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Procura por pescado reduz 80% no Mercado do Peixe e Canto do Mangue

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Mariana Ceci
Repórter

Ainda em recuperação
após a crise provocada pelas manchas de óleo que
chegaram às praias do Nordeste brasileiro no segundo semestre
de 2019, o setor pesqueiro agora enfrenta queda na demanda interna e
na exportação, provocadas pelo Coronavírus. De
acordo com relatos de pescadores do Canto do Mangue e do Mercado do
Peixe de Natal, a queda na procura pelo produto, muito procurado
normalmente durante o período de páscoa, chega à
80%. A crise atinge desde às grandes empresas exportadoras de
produtos como o atum, que estão com às exportações
integralmente paralisadas, aos pescadores artesanais, muitos dos
quais ainda não receberam o seguro-defeso de 2020, e estão
se mantendo com ajuda de familiares.

  

Pescadores temem vendas abaixo do esperado na Semana Santa

No Canto do Mangue, em
Natal, ponto de venda para muitos pescadores artesanais da cidade, os
efeitos da queda nas vendas já são sentidos no
dia-a-dia das famílias de pescadores e, também, nos
preços dos pescados, que caíram em até 28% desde
o ano passado. “Aqui trabalhamos a família inteira: neto,
avô, pai, primos, tios”, conta Callini Venâncio, de 26
anos. De acordo com ela, que há cinco anos trabalha com os
familiares em uma banca montada em frente ao Mercado do Peixe, no
bairro das Rocas, no período da páscoa, costuma-se
vender em média 500 kg de peixe por dia. Este ano, no entanto,
a média diária não ultrapassa os 100 kg.

“O movimento está
muito fraco e, do jeito que está, não vai durar muito.
Os peixes já estão bem mais baratos do que no ano
passado, mas mesmo assim falta gente para comprar”, diz Callini. A
cioba, por exemplo, que na páscoa de 2019 era vendida à
R$ 35 o quilo, hoje pode ser encontrada por valores que variam entre
R$ 25 e R$ 20 entre os pescadores. Dentro do Mercado do Peixe, a
situação não é melhor: o local, que
costuma receber uma grande quantidade de clientes na semana anterior
à Sexta-Feira da Paixão, onde tradicionalmente os
cristãos consomem peixe, estava ocupado principalmente pelos
próprios funcionários na manhã da quarta-feira.

Há cinco anos,
Wedipo Teixeira, de 29 anos, é contratado para reforçar
a mão-de-obra de um dos quiosques de pesca do Mercado apenas
durante o período da Semana Santa, e conta que nunca viu o
local tão vazio de clientes. “As vendas caíram na
faixa dos 70%. Todos os preços estão mais baixos, o
pessoal entra mais cedo e sai mais tarde na esperança de
vender algo”, diz ele.

Wedipo Teixeira afirma que nunca viu o Mercado do Peixe tão vazio de clientes

Alternativas

Na tarde da última
quarta-feira (7), uma reunião extraordinária da Câmara
de Comércio de Pescados aconteceu no Ministério da
Agricultura, reunindo empresários do setor e representantes do
Governo Federal a fim de discutir possíveis saídas para
a crise. De acordo com Gabriel Calzavara, diretor do Sindicato da
Indústria da Pesca do RN (Sindipesca-RN), o principal objetivo
a curto-prazo é garantir o custeio do setor para que as
empresas, em sua maioria de pequeno porte, não fechem as
portas definitivamente nos próximos meses.

“Nós
precisamos de um crédito específico para o setor
pesqueiro, porque a cadeia produtiva inteira está rompida
diante dessa crise. A maior parte dessas empresas são
pequenas, e não possuem capital de giro para manterem as
portas abertas por dois meses, por exemplo”, diz Calzavara. O
diretor afirma que há duas principais dificuldades para o
setor pesqueiro: a primeira, está relacionada à própria
ausência de mercado consumidor para os produtos e, a segunda, à
dificuldade logística imposta pelas restrições
de voos e demais políticas de isolamento social.

O professor de economia
da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e Secretário
de Pesca e Agricultura de Macau, Antonio-Alberto Cortez, conta que a
crise provocada pelo Coronavírus teve proporções
maiores à das manchas de óleo, pois o mercado ainda não
estava plenamente recuperado. “Mesmo antes de uma recuperação
plena, veio essa questão do Coronavírus. Isso impactou
de forma extraordinariamente maior do que a própria época
do derramamento do óleo”. De acordo com o professor,
apenas no segmento da pesca de atum, cerca de 1,6 mil pessoas que
trabalham diretamente na atividade podem ser afetadas, sem contar os
trabalhadores de terra dos estaleiros, frigoríficos e outros
elos da cadeia produtiva.

“A situação
dos pescadores é muito complicada. Primeiro porque você
não tem pescadores ricos. Você pode até ter um
atravessador rico, mas o pescador, em si, não. Muitos se
encontram em uma encruzilhada: se obedece às recomendações
para ficar em casa, não pesca e, consequentemente, não
tem renda. Se ele desobedece a recomendação e vai
pescar, não tem para quem vender, ou seja, o setor encontra-se
em uma situação muito difícil”, diz Cortez.

Na reunião
extraordinária da Câmara do Comércio de Pescados,
os empresários apresentaram algumas demandas ao Governo
Federal. De acordo com o diretor do Sindipesca-RN, o primeiro pedido
do setor à União foi para abertura de um crédito
específico para os setor pesqueiro, que possa custear ao menos
o abastecimento dos barcos durante três meses – para passar 20
dias no mar, um pesqueiro de atum com 10 tripulantes tem custo médio
de R$ 220 mil para operar.

Hoje, os pescadores têm
dificuldade na obtenção de crédito junto aos
bancos, por não poderem utilizar os barcos como garantia. “O
nosso pedido foi para que haja um fundo que assegure esses créditos
e que possa utilizar a produção e as embarcações
como garantia”, diz o diretor. Os representantes dos estados
pedem, ainda, o pagamento da compensação do Governo
Federal do Programa de Equalização de Óleo
Diesel para a Pesca, o adiamento da temporada de pesca da lagosta,
programada para abril, para o dia 1 de maio e a reativação
das negociações com a União Europeia para que os
embargos impostos ao setor pesqueiro brasileiro sejam finalizados.
Desde 2018, a União Europeia deixou de importar pescados
brasileiros, com base em auditorias que analisaram principalmente
questões relacionadas ao transporte dos produtos.

De acordo com o diretor
do Sindipesca, o mais urgente é que às medidas tomadas
pelo Governo Federal sejam rápidas. “Precisamos de
ferramentas que não tenham burocracia e venham direto para
nós, caso contrário, temos uma cadeia produtiva enorme
em risco, e milhares de pessoas podem ser afetadas”, afirma
Calzavara.

Seguro-defeso

Mais de 1.500
trabalhadores aguardam na fila do Instituto Nacional de Seguro Social
(INSS) para receber o seguro-defeso, benefício que tem o
objetivo de garantir o sustento dos pescadores artesanais durante os
períodos nos quais eles ficam impedidos de pescar para
preservar as espécies de peixes.

Em resposta à
uma solicitação feita pela TRIBUNA DO NORTE, a gerência
do INSS Natal informou que, este ano, foram recebidas 3.171
solicitações de seguro-defeso, das quais 1.509
encontram-se pendentes de deferimento e 1.662 foram deferidas. De
acordo com o órgão, das 1,5 mil análises
pendentes, 542 carecem de algum documento para serem concluídas.
“Os pescadores artesanais constituem um estato social muito frágil.

Em contato com a
representante legal da Colônia de Pescadores de Natal, há
solicitações que foram feitas ainda em dezembro de
2019, e que deveriam ter começado a ser pagas em janeiro, mas
que sequer chegaram a ser analisadas. A situação
reforça o cenário de dificuldades que muitos dos
pescadores têm enfrentado para se manter no Rio Grande do
Norte. De acordo com o INSS, o Instituto, “por meio do Serviço
de Benefício do INSS/Natal, vai organizar Grupo de Trabalho,
para concluir os processos pendentes, o mais rapidamente possível”.

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