Aldemar Freire – Editor de política
“O VERDADEIRO”. Assim, como substantivo, e impressa toda em maiúscula, a palavra “verdadeiro,” no título de um livro sobre a história do PSD, revela que a mais recente obra do ex-deputado Lauro Bezerra ultrapassa a mera narração de episódios curiosos, que ficaram em um passado distante e esquecido. Não, não se trata de uma narrativa limitada ao saudosismo. Lauro Bezerra relaciona, logo no título, a história de um partido que foi protagonista da política brasileira e potiguar com o atual momento da vida pública do País e do Estado. E relaciona para deixar evidente que o velho PSD de Eurico Gaspar Dutra, Juscelino Kubitschek, João Câmara e Theodorico Bezerra não guarda qualquer semelhança histórica e política — ao menos por enquanto — com o homônimo fundado há pouco mais de um ano pelo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, e que, no Rio Grande do Norte, é presidido pelo vice-governador Robinson Faria.
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Nem tudo do livro diz respeito às diferenças entre o passado e o presente. Na história do PSD, registrada no texto de Lauro Bezerra, fica evidente também que algumas máximas da política têm validade que ultrapassam períodos circunstanciais. Uma delas: o adversário de ontem pode ser o aliado de hoje. Algo que fica claro quando, na então capital do país, o Rio de Janeiro, se articulou o apoio de Theodorico Bezerra, do PSD, à candidatura de Aluízio Alves, na ocasião prestes a abrir uma dissidência na UDN. A história, portanto, não dá motivos para que se fique surpreso com as aproximações e os distanciamentos que acontecem a cada eleição ou mesmo com as alianças e os rompimentos que nem esperam uma disputa sucessória para se configurar.
Ao longo de 242 páginas “O Verdadeiro — A História do PSD Potiguar” vai, assim, narrando episódios, tecendo comentários, fazendo análises sobre o “velho partido”, que era conservador, pragmático, tinha rumo e lideranças. Para quem vivenciou a época, o livro não evoca um saudosismo piegas, mas certamente suscita saudades. Para quem não teve o privilégio de testemunhar a cena política nos anos 40, 50 e 60 é uma oportunidade de acesso a informações históricas e constatar: houve uma época em que tínhamos líderes e — por que não reconhecer? — estadistas.
O livro “O Verdadeiro — A História do PSD Potiguar” — após a introdução do jornalista Cassiano Arruda Câmara e o prefácio do ex-deputado Valério Mesquita — faz, no primeiro capítulo, um breve retrospecto da história dos partidos brasileiros nos séculos XXI a XX. Lembra o bipartidarismo do Brasil Império, polarizado entre conservadores e liberais. Polarização rompida com o surgimento do “Partido Restaurador”, que foi criado para defender a volta de Pedro I. Na República, vieram os partidos regionalizados, que “defendiam os interesses das províncias, depois chamadas de estados”.
No século XX, surgem as legendas com características ideológicas, como o PCB, embora, nas siglas tradicionais, predominasse o coronelismo. No fim dos anos 30 até meados dos anos 40, o Estado Novo de Getúlio Vargas proibiu a atividade partidária. Com a redemocratização, ressurgiu o pluripartidarismo e as legendas foram organizadas nacionalmente. A ditadura militar modificou novamente o quadro partidário e apenas duas siglas tiveram autorização para manter atividade legal e pública: O MDB (Movimento Democrático Brasileiro) e a Arena (Aliança Renovadora Nacional).
Após situar o leitor nesse relato sobre a trajetória dos partidos no país, Lauro Bezerra trata das “origens do PSD”. O Partido Social Democrático foi fundado em julho de 1945, exatamente no período da redemocratização que seguiu ao Estado Novo. “A agremiação marca um novo tempo de redemocratização”, lembra o autor. E destaca: “Reuniu velhos companheiros, interventores federais do getulismo”.
O PSD teve expressivas vitórias ao longo de duas décadas. Elegeu Eurico Gaspar Dutra presidente em 1945, Dez anos depois, voltaria à Presidência com Juscelino Kubitschek. No intervalo entre as duas eleições, houve o curioso episódio da “cristianização”: Em 1950, Getúlio Vargas, do PTB, teve o apoio dos pessedistas, apesar do partido, oficialmente, ter registrado a candidatura de Cristiano Machado. Cristiano não conseguiu, portanto, o apoio dos seus correligionários. Desde então, o termo “cristianização” entrou no vocabulário da política brasileira para designar candidatos que um partido registra, mas ou não tem o apoio e o empenho de seus companheiros de legenda. A primeira “cristianização” não foi algo tão surpreendente se for levado em consideração o fato de que a fundação do PSD teve a articulação do próprio Getúlio Vargas. Em 1960, o Marechal Henrique Teixeira Lott, pessedista, não foi nitidamente cristianizado, mas perdeu o pleito para Jânio Quadros, do PTN (Partido Trabalhista Nacional).
O Partido Social Democrático ainda teve algum protagonismo na cena nacional quando Tancredo Neves exerceu o cargo de primeiro ministro no breve período do parlamentarismo de 1963. Três anos depois, seria extinto pelo ato institucional número 2.
“As origens do PSD eram conservadoras, pragmáticas e realistas. O partido congregava o clientelismo dos antigos interventores getulistas. Foi o ponto de equilíbrio dos interesses das elites rurais e da burguesia industrial. Centrista, foi o fiel da balança de 1945 a 1965”, avalia Lauro Bezerra, para logo em seguida tratar da história do partido no Estado.
No Rio Grande do Norte, o PSD também teve um papel de fiel da balança. A fundação no Estado foi em maio de 1945, em uma reunião que contou com personalidades como João Câmara, Theodorico Bezerra e Clovis Sarinho. Um dos objetivos ficou claro nos primeiros discursos: apoiar a candidatura de Eurico Gaspar Dutra à Presidência.
Na primeira eleição que teve oportunidade de concorrer, a agremiação saiu vitoriosa não só com Eurico Dutra. No Rio Grande do Norte, elegeu, para o Senado, Georgino Avelino, e para a Câmara dos Deputados, Deoclécio Duarte, José Varela, Monselhor Walfredo Gurgel e Vicente Mota Neto.
O PSD conseguiu sucessivas vitórias eleitorais e chegaria ao governo com um nome filiado à legenda em 1951, quando o então governador Dix-Sept Rosado, do PR, faleceu após um trágico acidente de avião. Coube a Sylvio Pedrosa, vice e filiado ao PSD, assumir o governo.
Também foram marcantes para a história da legenda os episódios que antecederam a aliança para o apoio à candidatura de Aluízio Alves ao governo, na década de 60. Houve intensas discussões internas, conversas em Natal, em Santa Cruz e no Rio de Janeiro. O partido estava dividido: nacionalmente, a orientação era para apoiar Aluízio; no Estado, líderes discutiam a candidatura própria. Theodorico chegou a registrar, na Justiça Eleitoral, a candidatura ao Governo, mas renunciou e prevaleceu a decisão de apoiar Aluízio Alves, que abriu uma dissidência na UDN e foi eleito governador pelo PSD. O Partido Social Democrático faria, em 1965, monsenhor Walfredo Gurgel o sucessor de Aluízio Alves, em uma disputa com Dinarte Mariz.
Mas o PSD estava próximo do fim. “A extinção autoritária, com a publicação do Ato Institucional Número 2 (AI 2), veio em 27 de outubro de 1965 como uma reação dos militares à vitória da oposição em vários estados do país. Os partidos políticos foram extintos, em alguns casos, as sedes foram invadidas e desativadas na base da força”, narra Lauro Bezerra. E destaca: “O PSD existiu e resistiu durante exatos 20 anos e cinco meses”.
Homônimos, mas diferentes: Um na história, outro uma incógnita
Quarenta e seis anos depois da extinção do primeiro PSD houve a fundação de um partido homônimo. É a quarta legenda a usar a mesma sigla e o mesmo nome. Desta vez, ao contrário das tentativas anteriores de recriação, nos ano 80 e 90, o partido parece ter mais chance de uma atuação expressiva na politica nacional e em alguns estados: foi fundado pelo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, nasceu com a terceira maior bancada da Câmara dos Deputados e, no Rio Grande do Norte, teve a adesão do vice-governador, Robinson Faria.
No entanto, já no título do novo livro que vai lançar na próxima terça-feira, às 18 horas, na Academia Norterriograndense de Letras, o médico e ex-deputado Lauro Bezerra usa a palavra “O Verdadeiro” e deixa claro que não vê semelhança entre o fundado na primeira metade do século XX e o de hoje.
No primeiro capítulo da publicação, faz uma comparação mais detalhada. Porém, evita uma conclusão definitiva do que representa ou poderá representar o PSD atual. “É cedo para avaliar, após uma análise isenta, os destinos da nova legenda. Estudar o comportamento dos líderes que migraram de outros partidos. As suas razões, os seus objetivos. O tempo, senhor da verdade, mostrará a missão dos novos pessistas”, comentou.
O autor
Médico, Lauro Bezerra, que nasceu em Santa Cruz no dia 24 de julho de 1933, exerceu diversos cargos públicos, entre os quais o de secretário de Saúde, pró-reitor de Pesquisa e Pós-graduação da UFRN, coordenador regional da Funasa e presidente da Associação Médica. Também foi deputado estadual. Sócio do Instituo Histórico e Geográfico do RN e da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores, tem vários títulos publicados, entre os quais “Como se Faz um Reitor”, “Médicos na Política” e “Majó Theodorico – O imperador do Sertão”.
Serviço
Lançamento do livro “O VERDADEIRO – A História do PSD Potiguar”
Dia: 18 de dezembro de 2012
Hora: 17h
Local: Academia Norterriograndense de Letras