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Praia inclusiva: mergulhos que transformam vidas

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Yuno Silva
Repórter

Um simples banho de mar pode transformar vidas, e Nildo sabe muito bem disso. Rosenildo Barbosa da Silva, de 34 anos, por problemas no parto, nasceu com paralisia cerebral. Ela faz fisioterapia em piscina, mas foi no mar que se encontrou: desde maio de 2017, Nildo aproveita as manhãs de domingo na praia de Ponta Negra. “Ele só não vem quando está chovendo ou está gripado. Todo domingo acorda logo cedo e começa a aperrear para vir”, brincou Manoel, pai de Nildo, logo após sair do mar. Rosenildo, inclusive, fez questão de comemorar o aniversário do ano passado com a nova turma. “Melhorou bastante, antes ele só ficava em casa na cadeira de rodas, do sofá para a cama, da cama para o sofá, na frente da televisão ou ouvindo música”, disse o pai.

Eles participam do projeto Natal Praia Inclusiva, que todos os sábados e domingos das 8h às 12h, recebem qualquer ‘pessoa diferente’ interessada em dar um mergulho e pegar um bronze próximo ao Morro do Careca onde o mar é mais calmo. A iniciativa é uma parceria da Sadef-RN (Sociedade Amigos do Deficiente Físico) e a Uninassau (Centro Universitário Maurício de Nassau), que em um ano e nove meses passou a marca dos mil mergulhos.
Projeto acontece todos os sábados e domingos das 8h às 12h, na praia de Ponta Negra, e é gratuito

Projeto acontece todos os sábados e domingos das 8h às 12h, na praia de Ponta Negra, e é gratuito

#SAIBAMAIS#Mário, de 47 anos, um dos novos amigos de Nildo assegura: “O projeto, como forma de inclusão, é ainda mais importante por que a sociedade está aqui, vendo a gente entrar no mar e tomando banho como pessoas ‘normais’. A diferença é que eu uso um aparato para entrar dentro da água (uma cadeira de rodas adaptada). Pensam que somos de outro mundo”. Ele teve poliomielite na primeira infância, é cadeirante, dirige o próprio carro e tem oito filhos. “Um banho de mar melhora tudo: saúde, cabeça, astral! Estar no meio das pessoas é um começo para quebrar a discriminação sobre algo que deveria ser ‘normal’”.

O cearense Francisco Mário Alves Tavares conhece os próprios direitos, critica a falta de acessibilidade nas ruas e calçadas, e coloca aspas quando fala ‘pessoas normais’ e ‘pessoas diferentes’ para enfatizar que somos “iguais, mas diferentes”.

Fábio Henz, 32, administrador de empresas, nasceu com mielomeningocele (uma má formação na coluna vertebral que afeta a medula) e também é cadeirante, acrescenta: “o projeto é sensacional para todo mundo, não só para pessoas com deficiência: engloba, inclui. Precisamos estar juntos e unidos”.

As histórias testemunhadas pelo assistente social Antônio Galdino, do setor de Responsabilidade Social da Uninassau e um dos coordenadores do Natal Praia Inclusiva, emocionam. “Recebemos pessoas que nunca tinham entrado no mar. Outro dia recebi um senhor de Macaíba que há mais de 20 anos não entrava no mar. Tem gente que chora, se emociona, e nos emocionamos junto; quando estão aqui conseguem esquecer as dificuldades. Não tem idade para participar, basta querer”, garante.

Entre os banhistas do Praia Inclusiva pessoas que tiveram alguma lesão e perderam mobilidade, pessoas que ainda estão se adaptando à nova condição (como vítimas de acidentes), pessoas que são deficientes desde criança, deficientes visuais, idosos com baixa mobilidade e/ou que tiveram AVC. “Atendemos todos, é só chegar e participar. Recebemos familiares também, que muitas vezes entra junto no mar para saber como funciona, como é nosso trabalho”, disse Galdino. “Os resultados, as reações e as histórias é que nos motivam. Nos tornamos amigos.

Outras atividades

Além do banho de mar o projeto também promove passeios de caiaque, stand-up, partidas e vôlei sentado e futebol para amputados. Tudo depende do público. Uma equipe de 12 pessoas, formada por alunos da Uninassau dos cursos de Enfermagem, Serviço Social, Fisioterapia e Educação Física dão suporte ao acolhimento – por fim de semana, em média, são atendidas de 40 a 50 pessoas.

A participação é gratuita e não necessita de cadastro nem inscrição prévia. “Só chegar e dizer que quer tomar banho. Independente da maré alta ou baixa, dá para entrar tranquilo nesse trecho da praia”, avisa o assistente social Antônio Galdino. “Nunca tivemos nenhum acidente, prezamos pela segurança. Todos usam coletes salva-vidas, nossos monitores são treinados”, garante.

A viabilização inicial do projeto Natal Praia Inclusiva contou com apoio da OrtoRio e recursos da Fundação Mapfre, empresa do ramo de seguros que patrocina projetos sociais e contempla propostas através de editais públicos.

“O edital foi só para iniciar o trabalho, estamos sempre buscando e precisando de apoio. Inclusive estamos com uma campanha arrecadar material para construção de um banheiro adaptado ao lado do nosso contêiner – o banheiro já está aprovado pela Prefeitura”, explicou Galdino. O natal Praia Inclusiva obteve autorização para instalar um contêiner onde o material para uso é guardado. Em todo o litoral do Rio Grande do Norte, apenas em Ponta Negra existe esse tipo de suporte para garantir o banho de mar com segurança.

Rosenildo Barbosa da Silva
Manoel Xavier de Oliveira, 54, pai de Rosenildo Barbosa da Silva, de 34 anos. Nildo teve paralisia cerebral devido complicações no parto, e antes de participar do projeto Natal Praia Inclusiva “ele só ficava em casa na cadeira de rodas, do sofá para a cama, da cama para o sofá, na frente da televisão ou ouvindo música. Agora não perde um domingo na praia, só não vem quando está chovendo ou está gripado”, disse Manoel.
Nildo não fala, nem anda, também não come sozinho, mas “sabe tudo o que está acontecendo, e é mais inteligente que eu”, garante o pai.

Francisco Mário Alves Tavares

Francisco Mário Alves Tavares, 47, teve poliomielite (paralisia infantil) no primeiro ano de vida. Passou a frequentar a praia de Ponta Negra todos os fins de semana com a família. “Quando não venho no sábado, venho no domingo; e dependendo do preço da gasolina venho os dois dias”, disse.
Cearense aposentado e pai de oito filhos, Mário afirma que “aqui no RN as pessoas têm um preconceito muito grande em relação aos deficientes. As famílias têm medo de expor os deficientes, os deficientes têm medo de aparecer, tem preconceito de si mesmo”.

Fábio Henz, de 32 anos
Fábio Henz, de 32 anos, precisa de cadeira de rodas para se locomover por ter nascido com mielomeningocele (malformação  congênita caracterizada por um fechamento incompleto do tubo neural que expõe a medula). Administrador de empresas, ele já fez viagens internacionais e tem propriedade para comparar o tratamento dispensado para pessoas com deficiência no Brasil e no exterior. “Em países mais avançados que o nosso não há restrições: os deficientes têm uma vida autônoma pois a mobilidade é pensada para ser completamente acessível. A praia é local de inserção, de lazer para todos, e esse projeto trabalho muito bem essa questão”.

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