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Pesca artesanal

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Antonio-Alberto Cortez
Professor da UFRN e Subsecretário de Pesca e Aquicultura da SAPE/RN
                                                                                                                                       
Um ensaio sobre a “Situação da Pesca Artesanal do Brasil”, Dr. Ubirajara Timm afirma: “o desenvolvimento de uma realidade sócio-econômica está sujeito a permanente conflito de forças divergentes cuja resultante, se positiva assegurará o desenvolvimento dessa realidade”. No texto, a realidade a qual o autor se reporta é vivenciada pela atividade pesqueira artesanal brasileira. Ninguém melhor que o Dr. Timm para falar da pesca brasileira. Com larga experiência foi, por suas vezes, titular da Superintendência do Desenvolvimento da Pesca –SUDEPE, órgão criado em 11 de outubro de 1962, pelo então Presidente João B. M. Goulart, tendo como princípio basilar fazer cumprir o Código de Pesca e a legislação das atividades próprias aos recursos pesqueiros.

Estudos mais recentes enfatizam que as forças contrárias, ou restritivas ao desempenho ideal do segmento produtor de pescados, em sua vertente artesanal no Brasil como um todo, mas especialmente no RN superam as forças propulsoras, ou seja, as restrições continuam por demais “dinâmicas” enquanto os elementos propulsores estão cada vez mais emperrados.

 O universo das forças restritivas, segundo Timm abrange aspectos de natureza institucional, econômica e social. Acrescente-se mais uma cujo grau de letalidade é cruel: a seca. Estima-se que o conjunto de pescadores artesanais do RN esteja em torno de 35 mil profissionais, dos quais, pelo menos, 15 sejam atuantes na pesca continental, isto é, sobrevivem do que capturam nas lagoas e açudes do território potiguar. No entanto, sabe-se, a maioria das coleções de água do Estado está vazia e/ou em volume morto, portanto sem peixes. O fenômeno natural da estiagem passou a ser mais um decisivo fator de restrição à atividade pesqueira. E, contra este, não há decreto ou portaria capaz de, no curto prazo, eliminá-lo – é a força da natureza.

Apesar da representatividade numérica a pesca artesanal sofre diante da inconsistência, dos equívocos e da fragmentação das políticas que lhes são direcionadas, comprometendo, pois, quaisquer eficácias esperadas. A força dos pescadores artesanais representada pelo tripé Colônia>Federação>Confederação, por maiores que sejam os esforços dispendidos, pouco consegue diante do avassalador e pouco aparente descaso da União e da exorbitância dos instrumentos ditos “legais” que impedem o exercício pleno da atividade. Exemplo que chega às raias do absurdo são as amarras criadas para dificultar a pesca da lagosta que, sem exageros, jogou, literalmente, esta atividade na sombra da clandestinidade. Busquem, da foz do Guajú, limite com a Paraíba, à Tibau (do Norte), limite com o Ceará, alguém que faça uso do covo (único permitido pelo MME) como instrumento de captura de lagosta. Outras alternativas existem, mas sequer entram na pauta de discussão desde que foram totalmente alijadas do processo de captura. É reconhecido os riscos de certa prática, mas não se justifica a pura e simples proibição quando existe alternativas técnicas que, se aplicadas, mudaria radicalmente os efeitos nocivos da pesca da lagosta. Um fator que impulsiona, por exemplo, é o uso de atratores artificiais. Entretanto, estes também, são desestimulados mediante proibição de uso. Como não há diálogo sobre o tema, tambores, armários, geladeiras e outros lixos mais são jogados ao mar e servem de “Marambaia” e, dizem, quem dispõe deste equipamento tem lagosta o ano inteiro.

 Os fatores de ordem organizacional e legal embora agregados à representatividade econômica, social e política, pouco significam diante do círculo vicioso estabelecido há décadas e que constitui um entrave a qualquer proposta de desenvolvimento da pesca artesanal.

A rigor, sem a consolidação institucional e norteadora de políticas macrossetoriais direcionadas aos diversos eixos presentes no segmento da pesca artesanal, fica cada vez mais evidente que este conjunto produtivo “sempre se apresentará fragilizado quando comparado aos demais setores econômicos e, consequentemente, reduzido e sem forças para influir nas decisões governamentais”. Segundo Fichte (1762-1814), “o efeito recíproco do reconhecimento não ocorre como deveria”, isto é, as entidades dos pescadores não existem, são um zero à esquerda.

“Ao não participarem do processo decisório nacional, os pescadores artesanais ficam à margem. Aliás, eles são duplamente marginalizados: marginais geográficos, por exercerem suas atividades às margens dos oceanos, dos mares, dos rios; e marginalizados sociais por não receberem tratamento equânime na partilha dos benefícios inerentes à cidadania” (Timm 1998). Essa exclusão desqualifica os pescadores, os marisqueiros, catadores de caranguejos e de algas, homens e mulheres humildes e hoje empobrecidos, preocupados por não poderem oferecer às suas famílias a substância de suas vidas de trabalho como exemplo a ser seguido. Por ser a pesca artesanal uma fonte supridora de alimentos e proteínas nobres, além de importante absorvedora de mão-de-obra, merece melhor compreendida, considerada e respeitada, enfim.

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