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Obra da transposição divide moradores de Cabrobó

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TRANSPOSIÇÃO - Obra volta a ser o assunto predominante nas conversas entre moradores de Cabrobó

Se a população de Cabrobó ainda se divide entre favoráveis e contrários à transposição, o prefeito do município já assumiu um lado: “Sou amplamente favorável. Ficar contra, achar que o rio pode secar, é um posicionamento de ecologista radical. Tem de haver um desenvolvimento sustentável, mas o homem precisa ser incluído nesse processo”, afirma Eudes Caldas.

No entender do chefe do Executivo municipal, Cabrobó terá a maior parte da obra. Pois além do principal ponto de captação, serão construídas três barragens abrangendo o território do município: Tucutu, Terra Nova e Serra do Livramento. “É lógico que o fluxo de pessoal e dinheiro deve aumentar e, com esse crescimento econômico, conseqüentemente melhora os índices sociais”, prevê.

Após concluída a fase das obras, ele acredita que a cidade passará a ter uma nova dimensão: “Iremos ter uma vida normal, mas dentro de um novo contexto, como foi com a construção da barragem de Sobradinho em Petrolina, que após essa construção passou a ter dimensão de metrópole”, compara. 

No ano passado, lembra, o leito do rio ameaçou invadir a cidade, tamanha a quantidade de água. Esse volume extra que atemorizava, acredita Eudes, pode agora minimizar o sofrimento dos nordestinos. “Esse projeto vai levar água para beber. A utilização para irrigação só ocorrerá se o lago de Sobradinho encher demais, como já ocorreu alguns anos. Se houver esse excesso, aí sim teremos essa finalidade.”

Para ele, a grande degradação do São Francisco ocorre nos estados de Minas Gerais e Bahia, rio acima, onde o assoreamento e a destruição da mata ciliar são comuns. “Temos de dar a mão à palmatória e admitir que essa história de revitalização do rio só veio a ser discutida e implementada graças à transposição, pois ninguém falava nisso antes, ninguém mesmo”, analisa.

No seu entender, na fase em que chegou a obra, não há mais riscos de retrocesso. “Nenhuma força política vai parar, porque agora independe de Congresso, por exemplo. As instâncias políticas de tramitação já foram superadas”, considera Eudes Caldas.

Indenização: obstáculo não resolvido

O dia 26 de junho poder marcar o primeiro impasse no andamento das obras de transposição do rio São Francisco. Isso porque o proprietário da fazenda Tucutu, onde fica o ponto de captação das águas e parte do canal de aproximação, quer receber a indenização pelas terras até esta data. A espera já dura dois anos, desde quando começou a se cogitar a desapropriação.

O valor é superior a R$ 1 milhão e a área de quase 600 hectares. “Há dois anos eu espero e sempre diziam que era para a próxima semana. Até agora nada. Acertamos no mês passado, com o Ministério (de Integração Nacional), que será pago ate o dia 26. Caso esse prazo não seja cumprido, posso até entrar na Justiça pedindo o embargo da obra”, afirma Antônio Simões de Almeida, o Antônio “Russo”.

Apesar da preocupação, ele e os moradores de sua fazenda são amplamente favoráveis ao projeto. “É uma coisa importante. Nasci em Taperoá, na Paraíba, e sei o que meu pai sofreu com a falta d’água. Quem não sabe o que é passar sede é que não sabe o quanto é preciso uma obra dessa”, recorda, lembrando ainda que a revitalização do rio só passou a ser discutida após se abrir os debates a respeito da transposição. “Parece que eles têm 1,3 bilhão para beneficiar o São Francisco. Não fosse a obra, não teria esse dinheiro.”

O agricultor José Honório dos Santos concorda: “A idéia é boa, pois vai levar vantagem a muita gente. Tem tantas pessoas morrendo de sede, enquanto aqui sobra tanta água que é perdida”, afirma. Ele não vê problemas em sair da área, mas diz não saber ainda qual seu destino.

A esposa dele, Maria das Graças do Santos, também é favorável. “Vou para onde me colocarem, o importante é que a muita água que tem aqui vai ser usada. Nasci e me criei nesse lugar e não acho que o rio vá baixar”, aponta. O mesmo diz sua mãe, de 83 anos de idade, Maria Antônia da Conceição. “O São Francisco é grande demais, acho que nunca esse rio vai secar.”

Estudos vêm se arrastando há dois séculos

As informações a respeito dos primeiros estudos que previam a transposição de águas do São Francisco para abastecer o restante do Nordeste são desencontradas. O que é certo, é que essa possibilidade é estudada há quase dois séculos. Ainda no tempo colonial, em 1818, o primeiro ouvidor do município cearense do Crato, José Raimundo de Passos Barbosa, teria tido essa idéia, que foi retomada em 1847 (ou 1848) pelo intendente da Comarca do mesmo município, Marcos Antônio de Macedo.

A primeira intervenção federal é registrada como tendo ocorrido depois de 1850. Porém, em 1839, cientitas do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) já estudavam a região e a possibilidade de transpor as águas do “Velho Chico”. Entre 1852 e 1854, o engenheiro Henrique Halfeld, a mando do imperador Dom Pedro II, que teria tomado conhecimento da proposta vinda do Crato, percorreu a região. Anos depois, o especialista defendeu o projeto, colocando inclusive Cabrobó como ponto de captação das águas.

No governo Itamar Franco, o então ministro da Integração Nacional, o potiguar Aluízio Alves, deu novo impulso ao projeto, nomeando uma comissão  especial. Só agora, porém, os recursos foram liberados e as obras tiveram condições de serem iniciadas.

Entrevista com Rômulo Macedo, coordenador do projeto de transposição do São Francisco

O coordenador do projeto de transposição do rio São Francisco é do Rio Grande do Norte. Há 16 anos, o engenheiro potiguar Rômulo Macedo acompanha a evolução do projeto, pelo Ministério da Integração Nacional, e viu na última semana, em Cabrobó, seu sonho começar a se tornar realidade: 

Ver esse projeto ser iniciado é a realização de um sonho?
Sim. A primeira idéia de transposição ainda é de 1852. Ultimamente, esse projeto foi retomado em 1982. De lá para cá, passou por várias adequações e até a oposição ao projeto contribuiu para que chegássemos ao que considero um projeto ideal. Um projeto que vai tirar uma quantidade tão pouca de água, que podemos considerar que não vai haver impacto nenhum, e vai beneficiar 12 milhões de pessoas.

E como será esse benefício?
Hoje, devido a repetidos anos de seca, quem opera os reservatórios no Nordeste guarda a água até durante uns três anos para não desabastecer a sua região. Se vem uma seca e o reservatório está cheio, a evaporação atua. Se vem uma cheia, o reservatório está cheio, não há lugar para essa água, que passa e se perde para o mar. Atualmente, 60% da água do semi-árido se perde por vertimento e 20% por evaporação, ou seja, os reservatórios são altamente ineficientes. A transposição é a garantia de que não vou usar só 20% do reservatório, vou usar 40%, pelo menos. Porque se a seca vier tenho minha torneira do São Francisco para garantir o abastecimento. E se vier uma cheia, já utilizei 40% do reservatório e abri espaço para receber essa água. Vou aumentar a capacidade de utilização da água que já existe. É um projeto de garantia. É dar mais eficiência a um investimento que já foi feito, que são os reservatórios, dos quais muitos custaram uma grana preta.

Quando o Rio Grande do Norte vai sentir os benefícios dessa obra?
O Rio Grande do Norte é o Eixo Norte. O Leste deve estar pronto até o final deste governo, 2010. O Norte deve ser concluído 60% até lá e estará finalizado em sete, ou oito anos. Essa é a proposta. 

E quanto às críticas de que a transposição corre o risco de se tornar uma nova transamazônica. Isso é possível? 
Se formos pensar assim, não se faz mais obras no Brasil.

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