esse respeito, se eu houvesse nascido em Cúcuta ou em Bogotá, me sentiria feliz de ser colombiano. Porque é uma terra fundada por Bolívar. Se tivesse nascido em Quito ou em Guayaquil, também me sentiria orgulhoso de ser equatoriano, porque é uma terra libertada por Bolívar; ou em Lima, ou em Potosí, ou em La Paz, ou em Cochabamba, me sentiria feliz por ser peruano ou boliviano; e se houvesse nascido no Panamá, terra de Omar Torrijos, terra de dignidade, que fez parte da Gran Colômbia, de Bolívar, também me sentiria orgulhoso de ser panamenho. Porém, nasci e me criei em Caracas, berço do Libertador; nessa Caracas sempre convulsa, rebelde, revolucionária. E aqui estou como Presidente. Essas loucuras serão recordadas como parte da crise de desespero esquizofrênico na qual, às vezes, a direita internacional entra com o objetivo de acabar com essa réstia de luz que é a revolução bolivariana.

Por outro lado, o Presidente da Assembleia Nacional declarou recentemente que foram descobertas conspirações contra o senhor, com intenção de atentar contra sua vida.
Sim, o ministro do Interior, Rodríguez Torres, o Presidente da Assembleia Nacional, Diosdado Cabello e eu mesmo revelamos um dos planos de assassinato que estava sendo preparado para o dia 24 de julho, aniversário do nascimento de Simón Bolívar, e comemoração dos 190 anos da Batalha Naval de Maracaibo. Dispunham de um conjunto de planos que conseguimos neutralizar e que têm sempre sua origem na mesma direita internacional. Aí, aparece, por exemplo, o nome de Álvaro Uribe (ex-presidente da Colômbia), que tem uma obsessão contra a Venezuela e contra os filhos de Chávez. Aparece também a velha máfia de Miami, a de Posada Carriles, que conta com o apoio de importantes instâncias de poder nos EUA. O governo de Barack Obama não quis desmontar essa máfia de Posada Carriles, um terrorista convicto e confesso, perseguido pelas leis de nosso país porque derrubou um avião cubano em outubro de 1976…
Nicolás Maduro Moros, nascido em Caracas em 23 de novembro de 1962, é o 57º presidente venezuelano. Ex-militante da Liga Socialista, ex-deputado, trabalhou desde jovem como maquinista
O senhor pensa que o fracasso da oposição em sua tentativa de desestabilização se deve à política que o senhor tem impulsionado, ou a uma mudança de atitude da  oposição ante as eleições municipais de 8 de dezembro?
Deve-se, principalmente, à fortaleza institucional da democracia venezuelana, e a decisão que tomei, apoiando-me nessa fortaleza, de derrotar o mais cedo possível a tentativa de insurreição e de violência. Neutralizá-lo. Não permitir que se estendesse. Eles tentaram uma espécie de insurreição nas principais cidades, nos dias 15 e 16 de abril.

O senhor teme uma divisão do chavismo?
As forças divisionistas e dissolventes sempre ameaçaram qualquer revolução. As aspirações ao poder de grupos de pessoas são uma negação do projeto da Revolução Bolivariana, que é de caráter socialista, e exige desprendimento e sacrifício. O comandante Chávez foi presidente porque as circunstâncias da história o colocaram nesse posto. E eu sou presidente, não por ambição individual ou porque represento um grupo econômico ou político; sou presidente porque o comandante Chávez me preparou, me designou e o povo venezuelano me ratificou em eleições livres e democráticas. Assim, todas essas forças dissolventes sempre existirão. Porém, a revolução tem a capacidade moral, política, ideológica para sobrepor-se a qualquer tentativa de divisão de suas forças. Teremos que fazer um grande esforço para derrotar as forças dissolventes desses setores que se dizem chavistas; mas, no final, acabam sendo aliados da contrarrevolução.

Em relação à prática governamental, o senhor introduziu várias mudanças, sobretudo, o que chama o “governo de rua” Que balanço faz dessa prática?
Em primeiro lugar, o “governo de rua”, estabeleceu nessa nova etapa um método para que exista uma direção coletiva da Revolução. Segundo: criou-se um sistema de governo onde não há intermediários entre o poder popular local e a instância de governo nacional. Trás solução para problemas concretos; porém, contribui à construção do socialismo, das comunas, de uma economia socialista, e a consolidação de um sistema público de saúde integral, gratuito e de qualidade, e de um sistema educativo público e gratuito de qualidade… E o “governo de rua” é uma revolução dentro da Revolução.

É também uma maneira de combater o burocratismo?
De vencê-lo. Propondo outro sistema. Porque os modelos de governo que herdamos expressam a forma de governar do Estado burguês, ele mesmo herdeiro da colônia, na América Latina. O presidente Chávez os derrotou mediante as Missões que constituíram um novo modelo de gestão das políticas públicas. Nós estamos agregando o “governo de rua” às Missões, que, poderíamos dizer, é uma instrução direta do comandante Chávez. Ele nos ordenou, a Elías Jaua que era vice-presidente na época e a mim, que era vice-presidente político, que fôssemos construindo um sistema de governo regionalizado. 0 ”popular”, dizia ele. E eu lhe pus “governo de rua”. Todas são instruções e orientações dentro da filosofia de um modelo socialista no qual o poder não seja das elites –nem elites burguesas, nem novas elites que se burocratizam ou se aburguesam. Queremos que o poder esteja democratizado, que seja uma vacina contra o burocratismo e, além do mais, que nos permita alcançar a “eficiência socialista”.

Se a oposição ganhar as eleições municipais de 8 de dezembro é provável que chame a um referendo revocatório em 2015. Como o senhor vê essa perspectiva?
Estamos preparados para todos os cenários. Sempre diremos a verdade ao povo. Se a oposição conseguir uma boa votação no 8 de dezembro, tentará aprofundar a desestabilização para dissolver nossa pátria, acabar com a independência e acabar com a Revolução do comandante Chávez. Vão impor cenários de desestabilização violenta em primeiro lugar e os EUA tentarão acabar com os níveis de independência e de união que a América Latina possui hoje. Temos uma grande responsabilidade, porque estamos defendendo um projeto que pode tornar possível outro mundo em nossa região e pode contribuir para criar um mundo multipolar, sem hegemonias econômicas, militares, nem políticas do imperialismo estadunidense.

Como o senhor explica o resultado de 14 de abril, e como pensa ganhar o 8 de dezembro?

Há um eleitorado que sempre votou indistintamente na oposição. Porém, no dia 14 de abril, uma boa parte dos que não votaram em nós o fizeram por descontentamento, por coisas mal feitas, problemas acumulados… No entanto, esses eleitores nunca acompanharam as aventuras golpistas e antibolivarianas da direita. A esses venezuelanos, nós, permanentemente, dizemos que estamos na rua, trabalhando para melhorar as coisas. Eles sabem que não tem sido fácil.  O “governo de rua”; a recuperação da economia; a atenção a temas intransferíveis, como a segurança cidadã, a corrupção, nos dará forças para a grande vitória do 8 de dezembro. E será a garantia de que se abre um novo caminho para a construção do socialismo do século XXI.

Até onde o senhor pensa chegar em sua luta contra a corrupção?
Até as últimas consequências. Vamos com tudo! Enfrentamos uma direita muito corrupta, herdeira da 4ª República descomposta e em decadência. Porém, também estamos enfrentando a corrupção que fez ninho no campo revolucionário ou no seio do Estado. Não haverá trégua! Constitui uma equipe secreta de investigadores incorruptíveis que já estão destampando vários casos. Temos alguns detidos de mais alto nível e vamos seguir atacando forte. Serão julgados e irão para onde devem ir: para a prisão!

Como o senhor vê a situação da economia venezuelana? Vários análises alertam sobre o elevado nível da inflação.
A economia venezuelana está em transição para um novo modelo produtivo, diversificado e ‘socialista do século XXI’, no marco da construção de um novo quadro econômico constituído pela integração sul-americana e latino-americana. Não devemos esquecer que, agora, somos membros do Mercosul; somos membros da Alba (Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América) e lideramos Petrocaribe. Toda essa massa geográfico-demográfico-econômica reúne 24 países do continente, o que poderia representar quase a quarta economia do mundo… Temos que transformar a economia venezuelana e conectá-la com o desenvolvimento desse novo marco econômico, e, ao mesmo tempo, integrar-nos, em situação vantajosa, na economia mundial. Não de dependência. Por isso digo que estamos em transição. Sobre a inflação, lhe direi que padecemos um ataque muito forte, especulativo, contra nossa moeda, e estamos superando. Há também uma sabotagem ao abastecimento de vários produtos. Tudo isso produz inflação.

Como assim? O que será feito?
Vamos estabilizar a moeda. Já começamos a estabilizar o abastecimento; porém, a chave fundamental para que saiamos desse modelo rentista, dependente, é a diversificação de nossa produção. Estamos realizando grandes investimentos em setores chave da produção de alimentos, da agroindústria e da indústria pesada. Estamos atraindo capital internacional que traga divisas e tecnologia. Recentemente, fizemos um giro pela Europa e estamos otimistas de que venham capitais da França, da Itália, de Portugal. Desejamos que venha capital do Brasil,  Índia,  China, com sua tecnologia para desenvolver a indústria intermediária, diversificando-a.

Como vão as relações com Washinton?
Os Estados Unidos vão se preparando para uma nova etapa, que é crescer em dominação militar e econômica. Na América Latina, seu projeto é reverter os processos progressistas de mudança para voltar a converter-nos em seu pátio traseiro/quintal.  Sob o mandatário Obama aconteceram os golpes de Estado em Honduras, dirigido pelo Pentágono; tentativa de golpe de Estado contra o presidente do Equador, Rafael Correa; golpe de Estado no Paraguai, operado por Washington, para tirar do poder o presidente Fernando Lugo… Por isso, a relação do governo de Obama conosco é esquizofrênica.

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