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Para onde vamos?

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A História é fonte da própria História. Mas não se repete. O passado, apesar de tudo, não deixa de influir no presente e no futuro. A humanidade sempre estará à mercê desses desdobramentos, ou, para usar expressão de Millôr Fernandes, a reboque dos seus próprios acertos e desacertos. Entretanto, Vinicius de Moraes, poeta, cronista, compositor, dramaturgo e muitas  outras  notáveis  coisas, que o fizeram um dos brasileiros mais universais de todos os  tempos, adicionou uma reflexão jocosa na letra do “Samba da Benção”: “A vida não é de brincadeira, amigo/ A vida é a arte do encontro/ Embora haja tanto desencontro pela vida”. Infelizmente, esses efeitos e sua transcendência, numa sociedade como a nossa, assemelham-se a fantasmas que assustam, advertem e projetam nova conjuntura. Nem sempre auspiciosa. Muito embora o Brasil de hoje tenha perdido, ou esquecido, pelo menos por algum  tempo, um dos seus atributos mais autênticos e peculiares: a arte de sonhar. Não se pode olvidar que os sonhos nos impulsionaram até passado muito recente. Estamos perdendo, também, a hilaridade com a qual, até então, enfrentamos circunstâncias quase  catastróficas. Porem  seguimos adiante,  quase sempre impulsionados por esperança, otimismo e destemor. 

Em um dos seus últimos livros, “Incidente em Antares”, Érico Veríssimo deu vida a fantasmas de personagens da vida política no Rio Grande do Sul. De Borges de Medeiros a Getúlio Vargas. Exibiu seus ideais, equívocos e objetivos, os quais eram, em certa época, síntese dos políticos brasileiros. A intenção era vaticinar e antecipar acontecimentos que geraram mais um surto de autoritarismo no Brasil, rompendo uma travessia que a nação realizava sob a liderança dos melhores quadros políticos e morais desde a independência. Havia contradições. Inconformados. Incompetentes. Descomprometidos com o interesse público. Que eram minorias. A maioria sonhava e dava tudo de si pelo bem comum. Os “incendiários” também foram incompreendidos. Pois o seu idealismo justificava a lição de George Bernard Shaw, para quem infeliz e sem alma seria a nação que não os possuísse.

A conjuntura política, nacional ou internacional, é insusceptível de previsões a longo prazo. Impõe-se defini-la: é o conjunto de problemas que, em dado momento histórico, exige do poder político uma resposta. A atual conjuntura brasileira revela características deploráveis e enigmáticas quanto ao seu futuro. Sem dúvida alguma, essas condições podem gerar efeitos dramáticos e penosos para toda a sociedade. Convém refletir:

1. Em 1954, no transcorrer da crise que culminou com o suicídio de Getúlio Vargas, o então Vice-Presidente e Presidente do Senado, nosso conterrâneo Café Filho, proferiu impactante discurso, que se iniciava com uma advertência: “Lembrai-vos de 37”. Referia-se ao golpe de implantação da ditadura getulista: o Estado Novo.  A mensagem foi profética.  Deplorava, naquele instante, a omissão do Congresso Nacional e a indiferença do Poder Judiciário. A crise se alojara nos quartéis, nos sindicatos, na imprensa, em setores produtivos e em quase todos os segmentos. Enquanto o Poder Legislativo se dividia, estúpida e fisiologicamente, em ser contra ou a favor do governo. Apaixonadamente. Radicalmente. Havia uma crise e o Parlamento não buscava solução lúcida, pacífica e capaz de preservar as instituições. As previsões de Café Filho se confirmaram dez anos depois (1964). E, das instituições atingidas pelo arbítrio, o Legislativo foi a mais castigada, aviltada e emasculada.

2. As emendas constitucionais em exame e votação no Congresso, nos últimos anos, revelam um erro original e perturbador para a estabilidade institucional. O Governo as concebeu em parceria com o “fechado” clube de ministros, assessores e lideranças partidárias.  As possíveis alterações a lhes serem feitas, no âmbito do Poder Legislativo, dependem da “concordância” de quóruns ocasionais. Estamos numa república federativa, presidencialista e bicameral. A população se representa na Câmara Federal, e os Estados estão representados no Senado. Independentemente do resultados das próximas eleições, há um  conflito latente entre o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. De repercussões incontroláveis.

3. Tive o privilégio de conviver, em momentos distintos, na década de 70, com os inesquecíveis Afonso Arinos e Franco Montoro. Que sempre pugnaram por uma reforma política que imprimisse, independentemente da personalidade dos atores da cena política, efetiva e irreversível estabilidade. Essa reforma abrangeria modificações no sistema partidário, adoção de um sistema distrital misto (deputados eleitos diretamente em circunscrições eleitorais e outros eleitos numa lista proposta por partidos), revisão do número de deputados federais, que atualmente são 513, e assim por diante. No início da atual legislatura, que se encerra em 31 de janeiro de 2019, prenunciava-se como prioridade a reforma política, incluindo os sistemas partidário e eleitoral. Nada disso aconteceu.

4. As nossas instituições civis são milenares.Vieram de Roma. E nos chegaram por força da genialidade de Napoleão Bonaparte com o seu Código Civil. Que, entre tantos institutos, garante a família, a propriedade rural produtiva e a propriedade urbana. Preservadas superiormente pela Constituição. Os fatos recentes, gerando mobilizações radicais, fomentam instabilidade social. O novo governo precisará do apoio da sociedade e das instituições, fazendo prevalecer o Direito, a Paz e a Justiça. E exercitar, em tempo hábil, sua autoridade. Não se pode sujeitar a aplicação da lei ao grito nem ao arbítrio de quem a rejeita.

Raymond Aron, um dos maiores pensadores do século XX, dizia que as crises institucionais nascem pela conjugação de fissuras na legitimidade, na legalidade e  na eficácia governamental, pelo centralismo burocrático e pela intolerância que desagrega a sociedade. A hora é de união e paz. Para construção da sociedade dos nossos sonhos.

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