São Paulo – Polícia Federal (PF) apreendeu ontem 40 quilos de documentos, discos rígidos de computadores, um notebook e pelo menos cinco veículos como parte da Operação Têmis, que visa a combater suposta venda de sentenças judiciais e lavagem de dinheiro no Estado de São Paulo. Foram cumpridos mais de 80 mandados de busca e apreensão em casas e escritórios de 43 pessoas – entre desembargadores e juízes federais, empresários e advogados -, nas cidades de São Paulo, Rio e Campo Grande (MS).
As investigações não têm relação direta com a Operação Hurricane, embora ambas investiguem bingos. O superintendente da PF em São Paulo, Geraldo José de Araújo, batizou o esquema de “bingão da Justiça”.
Além dos mandados de busca, a PF pediu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) a prisão preventiva dos investigados, mas o ministro Félix Fisher negou. Entre os citados no inquérito estão os desembargadores Alda Basto, Nery Júnior e Roberto Haddad, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), além dos juízes federais Maria Cristina Barongono Cukierkorn, da 23ª, e Djalma Moreira Gomes, da 25ª Vara.
Segundo a PF, os acusados formaram uma organização criminosa especializada na compra e na venda de liminares para beneficiar casas de bingo e empresas interessadas em obter créditos tributários. A investigação começou em agosto de 2006, após uma denúncia do Ministério Público Federal (MPF) de que empresários ligados a bingos pagavam mensalidades que variavam de R$ 20 mil a R$ 30 mil para desembargadores, juízes e uma funcionária da Receita Federal, além de lobistas envolvidos no esquema.
A suposta quadrilha contaria ainda com a participação de policiais civis. Pelo menos dez decisões judiciais que beneficiaram bingos estão sob suspeita. Os trabalhos da PF foram interrompidos há cerca de um mês, quando um funcionário da companhia Telefônica requisitado para fazer o grampo autorizado pela Justiça vazou informações sobre as escutas para um policial civil, que avisou alguns dos investigados. Quando a organização criminosa começou a queimar provas, o STJ foi comunicado.
A Telefônica informou que está ajudando nas investigações e houve apreensão ontem de documentos que estavam em cima da mesa de um funcionário. O profissional, que não teve o nome divulgado, está afastado e a empresa abriu sindicância interna.
As apurações indicam que havia um grupo de lobistas que atuava no Judiciário em nome de empresários e casas de bingo. Os policiais dariam proteção para as empresas, além de ajudar na busca por informações para os lobistas. Uma funcionária da Receita ficaria responsável pela facilitação dos créditos tributários. “Acontecia um pagamento mensal, da ordem de R$ 20 mil a R$ 30 mil, que era feito pelos interessados em conseguir decisões favoráveis”, explicou Araújo.
Pedágio
Apesar de o inquérito ser sigiloso, a PF admitiu que donos de bingos chegaram a pagar R$ 150 mil a magistrados por uma liminar que garantiria o funcionamento das casas. A PF agora analisará documentos apreendidos e poderá pedir novamente a prisão dos investigados. “Temos fortes elementos para incriminar essas pessoas”, diz o delegado Luiz Roberto Ungaretti de Godoy, do Grupo de Combate ao Crime Organizado da PF.
Operação utiliza 450 policiais
São Paulo – Embora alguns dos investigados pela Operação Têmis já soubessem com antecedência que estariam na mira dos federais, os 450 policiais encarregados de cumprir os mandados de busca e apreensão só tomaram conhecimento do objetivo da missão quando ela foi deflagrada. Grande parte dos agentes estava na cidade desde terça-feira, quando a PF promoveu a Operação Kaspar, contra uma rede de doleiros que movimentava até US$ 30 milhões por mês no mercado ilegal de câmbio.
O efetivo foi completado com policiais do Rio, Santa Catarina e Paraná, convocados na quinta-feira à tarde para a Têmis. Os federais ficaram concentrados em três bases: no quartel da Polícia do Exército (PE), em Osasco, na Grande São Paulo, em um flat na zona sul da capital paulista e na base aérea de Cumbica, em Guarulhos. Às 3 horas, todos foram acordados e passaram por uma preleção, recebendo o endereço e as instruções de atuação. “Até então, a gente não fazia a menor idéia do que faríamos”, contou um agente carioca.