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Omissão brasileira é julgada na OEA

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RECONQUISTA - Fábio Santos acredita em mudanças

A omissão do governo brasileiro em apurar o assassinato do advogado e defensor dos direitos humanos, Gilson Nogueira – crime ocorrido há dez anos, em Macaíba –  está sendo julgada pela Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos. O julgamento, em São José da Costa Rica, pode resultar na reabertura de uma nova investigação do caso. A expectativa do membro do Conselho de Direitos Humanos, Fábio Santos, é que o julgamento possa mudar os rumos da política de proteção aos defensores de direito humano. Segue a entrevista com o ativista dos direitos humanos.

O que o caso Gilson Nogueira representa para o movimento norte-riograndense de Direitos Humanos?
Fabio Santos: O movimento potiguar e brasileiro de direitos humanos, sejam pessoas, entidades dos movimentos populares e também do poder público, vêem o caso Gilson Nogueira na Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA, como um dos resultados de nossas lutas pela promoção, proteção e reparação dos direitos humanos civis, políticos, econômicos, sociais, culturais e ambientais. Nesse caso específico a nossa defesa intransigente dos direitos fundamentais violados por agentes do Estado. Podemos dizer ainda, numa ótica simbólica, que o alcance deste caso ultrapassa o próprio companheiro Gilson e chega a todos os militantes homens e mulheres do Brasil que lutam no combate à violência  e contra a impunidade. É o primeiro caso de um militante de direitos humanos brasileiro na Corte. Oxalá possa despertar na sociedade e nos operadores da justiça e do direito uma maior inserção do Brasil junto à OEA.

Uma condenação do Brasil, pela Corte Interamerciana de Direitos Humanos, poderia incentivar mudanças das atitudes dos poderes públicos em relação às temáticas inerentes aos direitos fundamentais e, notadamente, a violência institucional?
FS:  É o que esperamos e queremos. Não há em nenhum de nós o prazer sádico da  condenação pela condenação. Ela deve carregar em seu âmago uma lição pedagógica, uma “metanóia” como diriam os cristãos da primeira hora, ou seja, uma mudança de mentalidade e de prática.É verdade que o fim da violência institucional exige um processo, pois implica uma mudança cultural e estruturante na Segurança Pública, o que, aliás, já vem pouco a pouco acontecendo com a implementação do SUSP. Contudo, isso não significa que essa mudança aconteça como “leite em pó e café solúvel”, instantaneamente. Por isso, insisto enfaticamente em três pontos: Primeiro, precisamos conscientizar o nosso povo da importância da OEA e dos seus mecanismos, para que todos possam usá-los na defesa de seus direitos. Igualmente prioritário é o fortalecimento e a autonomia dos órgãos de controle interno e externo da Segurança Pública  como as ouvidorias, corregedorias, entidades da sociedade civil organizada e o Ministério Público com ampla divulgação e pleno acesso da população. Por último, a capacitação permanente teórica e prática e uma assistência psicosocial a operadores de segurança estatal, afim de que sejam respeitados os direitos humanos dos homens policiais e que estes promovam o nosso direito humano à segurança, dever do Estado, direito do cidadão e responsabilidade de todos.

Como você julga a decisão da governadora do RN, Wilma de Faria, de não acatar as deliberações da Comissão Interamericana de Direitos Humanos sobre o caso Gilson Nogueira?
FS:  Infelizmente a governadora desrespeitou o Estado de Direito. Cheguei a ver um ofício onde ela, em resposta aos questionamentos da OEA, diz que deveria observar e respeitar as leis, as instituições judiciárias e ao ordenamento jurídico que moldam o Estado de Direito no Brasil e no Rio Grande do Norte. Ocorre que a não observância das determinações emitidas pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos por si só já representa uma violação do nosso ordenamento jurídico interno, visto que o Brasil aceitou e reconheceu por vontade própria a jurisdição tanto da Comissão quanto da Corte, quando aderiu, em 25 de setembro de 1992, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, promulgada no Brasil pelo Decreto nº. 678 de 06 de novembro de 1992. Ao ratificar a Comissão Americana, o estado brasileiro assumiu obrigações jurídicas no plano internacional quanto à observância dos direitos humanos consagrados em todo território nacional. Dois são os órgãos previstos pela Convenção com competência para se manifestar sobre violações dos direitos humanos ocorridas no território dos países signatários: a Comissão e a Corte, sendo que a última teve sua jurisdição reconhecida pelo Brasil em 10 de dezembro de 1998. Tanto é que por não cumprir as recomendações da Comissão o caso subiu para Corte. Outro ponto da Governadora foi de conceber as recomendações da Comissão, como equivocadas e precipitadas por entender que estaria atropelando a justiça brasileira. Ela está totalmente equivocada uma vez que as recomendações não atropelam a competência dos nossos órgãos judiciais internos, pois independente das decisões judiciais internas que venham a ser proferidas, o Brasil concedeu poderes à Comissão para emitir recomendações em casos de violação aos direitos humanos ou quando entenda estar havendo morosidade ou omissão na apuração ou punição dessas violações. Agora, em relação aos posicionamentos da governadora, o mais exótico foi o da  mesma recusar as recomendações da Comissão, visto que esse poder não lhe foi concedido. O engajamento com a Comissão foi firmado pela República Federativa do Brasil, cabendo às unidades federativas adotar as disposições cabíveis para o cumprimento da convenção da OEA. Hoje acredito que a  governadora  tenha feito uma autocrítica para uma nova práxis. Também se aprende errando.

Repetir o processo dos supostos responsáveis pela morte de Gilson Nogueira e indenizar a família do advogado assassinado seriam passos importantes para o fim da impunidade no Estado. Mas, por si só, seriam suficientes ou haveria outras medidas a exigir do governo?
FS:  Sem sombra de dúvidas, se o Estado Brasileiro for condenado na Corte a realizar uma investigação completa, imparcial e efetiva; reparar moral e materialmente os familiares  e adotar uma política de proteção aos defensores de direito humano, estaremos dando um grande passo. Contudo temos que exigir dos governos Estadual e Federal uma real política pública de segurança cidadã. Para isto temos muitos paradigmas a quebrar. E tenho a absoluta certeza que os chefes do executivo federal e estadual têm condições, como democratas e humanistas que são, de serem também junto com muitos, protagonistas desse processo.

PERGUNTAS

Antonino Condorelli – jornalista do Tecido Social

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