“Com seus pássaros, ou a lembrança de seus pássaros, com seus filhos, ou a lembrança de seus filhos, com seu povo ou a lembrança de seu povo, todos emigram”. Como o poema de Alberto da Cunha Melo, ir embora de Natal para tentar a vida em outra cidade já se torna natural na vida dos artistas daqui. Como pássaros muitos vão para São Paulo, Recife, Rio… outros voam mais alto como acontece agora com o artista Zeca Santos. Ele abre suas asas para o mestrado em Teatro Musical da Royal Scottish Academy of Music and Drama, na cidade de Glasgow, na Escócia, uma das Escolas mais procuradas do mundo para profissionalização em musicais.
Para comemorar a partida, Zeca apresenta hoje o musical “Daqui prá lá: Broadway?, às 20h30 na Casa da Ribeira. Advogado por formação e atuação, Zeca teve que enfrentar “meio mundo”, como ele mesmo conta, para conseguir fazer o teste. Além de concorrer com candidatos do mundo inteiro – quando só 24 conseguiram passar – ele teve que lidar com o tempo e os desafios de chegar ao desconhecido. Se preparou por oito meses com a ajuda do diretor Henrique Fontes e estudou cada gesto que faria na frente da banca. “Além do mestrado na Escócia eu tentei na Inglaterra, que são as duas maiores, junto com a dos EUA para a profissionalização”, lembra. Zeca preparou quatro musicas para cantar, além de uma esquete com um texto de Shakespeare, coreografias e também a atuação num texto contemporâneo, o qual escolheu a autora canadense Judith Tompson. Em julho ele arrumou as malas e todo seu conhecimento adquirido em Natal com a professora Nazaré Rocha e foi com a cara e a coragem tentar uma vaga. “Minha paixão pelos musicais existe desde criança quando eu sonhava em participar da Broadway. Fechava os olhos e me imaginava lá. Cresci e fui me profissionalizando como cantor e ator, mas como todo bom natalense precisei fazer vestibular para Direito. Hoje eu vou abraçar meu sonho com toda plenitude, talvez por isso meu teste tenha sido tão forte, porque acreditei muito no que eu estava fazendo ali, eu sabia o que estava fazendo ali e sei”, contou, ao VIVER.
O curso tem duração de um ano e Zeca é o único estudante da América Latina. “Com esse resultado eu consigo enxergar que tive uma base muito sólida aqui em Natal. Pena que aqui a gente não consegue expandir”. Mas nem tudo é fácil. Zeca estará fazendo um investimento alto, pois só o curso custa 45 mil reais. “Vou trabalhar lá para me manter”, disse lembrando que seus futuros companheiros terão apoio do Fundo de Cultura dos seus devidos países. “É uma pena o Brasil não ter esse tipo de apoio”, lamenta.
Saiba mais…
O artista Zeca Santos, formou-se em Direito pela UFRN em 1997, porém desde a época da faculdade que o mesmo despertou interesse pela Música tendo integrado o Coral Madrigal da respectiva Universidade entre os anos de 1994 a 1998 realizando diversas viagens pelo Brasil e Exterior, bem como, participando de diversos festivais de Coros. Em 2004, a convite do Coro Lírico Canto D’ellarte da EMUFRN cantou a ópera Dido e Enéas no TAM como solista e corista. Em 2006 participou da Oficina de Música de Curitiba sendo solista na Ópera Chip and His Dog sob a Direção da aclamada Mezzo-Soprano Denise Sartori. No seu currículo inclui Masterclasses com diversos professores do Brasil e Exterior como Johannes Martinz (ALEMANHA), Edmar Ferrete (MINAS GERAIS), Denise Sartori (CURITIBA), Adriana Kayama (SÃO PAULO) , Marília Alvares(USA). No ano de 2000 cursou o Curso Livre de Teatro em São Paulo com o diretor Hemílio Fontada no Teatro Ruth Escobar, onde realizou diversos cursos também preparatórios para TV.No ano de 2006 ingressou no Curso de Bacharelado de Música da UFRN na classe da Professora Nazaré Rocha, a qual é sua atual Professora e Orientadora Vocal. Criou o Projeto VESPERAIS LÍRICAS com apresentação de várias áreas de ópera numa proposta cênica na EMUFRN em 2006.Em 2007 estreou na Casa da Ribeira o Musical CABARÉ RIBEIRA, como criador e idealizador do espetáculo, ator, cantor e produtor do mesmo.Em julho de 2008 estreou no TAM o Musical STUDIO RIBEIRA.
“A gente não quer ir embora daqui, mas somos obrigados”
Com as malas prontas, o horizonte de Zeca parece se esticar. Dessa maneira ele começa a enxergar melhor a relação dos artistas com o RN. “Somos reflexo da política cultura feita aqui”. Ele não entende como pode haver tanta disparidade cultural numa só cidade. “Vou dar o exemplo dos autos que acontecem nos finais de ano, nos quais eu já participei. Não entendo como se investe 1,5 milhões de reais nesses espetáculos, quando essa verba poderia ser investida num núcleo de artistas para trabalhar o ano inteiro com salários e no final do ano apresentarem um espetáculo como forma de mostrar esse trabalho desenvolvido. Pense comigo, isso não seria muito mais útil culturalmente?”, interroga o artista. Na visão de Zeca é importante que exista uma maneira dos artistas se auto sustentarem. “Para isso é importante que a gente tenha uma visão auto gestora para que a arte sobreviva”, acredita. Um dos objetivos de Zeca -já pensando em seu retorno – é elaborar um projeto que possa dar suporte profissional para os artistas da cidade. “Tem muita gente boa afim de trabalhar, é preciso descobrir esses meios. Estou indo emigrando para voltar e quero voltar a me emocionar em estar nessa cidade”, contou.
