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Porto Príncipe: calor, poeira, trânsito e taptaps

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Fred Carvalho – enviado a Porto Príncipe

A poeira é uma companheira constante. Uma camisa branca, após um breve passeio pelas ruas da cidade, fica completamente suja. O calor também nos acompanha desde cedinho e só dá uma trégua ao anoitecer. Outro grande incômodo é o trânsito. Um trajeto de menos de 20 quilômetros raramente é feio em menos de 50 minutos, uma hora. Assim é a definição de Porto Príncipe, a capital do Haiti, que ainda tenta se recuperar do terremoto que devastou grande parte da cidade em 12 de janeiro do ano passado.

Proprietários usam Taptap para homenagear craques do futebolO grande contraste nesses caos relatado acima é o colorido do  meio de transporte mais popular: os taptaps. São caminhonetes comuns adaptadas para levar as pessoas entre os pontos da cidade. Vivem lotadas, não importando o horário. Cada viagem custa menos de 80 centavos de real.

#maisinformacoes#Cada taptap tem uma pintura própria. Alguns proprietários desenham rostos de craques do futebol mundial, como o argentino Lionel Messi e o brasileiro Kaká. Outros reproduzem imagens de artistas. Mas a maioria apenas colore cada pedaço da carroceria de uma cor diferente.

Outro destaque das ruas de Porto Príncipe é o comércio informal, que “emprega” grande parte da população local. É possível se encontrar de tudo, desde artesanato a comidas regionais, passando por gasolina e dlo (água em crioulo, a língua nativa). A dlo é vendida em sacos plásticos e não são tão recomendadas para o consumo humano.

O povo haitiano, em geral, é bem receptivo. A maioria se deixa fotografar e aceita quando se tenta estabelecer uma conversa. Outros são mais “fechados”. Alguns militares dizem que isso se deve à crença religiosa de boa parte da população, o vodu. Nessa religião, falam, as pessoas não podem ser fotografadas.

Outros militares acreditam que uma minoria do povo de Porto Príncipe não quer ser fotografada por um sentimento normal e perfeitamente aceitável: a vergonha. Não é qualquer um que se deixaria ser retratado ao lado de lixo, esgoto a céu aberto e em uma condição miserável, onde faltam escolas, hospitais e emprego.

Mesmo com toda a ajuda humanitária, econômica e militar que o Haiti tem recebido da ONU desde 2004, principalmente através da Minustah, é certo afirmar que tão cedo população local não terá um dos maiores bens que qualquer ser humano almeja: dignidade para viver.

Professoras montam escola para órfãos do terremoto

A pauta era acompanhar a construção de uma estrada pela Companhia de Engenharia de Força de Paz no Haiti (BRAENGCOY). Essa estrada liga uma das principais vias de Porto Príncipe a um local em um bairro periférico onde, futuramente, será erguido um posto de saúde. O material por si só já valeria a pena, pois iríamos mostrar como nossos militares auxiliam o povo haitiano na reconstrução do país. Menos de 20 minutos depois de chegarmos ao local pré-determinado, estávamos praticamente rodeados de crianças. Perguntei a um oficial: “Ainda falta tanta escola assim para essas crianças?”. O militar respondeu: “Para essas aqui, nessa região da cidade, não. Aqui nesse bairro só não estuda quem não quer”.

Uma coisa chamou atenção: parte das crianças enchia um carrinho de mão com pedras grandes e as levavam para uma casa Cinquenta e cinco crianças órfãs frequentam a escoladistante. O oficial me disse que, por dia, cada criança daquelas ganha, no máximo, o equivalente a R$ 2,00.

Em seguida um morador convidou a comitiva para conhecer uma escola a menos de 200 metros do local onde estávamos. Os próprios militares nos acompanharam ao local. Os muros são altos. Na entrada, um barracão improvisado serve como quatro salas de aula. Há bancos coletivos e os quadros negros estão bem desgastados. Mesmo assim, havia lições de matemática e francês. As crianças vestem o que têm. Alguns usam apenas camisetas.

Tivemos a entrada autorizada pelas duas professoras. Há obras no fundo do terreno. Uma organização internacional financia a construção de novas salas de aula. A surpresa veio quando as professoras disseram quem são essas crianças. Os 55 alunos da escola são órfãos de vítimas do terremoto. Estavam desconfiadas com a nossa presença. Logo um colega fotógrafo chileno que mora na Argentina teve a brilhante ideia: “Vocês têm uma bola?”. Em questão de segundos todos estavam correndo atrás “de la pelota”, como disse o chileno.

Ao final, pedimos para fotografá-las nas salas de aula improvisadas. As professoras disseram que diariamente há aulas de matemática, francês, crioulo e um pouco de inglês. Já estavam sorridentes quando, em uníssono, contaram: “One, two, three… ten.”

Diário

Base das Nações Unidas em Porto Príncipe abriga parte das forças internacionais de paz e coordena ajuda humanitária ao povo do HaitiA viagem entre Brasília e Porto Príncipe, na quarta-feira, foi tranquila. Houve paradas técnicas em Manaus e na Venezuela. Chegamos ao Haiti no final da tarde, já noite em Natal (são duas horas de diferença no fuso horário).

Além de mim, há mais dois colegas de imprensa nessa viagem: uma jornalista brasileira e um fotógrafo chileno. Ambos trabalham juntos em Buenos Aires. Todos fomos recebidos pelas autoridades militares brasileiras em missão no Haiti. Após sermos acomodados em contêineres, fomos jantar e ficamos sabendo como será nossa rotina diária até a próxima terça, quando voltaremos ao Brasil.

Ontem o dia foi proveitoso. Logo cedo recebemos nossas credenciais de imprensa da ONU e paramos para tirar fotos pela cidade. Após o almoço, visitamos a obra da Companhia de Engenharia. Já era noite quando voltamos. Tive que escrever os textos e enviar as fotos às pressas porque havia uma programação para visitar uma obra de tapa-buracos na madrugada.

Até amanhã.

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