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…por Natal

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O escritor José Eduardo Agualusa está escrevendo o seu livro “mais difícil” até agora. Mas não parece haver sofrimento nessa declaração e sim dedicação e consciência do que faz há mais de 25 anos: escrever livros. Mantendo o tempo inteiro um jeito sereno, ele fala baixo e olhando nos olhos do interlocutor. Às vezes, o sotaque angolano quase dificulta a compreensão. Mas basta ceder à suave paciência que emana dos seus gestos seguros, que as palavras se assentam em entendimento. Ele está em Natal desde meados de outubro, a convite da organização do Festival Literário de Natal (Flin) para fazer uma residência literária – que resultará no livro posterior – e na mesa redonda que estreia o Flin hoje, a partir das 19h, “Um Romance em Nascimento”, ao lado da escritora, Tatiana Salém Levy, também convidada para o mesmo fim, na qual ambos falarão sobre o processo de criação literária. A mesa redonda contará com a presença do poeta e jornalista Adriano de Sousa. Durante a estadia em Natal, Agualusa não pode conhecer muito da cidade, porque ficou praticamente enclausurado no quarto do hotel, ocupando as horas com o exercício da escrita.
José Eduardo Agualusa se concentra em sua residência literária a contar a história da Rainha Ginga, ícone da resistência escrava em Angola que viveu entre os séculos XVI e XVII
A residência dá o pontapé para o maior desafio literário de sua vida até então: “Estou trabahando no romance mais diferente, mais ambicioso e difícil” que fiz até agora”. Será sobre a Rainha Ginga, (personagem real de Angola, cujo nome é Nzinga Mbandi Ngola que viveu entre os séculos 16 e 17, e tornou-se um ícone de luta e resistência à invasão portuguesa, e que jamais fora capturada. Sua história tem ligação com o Brasil, sobretudo durante a invasão holandesa e se parece em muitos momentos com a do nosso Zumbi dos Palmares). Segundo explicou, as dificuldades em fazer esse romance moram, principalmente, na distância dos séculos em que se passaram a realidade e agora sua ficção. Para isso está, como diz, “estudando” muito, lendo textos da época, dedicando-se a maior parte do tempo ao livro. Embora não seja intenção termina-lo nesses vinte dias, Agualusa disse que fará uma leitura do que está produzindo durante a mesa redonda. Aliás, não é novidade para ele fazer residências literárias, embora admita que chega certo momento que prefere mesmo escrever em sua casa. Já residiu com o intuito unicamente de produzir livros em países como a Holanda, Alemanha e Índia. Livros como Barro Tropical e Um Estranho em Goa, foram resultados desse tipo de trabalho.

O convite para a residência literária em Natal parece dessas coisas que têm a ver com o  destino. Ele tem em mente um outro romance cujo pano de fundo será os sonhos. Pesquisando, descobriu os estudos do neurocientista Sidarta Ribeiro, que é diretor do Instituto do Cérebro da UFRN e o procurou. O encontro pessoal ocorreria aproveitando uma vinda a  Recife (PE) esse ano, mas isso acabou não acontecendo, por conta do cancelamento do voo para Natal. Então, quando parecia que ele adiaria esse encontro com Sidarta, do nada, surge o convite para do Flin, para a residência em Natal.

Sobre seu processo pessoal da escrita, Agualusa parece já saber o que quer e tem muitas certezas. Uma delas é que o romance precisa ser desafiador e que, por princípio, não há necessidade de saber como será o desenrolar das coisas, e deixar que os personagens vivam suas histórias. “Sempre quero experimentar algo  novo. Escrever é descobrir. Você vai descobrindo a história no momento em que escreve. É um processo mágico”. Mas se na consciência do mágico há sobretudo paixão (para começar o livro), o outro elemento que não pode faltar na escrita do autor angolano é disciplina (para terminar o livro). “Tem que ter persistência, tem que lutar. Escrever é uma luta permanente. Escrevo pelo prazer, para mim é uma brincadeira, mas é sobretudo trabalho”.

Quem é

José Eduardo Agualusa nasceu no Huambo, Angola, em 1960. Estudou Silvicultura e Agronomia em Lisboa e aos 27 anos publicou seu primeiro livro (A Conjura) e não parou mais. Suas obras publicadas no Brasil são: Estação das Chuvas; Nação Crioula; Um Estranho em Goa; O Ano em que Zumbi tomou o Rio; O Vendedor de Passado; O filho do vento, dentre muitos outros. Os seus livros estão traduzidos em 25 idiomas. Também escreveu várias peças de teatro: “Geração W”, “Aquela Mulher”, “Chovem amores na Rua do Matador” e “A Caixa Preta”, estas duas últimas juntamente com Mia Couto. Também escreve crônicas para a revista LER.

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