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O livro e seu entorno

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Ivan Maciel de Andrade                                                                                                           
Procurador de Justiça e professor da UFRN (inativo)                                  

O livro é muito valorizado na maior parte do mundo. A prova disso é que as melhores livrarias e editoras estrangeiras continuam firmes e fortes. Com sucessivas, gigantescas edições de best-sellers.

Então, o problema verdadeiramente grave nessa área é nosso, tem as inconfundíveis marcas, distorções e carências da realidade brasileira. É lamentável, mas a situação é essa. Reconhecida por estudiosos ou por simples observadores. E não se pode levar muito tempo para detectar as causas dessa preocupante e frustrante situação. Como estão os diversos níveis do ensino (do fundamental ao universitário) atualmente no Brasil? Quais os padrões médios de bem-estar da população brasileira?

O que quero dizer com isso? Que o nosso sistema educacional não tem como objetivo prioritário despertar no estudante o interesse e o gosto pela leitura. Não há uma estratégia de promoção e valorização do livro, tenha conteúdo técnico ou literário. Para consultas e para longos e agradáveis mergulhos no mundo da ficção, da poesia, das biografias, das narrativas de viagens, da autoajuda (por que não?). Nem mesmo no curso universitário, em que a leitura se restringe muitas vezes às mal-afamadas apostilas de aula (quase sempre, nem sequer revisadas pelo professor). Poderia ser pior?

Tudo começa com o fato de que o professor, de modo geral, não possui o hábito da leitura. Inclusive os professores universitários? Inclusive esses, sim, embora em menores proporções (como é natural) do que os docentes do ensino básico e do médio. Se o professor não lê com habitualidade, por falta de condicionamentos durante a fase de aprendizado (os efeitos de um círculo vicioso) ou por falta de condições financeiras para adquirir livros, como pode transmitir aos alunos o prazer/desejo de ler?

Outra coisa: com as dificuldades financeiras, reveladas pela inadimplência, falta de plano de saúde, redução ou privação dos meios básicos de subsistência, em que se acha atolada grande parte das famílias brasileiras, como reservar, dos minguados ganhos, o necessário à compra periódica de livros? Nessas circunstâncias, o livro torna-se, é claro, um luxo inadmissível e inexigível. Só uma vocação intelectual poderosa, com obsessão por estudos e leituras, pode transpor tantos obstáculos.

Então, não há surpresa no vexatório, deprimente, amargo fechamento de livrarias. Ninguém, por mais desinformado, tem o direito de se espantar ou se escandalizar com a insolvência (recuperação judicial) da Cultura e da Saraiva, as duas maiores redes de livrarias do país. Algumas livrarias da rede Cultura de São Paulo chegam ainda hoje a rivalizar, em beleza e estoque de livros, com as melhores de Buenos Aires (com a exceção de “El Ateneo”, uma das mais bonitas do mundo, “hors-concours”).

Parece até que estamos involuindo em matéria de democratização da cultura. Tem-se a impressão de que cada vez mais se elitizam, entre nós, o acesso ao conhecimento e o domínio sobre ele, em benefício dos privilegiados detentores de afortunadas condições econômicas e financeiras. É certo que, de vez em quando, o talento rompe caminho e desponta. Mas as oportunidades se abrem sobretudo para os turbinados pelo status social. Meritocracia, no caso, é conversa para boi dormir.

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