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“O RN precisa de vantagem competitiva”

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Sara Vasconcelos – repórter

Recente e promissor, o setor eólico, que detém grandes investimentos no país, engatinha para dar passos maiores. Passado o período de inserção da fonte no mercado brasileiro, a discussão se volta para mecanismos que garantam a manutenção a longo prazo. “É hora de colocar essas plantas de pé e, ainda, de atrair investimentos para novas plantas nessa lógica de 2 gigawatts ao ano”, lembra Elbia Melo, presidente executiva da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica). A executiva esteve em Natal, na última terça-feira, dia 22, para participar do 3º Fórum Nacional Eólico – Carta dos Ventos e defendeu a criação de novos produtos, como certificado e portfólio de energias para participação em leilões e a inserção no mercado livre, além da necessidade de mudanças para padronização do licenciamento ambiental. Elbia chamou atenção para o formato atual dos leilões que, “embora eficiente, precisa considerar mais que o preço para a tomada de decisões políticas”. O potencial de energia dos ventos do Rio Grande do Norte depende, segundo a presidente executiva da ABEEólica, da capacidade dos governantes para criar vantagem competitiva. Confira a entrevista:
Elbia Melo - presidente executiva da ABEEólica
Passada essa fase de inserção da energia eólica no Brasil, o que é necessário para consolidar o setor?

A consolidação e a sustentabilidade da indústria de energia eólica é a principal discussão. No primeiro momento, queríamos inserir e demostrar que é uma fonte limpa, viável, quais são os  benefícios que o setor poderia trazer para o país.  Agora, inserimos a fonte e como vamos sustentar ao logo do tempo? Temos alguns desafios. Para inserção vencemos os desafios regulatórios. Agora são desafios práticos. Em 2009 vendemos 2 gigawatts, em 2010 outros 2 gigawatts, agora temos cerca de 6 gigawatts vendidos. É hora de colocar essas plantas de pé e, ainda, de atrair investimentos para novas plantas nessa lógica de de 2 gigawatts ao ano.

O que é preciso a partir de agora?

Olhando para 2012 e mais para frente é conseguir mapear os problemas que estamos enfrentado, que são problemas de implementação. É hora de colocar o parque de pé. E alguns pontos foram levantados em relação a infraestrutura, a logística, em relação a instalação das linhas de transmissão, o próprio licenciamento ambiental, que passa por uma carência de homogenização ou padronização das licenças. Hoje cada estado tem uma forma de licenciar e precisa ser padronizado. Além da questão do financiamento, temos hoje praticamente um único banco que faz nosso financiamento, o BNDES. Percebemos o interesse de outros investidores, de capital estrangeiro, precisamos vislumbrar outros possibilidades de atrair o mercado financeiro para o setor eólico. Este é  um desafio do setor elétrico e também do segmento eólico. Então, olhando para esses quatro itens levantados, para o próximo ano, a perspectiva é de necessidade em ser proativo nos problemas que podem atrapalhar ou até inviabilizar essa consolidação e sustentabilidade do setor eólico. Outro desafio é o mercado livre. Hoje estamos vendendo, consolidando no ambiente de contratação regular e estamos buscando caminhos para levar contratos para o ambiente de contratação livre. A especificidade da geração da energia eólica, por ser intermitente, sazonal, produz um risco de geração grande. E o contrato do ambiente regulado resolveu muito bem esse risco. Precisamos agora de uma solução de mercado livre.

O que está sendo feito ou pode ser feito para inserção no mercado livre?

Estamos estudando o portfólio, a possibilidade de  colocar outras fontes renováveis vendendo um contrato, para diluir os riscos. Além de uma investigação do MRE, que é o mecanismo de relocação de risco  criado para a  hidrelétrica. Essa fonte é parecida com a eólica. A diferença entre uma e outra é que a hidrelétrica tem reservatório. Queremos mitigar esse risco por meio de um mecanismo similar para a eólica. Além de vender uma energia eólica para o mercado, queremos  agregar um valor, que é a lógica da sustentabilidade. Então, estamos trabalhando no sentido de  criação de novos produtos, através do certificados de energia verde, para esse mercado também.

E quais são as vantagens de negociar no mercado livre em relação ao mercado regulado?

A vantagem de ser mais um nicho de mercado. Hoje o mercado brasileiro 74% no mercado é em ambiente regulado e 26% é em ambiente livre, com um potencial de crescimento muito grande. O nicho de consumidores especiais, para a venda de 3 a 5 gigawatts, é de um grande potencial para as eólica. No mercado livre podemos buscar estes consumidores e  vislumbrar novos produtos.

Na palestra, a senhora colocou que “o preço é uma variável de momento e o custo é contínuo”. Seria o caso de, após a atração de investidores pelo menor preço fixado pelos leilões, migrar para o sistema de preço fixo?

Esse é um caso a investigar. O que me preocupa quando digo que preço é uma variável no tempo e que não é o custo, é em relação ao tipo de sinalização que está sendo dada no  médio e longo prazo. Porque se coloca no processo leilão, embora o nosso desenho de leilões seja eficiente no ponto de vista do preço, ele não tem a característica chamada multicritério. Ou seja, você não compra só preço, mas tem que comprar preço e qualidade. Ou preço e determinado produto. E quando se coloca um tipo de leilão muito fechado ao preço, incorre no risco de perder outros ganhos, outras eficiências daquele processo. Seria importante fazer alguns ajustes nesse processo de leilão. E quando você coloca  metodologias de preço fixo ou outro modelo isso são tentativas de acoplar essas variáveis.

A forma como  os leilões são praticados hoje não obedece a essa lógica?

As decisões de política não podem ser tomadas com base no preço de um leilão, mas, sim, em custos. Custos de políticas, de bens, de infraestrututras que exijam altos  investimentos, em longo prazo de maturação. Todas devem ser tomadas considerando o custo. No setor elétrico falamos muito em custo marginal da expansão da energia, que não é o preço do leilão. São valores que se diferem e que precisam ser aproximados. Um dos fatores que contribuem para esta diferença é não conseguir calcular na matriz, naquele momento, as eficiências econômicas em torno daquele investimento. E isso pode acabar colocando projetos até menos eficientes, só porque está vislumbrando apenas o preço daquele momento.

Significa dizer que há o risco desses projetos contratados no leilão não serem viabilizados, a longo prazo, por estarem baseados no preço?

Todo e qualquer projeto corre risco. Quando se vê projetos de infraestrutura de longo prazo de maturação, mais risco ainda. Para projetos de energia, nós temos uma razoável taxa, eu não diria de mortalidade, mas de transferência muito grande de projetos.

De quanto essa taxa?

Para o setor eólico nós não temos estudos, estes números. Mas para o setor energético como todos, essa taxa de transferência, a partir do modelo adotado de 2004 para cá, de 10 a 15%, não de mortalidade mas de transferência, sair de um proprietário para outro, sofrendo mudanças nos projetos. Isso é natural. Agora, quando há uma situação em que os preços ficam muito pressionados a tendência é que essa taxa aumente. Essa é nossa preocupação.

Quais as expectativas para o leilão A-5, previsto para 20 de dezembro?
 
São muito boas, dado os fatores conjunturais do mercado permanecerem até lá, com as vantagens trazidas pela crise financeira, exceto pela variação do câmbio que sofreu variação. Sem falar que as outras fontes não participarão da concorrência, por não estarem em condições de entrar, como é o caso do gás natural, que está com dificuldades de concorrer, as hidrelétricas com problemas de licença. Enfim, estamos com 7,4 gigawatts de potência inscritos e temos uma perspectivas de boas vendas, porque não teremos muitos competidores.

Então a crise financeira acaba beneficiando o setor?

A crise financeira no mundo é pano de fundo conjuntural para o favorecimento da competitividade  eólica no país. Pelo fato do mundo estar passando por uma crise financeira, esse é um ponto que a gente sempre levanta, os Estados Unidos e Europa reduziram os investimentos, reduziram do papel do Estado. A Espanha anunciou que a partir de 2015, os pacotes que havia contratado para a eólica terá redução de 40%. Assinou um contrato com determinado preço e a partir de 2015 esse preço sofrerá baixa. Para os investidores isso é péssimo. É hora que esses investidores se voltam para outros lugares. E a China, a Índia, e o Brasil que estão fazendo investimentos em eólica. A China não compra de fora, ela só vende, inclusive, com interesse de investimentos no mercado brasileiro. O Brasil termina sendo o locus de atratividade de investimentos. Com isso, a tendencia é aumentar a concorrência, isso explica a agressividade dos preços.

Então, se estabilizando o mercado financeiro lá fora, há o risco da saída de investimentos do Brasil?

Sim. É por isso que chamamos de uma conjuntura a qual não temos controle e não podemos predizer. Há uma possibilidade. Se os demais países resolvem tomar os investimentos em eólica, teremos mais competidores, mais gente querendo comprar equipamentos. Aí pode haver dissipação dessa industria vendendo para esses países. Não temos  capacidade de prever o que pode acontecer, o mercado é muito imprevisível.

A senhora falou que a China tem interesse de investir no país. Há projetos para o Rio Grande do Norte?

Também. Estivemos há um mês na China, com comitiva da ABEEolica e da EPE. Participamos da China Wind Power, que é a maior feira de venda de equipamentos para o setor energético do mundo e de conferencia de energia eólica E depois visitamos três grandes investidores, as três maiores indústrias fabricantes de aerogeradores da China, Sinovel Wind Group – a segunda maior do mundo – a China Guodian United Power Technology Company e Goldwind Science & Technology, justamente para investigar quais as intenções em relação ao Brasil. E vimos que tem interesse e de gente séria e já estão com prospecção nos estados da região nordeste e sudeste. Ainda não há definido quais os estados. Isso dependerá da capacidade de cada Estado, da política de atração empregada.

Como está o Rio Grande do Norte em relação à política de atração e incentivo para a indústria eólica?

Uma questão bem específica do Rio grande do Norte é a logística de transporte. A de transmissão (linhões) é uma questão de âmbito federal. O licenciamento ambiental é um fator importante. É preciso que os estados busquem essa harmonização da legislação. Isso já está sendo discutido em uma comissão do MMA (Ministério do Meio Ambiente). As vantagens naturais comparativas para a competitividade no Rio Grande do Norte é uma das maiores, mas há necessidade dos governantes e tomadores de decisões criar ambientes de exploração, a chamada vantagem competitiva. Isso cabe aos Estados de enxergar a necessidade de trazer mecanismos de incentivo para essas indústrias. E não é só tirar dinheiro do bolso. Mas de tomada de decisão, como por exemplo, quanto a escolta de equipamentos, que precisa  ser pública, o Estado tem que vigiar. Como temos uma demanda grande de transporte, alguns Estados tomaram a iniciativa de terceirizar esta escolta. Publica uma portaria e está resolvido. Não tirou dinheiro do bolso e deu uma solução. São essas medidas de visão estratégica que precisam ser tomadas.

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