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O inimigo do movimento negro

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Ivan Maciel de Andrade                                                                                                           
Procurador de Justiça e professor da UFRN (inativo)

O ex-presidente da Fundação Cultural Palmares (sua nomeação foi suspensa judicialmente), Sérgio Nascimento de Camargo, atacou a História: “A escravidão foi terrível, mas benéfica para os descendentes. Negros do Brasil vivem melhor que os negros da África”. Segundo a imprensa, Sérgio Camargo se apresenta como sendo um “negro de direita”. Na verdade, ele é um ignorantão. Em livro publicado recentemente (“Escravidão”, vol. I, ed. Globo Livros, 2019), o escritor e jornalista Laurentino Gomes oferece testemunho sobre a África: “Nas minhas viagens de pesquisa, pude constatar que a África real, em muitos aspectos, assemelha-se ao Brasil. Tem, sim, pobreza, corrupção, mazelas e problemas. Ao mesmo tempo, tem países de economia dinâmica, gente trabalhadora e empreendedora, legiões de estudantes que, em número cada vez maior, frequentam universidades e centros de pesquisa”. Então, Sérgio poderia ter na África uma vida tão boa quanto a que tem aqui.

E após a escravidão, o que aconteceu com os afrodescendentes? Responde Laurentino Gomes: “A escravidão acabou em 1888, mas o Brasil jamais se empenhou, de fato, em resolver ‘o problema do negro’. Liberdade nunca significou, para os ex-escravos e seus descendentes, oportunidade de mobilidade social ou melhoria de vida.” Sintetiza Laurentino Gomes numa curta frase a situação dos descendentes de escravos: “Nunca foram tratados como cidadãos”. Explica, a seguir, que “os resultados aparecem nas estatísticas a respeito da profunda e perigosa desigualdade social no país”. É preciso ir ao livro de Laurentino Gomes para conhecer essa impressionante e revoltante estatística.

Afinal, “a escravidão no Brasil foi uma tragédia humanitária de proporções gigantescas”, como demonstra Laurentino Gomes. Diz ele: “Arrancados do continente e da cultura em que nasceram, os africanos e seus descendentes construíram o Brasil com seu trabalho árduo, sofreram humilhações e violências, foram explorados e discriminados”. Discriminação que ainda subsiste, odiosa e renitente, embora Sérgio Camargo tenha a cara de pau de negar a existência de racismo no Brasil. Sustenta que “racismo real (?) existe nos EUA”. O daqui seria fictício ou não seria suficientemente daninho para merecer esse nome repugnante. Em que ele se baseou para chegar a tão insólita conclusão? Simples: “A negrada (sic) daqui reclama porque é imbecil e desinformada pela esquerda”. Está aí a explicação: a “imbecilidade da negrada” e sua manipulação pela esquerda inventaram o falso racismo brasileiro.

O despautério maior é que esse cara, escolhido para dirigir uma fundação criada com objetivo de “promover e preservar a cultura negra no país”, propõe a extinção do “movimento negro”. Sua raiva decorre do raciocínio de que o fortalecimento da causa antirracista gera o fortalecimento da esquerda. Levada essa ideia paranoica às últimas consequências, os gloriosos movimentos de defesa das minorias seriam reduzidos a meros instrumentos de autopromoção da esquerda. E essa lógica tacanha impulsionaria a hostilidade irracional da extrema direita a tais movimentos e, por extensão, às próprias minorias. Mas não é exatamente isso o que vem acontecendo na área cultural do governo brasileiro?

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