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Patrimônios da Humanidade

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Aya Bach – DWelle

Tudo começou no Egito. Quando a Represa de Assuã foi construída nos anos 1960, os templos de Abu Simbel estavam sob ameaça de ficar debaixo d’água. Três mil anos depois de sua fundação, eles deveriam dar lugar ao progresso. Uma onda de protesto espalhou-se pelo mundo. Em uma ação de solidariedade espetacular, 80 milhões de dólares foram arrecadados para desmontar os templos, escavados na rocha, e reconstruí-los em um terreno mais alto. Sem o drama envolvendo Abu Simbel, a Convenção sobre a Proteção do Patrimônio Cultural e Natural não teria nascido em 1972. “Sua ideia básica está contida nessa ação de resgate sem precedentes”, diz Dieter Offenhäußer, secretário-geral adjunto da Comissão Alemã da Unesco. “Há lugares preciosos, cujo valor extrapola a responsabilidade do Estado em cujo território eles por acaso se encontram”.

A partir de tal constatação, logo emergiu a lista de Patrimônios da Humanidade da Unesco. Em 1978, foram identificados os primeiros 12 locais, entre eles a catedral de Aachen, na Alemanha, as igrejas escavadas na rocha de Lalibela, na Etiópia, e o centro histórico de Cracóvia, na Polônia. Sítios naturais, como as Ilhas Galápagos e o Parque Nacional de Yellowstone, nos Estados Unidos, também faziam parte do grupo considerado “patrimônio mundial da humanidade a ser preservado”.

O preâmbulo da convenção foi formulado de maneira aparentemente idealista, mas por trás dele escondia-se uma robusta política cultural internacional. Propunha-se que todos os Estados renunciassem a uma parcela de soberania nacional, tão logo uma localidade entrasse na lista. “Isso mostra que superamos egoísmos nacionais e narcisismos”, afirma Offenhäußer.

Alguns egoísmos são mais de caráter econômico e nem sempre se deixam superar. Foi o caso do Vale do Elba, nas imediações de Dresden – Patrimônio da Humanidade desde 2004. Ali deveria ser construída uma ponte, caracterizando uma forte intervenção na paisagem. Iniciou-se um debate, cidadãos protestaram, mas o projeto da ponte se manteve. Em 2009, a Unesco retirou o título da região e a imagem da Alemanha ficou comprometida.

Algo semelhante havia ocorrido apenas uma vez: dois anos antes, a Unesco havia cassado a condição de Patrimônio da Humanidade da Santuário do Órix Árabe, em Omã, depois que o Estado reduziu drasticamente a área protegida.

Em todos os outros casos, a Unesco contenta-se até agora com uma lista dos locais ameaçados. O exemplo mais conhecido é o das estátuas de budas, explodidas pelos talibãs na província de Bamiyan, no Afeganistão. Em 2003, a Unesco colocou-as na lista de locais em perigo e deu início a um processo de restauração com especialistas internacionais, para pelo menos preservar os fragmentos das figuras.

Já a recuperação da catedral de Colônia, na Alemanha, foi muito mais simples. O principal santuário da região do Reno entrou para a lista dos locais em perigo em 2004. O perigo, nesse caso, eram arranha-céus planejados para as imediações.

O debate em torno de arranha-céus, pontes e catedrais levanta algumas questões fundamentais: Como deve ser o planejamento urbano e econômico? Quão intensa deve ser a proteção de locais históricos? “Os Patrimônios da Humanidade não devem ser transformados em museus, não deve ser colocada uma redoma sobre eles”, considera Offenhäußer. Porém, o status de Patrimônio poderia ser um “corretivo construtivo” para interesses econômicos e políticos de curto prazo.

Nesse meio tempo, 188 Estados já assinaram a Convenção. A lista de Patrimônios da Humanidade inclui agora 936 lugares. A cada ano, novos entram para o grupo. Se continuar no mesmo ritmo, dentro de mais 40 anos, serão quase dois mil locais. E quanto maior o número deles, menor a singularidade de cada um.

A Unesco reconhece o problema, mas não tem planos de fechar a lista. Primeiro, quer-se acabar com o eurocentrismo. O desequilíbrio é claro: se um país relativamente pequeno como a Itália tem 47 localidades na lista e a Índia apenas 28, deve haver algo de errado.

Política e cultura

Especialmente países pobres e com pouca estrutura têm, muitas vezes, poucos recursos para apresentar seus candidatos de maneira tão perfeita a convencer o comitê. Ou seja, a lista de Patrimônios da Humanidade continua refletindo relações de poder econômicas e políticas. Há sugestões de criação de um fundo de apoio a países mais fracos na indicação. “Esta proposta aproxima-se da ideia original da Convenção sobre a Proteção do Patrimônio Cultural e Natural, que continuamos a promover”, diz Offenhäußer.

Os países não recebem dinheiro para seus Patrimônios. Pelo contrário: eles comprometem-se a preservar os locais e devem apresentar planos detalhados de gestão. Há exceções para os países mais pobres. Eles recebem apoio “como parte integrante da família de nações que formam a Unesco”.

Porém, a recente admissão da Palestina na Organização das Nações Unidas para a Cultura mostrou como conflitos políticos ameaçam a paz da família. Os Estados Unidos suspenderam seus pagamentos em protesto – um retrocesso para a Unesco, cujas funções vão muito além do gerenciamento da lista de Patrimônios. A questão sobre a possibilidade de a Basílica da Natividade, em Belém, na Palestina, poder se tornar um dos Patrimônios é polêmica.

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