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O lado inédito de uma história conhecida

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Helen Mirren - Perfeição

Valério de Andrade – Crítico de VIVER

Cotação: * * * * *

Até o final dos anos 50 seria uma temeridade afirmar que um filme, lançado em março, já estaria incluído entre os dez melhores do ano – salvo, é claro, se fosse uma obra-prima. Atualmente, não. E, por isso mesmo, podemos afirmar  que “A Rainha” já assegurou o seu lugar na lista dos melhores do ano.

Tratava-se de um projeto tão difícil quanto ousado – e, ainda por cima, havia o risco da proibição ou de uma milionária indenização judiciária. Afinal, trata-se de um tiro de canhão no coração da Família Real Inglesa, e, de maneira indireta, Tony Blair também não é o herói que emerge na imprensa como o reverso da medalha de Elizabeth II. Outro complicador é que, salvo a protagonista (Diana) da história, os demais personagens, com uma única exceção (a Rainha Mãe), estão vivos.

Além das implicações da vida real, “A Rainha”, sob a ótica da construção cinematográfica, enfrentava enormes dificuldades, a começar pelo óbvio: o público do filme já conhecia a vida de Diana e seus conflitos familiares e suas crises conjugais. Por outro lado, o assunto, em princípio, parecia mais adequado a um documentário da BBC do que a um filme recriado em om ficcional – e que exige a troca do comodismo da poltrona pela ida ao cinema e compra de um ingresso.

Apesar de tantos obstáculos, o filme deu certo. Palmas, portanto, para o diretor inglês Stephen Frears, que depois de “A Rainha” passou a ser  súdito mais odiado da côrte britânica. E, diante das câmeras, aplausos para Helen Mirren, pela perfeição da clonagem física e a interpretação (coroada com o oscar) como a Rainha Elizabeth II.

A idéia que prevalece no imaginário popular, mitificada pela mídia de que os poderosos são diferentes de gente como a gente, é ilusória. A grande diferença é que o conflito pessoal nas mãos dos poderosos é mais nefasto do que os ocorridos numa família de anônimos. O choque entre

Diana e a família de Charles, entre nora e sogra, expôs publicamente o que se passava dentro dos palácios do poder. Por sua vez, indo mais longe e mais fundo, “A Rainha” revela o que o telejornalismo não mostrava.

Com a trágica e inesperada morte, a rebeldia de Diana seria canonizada pela imprensa. Na oração fúnebre, o irmão dela responsabilizou a imprensa pela sua morte. À margem e acima das fofocas, até dos truques da mídia sensacionalista, o fato objetivo é que Diana virou mito mundial por causa da imprensa. Mito e vítima.

O filme deixa intocados os aspectos sombrios da personalidade de Diana, que, por sua vez, emoldurada pela beleza e o charme, sabia cativar a imprensa e ficar permanentemente sob os refletores. Elizabeth II, além de desprovida dos atributos de Diana, e também por temperamento, formação, injunções do poder, era o reverso do medalhão da ex-princesa. Acrescente-se, no plano estreitamente pessoal, uma insuperável antipatia, que por trás da frieza e secular tradição britânica, gerava atos mesquinhos e gestos de crueldade.

E não era apenas Elizabeth que desprezava e odiava Diana – e o filme mostra isso e muito mais, entretanto, como a última palavra é da rainha, ela foi a Bette Davis de uma história que parecia ser um conto de fadas, mas, quando a verdade veio à tona, soube-se que se tratava de uma guerra conjugal e familiar.

O grande mérito do diretor Stephen Frears, além da competência cinematográfica, é haver descoberto um ângulo diferenciado de uma história conhecida, cuja narração prende a atenção da primeira a última cena.

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