sexta-feira, 29 de março, 2024
26.1 C
Natal
sexta-feira, 29 de março, 2024

O inventário do memorial

- Publicidade -

Yuno Silva – repórter

O livro de visitas registrou exatas 10.373 assinaturas entre 14 de novembro e 30 de dezembro de 2008, um número expressivo para o curto período de funcionamento do Memorial de Natal, o imponente monumento de 45 metros de altura assinado pelo arquiteto Oscar Niemeyer (1907-2012) e fincado no Parque da Cidade. Fechado para o público desde o dia 2 de janeiro de 2009 por questões estruturais que poderiam ter sido perfeitamente superadas com um pouco de boa vontade política, o Memorial recebeu primeira visita técnica do museólogo Hélio de Oliveira na manhã de ontem como parte inicial do trabalho de recuperação do lugar.
Acompanhamos a primeira visita técnica do museólogo Hélio de Oliveira ao Memorial do Parque da Cidade, como parte inicial do trabalho de recuperação do lugar
#SAIBAMAIS#Oliveira está reassumindo a direção do Departamento de Patrimônio da Fundação Capitania das Artes, e a vistoria – acompanhada com exclusividade pela reportagem do VIVER – servirá para subsidiar a elaboração de um relatório sobre a situação atual da estrutura e do restou do acervo. “Tive um choque quando cheguei na portaria e vi tudo destruído. Percebo um grande descaso não só com o trabalho realizado, mas também com o dinheiro público”, disse o museólogo emocionado.

Hélio foi responsável pelo projeto museológico e expográfico do Memorial de Natal e lembra que trabalhou mais de um ano na concepção do museu ao lado de profissionais da área de História e Arqueologia, entre eles o arqueólogo Iago Henrique de Medeiros, a especialista em pré-história Marluce Lopes, Fátima Martins que respondeu pela pesquisa do período colonial e Raimundo Arrais consultor da história contemporânea.

“Conseguimos reunir um acervo significativo para recontar os dez mil anos de ocupação desta porção de terra que um dia viria a se tornar capital do Rio Grande do Norte”, explicou. Por enquanto ainda não há previsão de reabertura, e o conceito da exposição também poderá sofrer alterações. “A única certeza neste momento é que o Memorial já ficou tempo demais fechado, e vamos trabalhar para reabri-lo o mais rápido possível, principalmente por que Natal será vitrine para o mundo durante a Copa do Mundo”, avalia Oliveira.

A gestão do Parque da Cidade  Dom Nivaldo Monte é compartilhada entre a Funcarte, responsável pela parte museológica, e a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo (Semurb), que administra o parque em si. O município investiu cerca de R$ 22 milhões em sua construção e a única atração disponível atualmente são as trilhas de caminhada abertas de domingo a domingo das 5h às 18h.

O formato de olho no topo do Memorial, cuja altura equivale a um prédio de 15 andares, revela uma bela vista da cidade. A parte interna, entretanto, esconde os estragosParadeiro do projeto e televisores ainda é incerto

O destino do material que estava exposto durante o período que o Memorial de Natal funcionou é incerto: sabe-se que há alguns móveis e objetos guardados na sede da Funcarte e no Museu de Cultura Popular Djalma Maranhão, mas os novos gestores ainda não localizaram os equipamentos de multimídia, televisores de tela plana e o moderno projetor (de alta resolução). O vídeo contando os dez mil anos da história de Natal também está desaparecido. Felizmente as principais peças do acervo foram devolvidas, pois estavam emprestadas sob o modelo de comodato.

Hélio de Oliveira informa que a arca do tempo da colônia, que representa o poder do Estado, foi devolvido ao Instituto Histórico e Geográfico do RN; um machado de pedra foi devolvido para o acervo do Monsenhor Barros, de São José de Mipibu; pontas de pedra usada em flechas voltaram para o museu Lauro da escóssia em Mossoró. Uma das peças mais importantes era a pedra fundamental da antiga matriz de Nossa Senhora da Apresentação, descoberta nos anos 1990 durante a restauração da igreja. “É uma pedra dupla face que ficou séculos emparedada. Tivemos que restará-la, pois estava fragmentada em mais de 2 mil pedaços”, contou Hélio, informando que a relíquia voltou para a igreja. “Está dentro do contexto histórico, mas com pouca visibilidade”, analisa.

Ao todo eram cerca de 40 objetos que representavam cada um dos períodos retratados na exposição. “Como não houve interesse para renovar o contrato devolvemos tudo”, salientou o diretor do Departamento de Patrimônio da Funcarte.

Hélio Oliveira, museólogo: A única certeza neste momento é que o Memorial já ficou tempo demais fechado, e vamos trabalhar para reabri-lo o mais rápido possívelPara chegar lá, 200 degraus

A primeira impressão de quem chega ao Memorial é um misto de admiração e abandono; e a tarefa de encontrar justificativas para explicar os motivos de seu fechamento chega a ser ingrata: a recepção está destruída, os fossos dos elevadores estão vazios, sala de administração e copa para uso dos funcionários foram desmontadas, os equipamentos de multimídia e de projeção foram retirados – do acervo só restaram os painéis explicativos e a escultura dos Reis Magos, criada pelo artesão Emanoel de Santa Rita, no centro do salão principal.

A única maneira de atingir o topo é encarando os mais de 200 degraus, subida equivalente a um prédio de 15 andares, e a falta de ar-condicionado transforma o museu em um grande forno em formato de olho, o ‘olho de Neimeyer’ de onde se enxerga toda a grandeza da cidade, do rio Potengi ao Morro do Careca.

“Funcionou legal até dezembro de 2008, mas faltava gerador e ‘no break’ para garantir o fornecimento de energia elétrica em caso de emergência, de resto estava todo equipado”, recorda Cristiano da Silva Pereira, do Setor de Manejo Ambiental da Semurb, que acompanhou a visita na manhã de ontem e trabalha na área desde 2008. “Acredito que nesses quatro anos que o Memorial esteve fechado dava para ter resolvido esse problema”, acredita. Como o espaço tem capacidade máxima para atender até 200 pessoas por vez, Cristiano contou que era preciso pedir para que o público saísse para dar oportunidades para outros visitantes. “Formava fila ali na rampa, despertava muito interesse, não só pelo acervo como pela paisagem”.

O servidor da Semurb alertou para um problema que deve ser considerado: a luz ‘top’, aquela luzinha vermelha que fica em cima de prédios como sinalizador de aviação, está queimada desde 2009 e não há acesso interno para manutenção.

- Publicidade -
Últimas Notícias
- Publicidade -
Notícias Relacionadas