quinta-feira, 18 de abril, 2024
28.1 C
Natal
quinta-feira, 18 de abril, 2024

Quadrinhos para a quarentena

- Publicidade -
Tádzio França
Repórter
Aquilo que renderia uma tensa história distópica em quadrinhos virou realidade e obrigou o segmento a pensar outras narrativas para amenizar a situação. A pandemia do coronavírus cancelou ou adiou uma série de eventos de quadrinhos que seriam realizados neste semestre. Sem convenções presenciais, um grupo de quadrinistas brasileiros levou a turma para a internet, resultando na campanha “Quadrinhos para a quarentena”, que consiste num pacote de HQs nacionais à disposição para leitura e download, tudo gratuitamente. Uma forma de entreter as pessoas isoladas e manter esse mercado em movimento.
HQs de quadrinistas de todo o Brasil pode ser acessado para leitura e download
A ideia surgiu inspirada por uma hashtag no Twitter chamada #coronacon, uma brincadeira sobre as convenções do gênero, as ‘comicons’, que foram canceladas devido ao coronavírus. “Como não pode ter mais convenções abertas, foi sugerida uma forma de fazer o evento em casa, onde as pessoas pudessem adquirir pela internet os quadrinhos que elas conhecem nos encontros”, explica o roteirista cearense Zé Wellington, um dos idealizadores da campanha. Ele ressalta que a adesão foi imediata, e seu e-mail ainda está cheio de gente querendo participar.
A campanha se insere no rol de iniciativas que visam dar opção aos artistas atingidos pelos efeitos do coronavírus no segmento cultural. Segundo Wellington, boa parte dos quadrinistas brasileiros tem sua renda relacionada a convenções, cursos e outros eventos presenciais. Portanto, ao baixar uma HQ o leitor pode seguir o autor nas redes sociais e vir a comprar suas obras, ajudando o artista a passar por esse momento de eventos cancelados e livrarias fechadas.
Entre os eventos que a pandemia cancelou está a Feira Internacional de Quadrinhos (FIQ!) de Belo Horizonte (MG), considerada uma das mais importantes do país. Outra ameaçada é a Geek Nation, que ainda não se pronunciou (seria em maio), mas provavelmente também será suspensa. “O impacto disso é muito grande sobre nós porque o quadrinista depende muito dos eventos, é lá onde ele consegue desaguar e vender sua produção, fazer contatos, exibir a produção. O mercado nacional ainda é muito verde, economicamente falando, a gente depende muito de vendas diretas. As editoras são muito pequenas, com raras exceções”, diz.
O roteirista cearense Zé Wellington diz que impacto é grande sobre os quadrinistas, pois a maioria depende dos eventos
Traços e tramas
O site que reúne o material do “Quadrinhos para a quarentena” dispõe de uma centena de produções em PDF que podem ser lidas na própria página ou baixadas. Reúne material de autores novos e experientes, que mostram toda a variedade da produção brasileira contemporânea. Tem ficção científica, terror, humor, dramas adultos realistas, traços experimentais, temas regionais ou urbanos, e até opções infantis. “Uma das coisas mais legais pra quem seguir o projeto, é encontrar uma diversidade absurda de trabalhos, de todos os tamanhos, todos os gêneros, para todas as idades”, afirma Wellington.
O roteirista de HQs ressalta que a mistura das mais variadas referências é o que faz a identidade da produção nacional de quadrinhos. “Por aqui o brasileiro faz quadrinho japonês, americano, europeu. Nós não temos um quadrinho com uma cara específica como o mangá, por exemplo, mas isso é que é o legal, pois reflete o tamanho do Brasil, que é um país cheio de outros países dentro”, analisa. Wellington acha estimulante acompanhar a produção nacional pois não se sabe o que pode vir da cabeça do autor brasileiro: pode surgir qualquer coisa, qualquer estilo.
Para a “quarentena” Zé Wellington contribuiu com “Interlúdio”, um trabalho seu de 2008 indicado ao HQ Mix, o principal prêmio de quadrinhos do Brasil. É uma produção curta que foi feita especialmente para a internet, com um formato diferente daquele do papel, pensado para ser mais confortável de se ler nas telas. A trama conta a trajetória de três personagens cujas histórias se tocam e influenciam umas às outras. A criatividade dá o tom em histórias como “Calango”, uma distopia no sertão; a história de “Lucas da Vila de Sant’Anna da Feira”, um escravo cangaceiro do século 19; “Sombras de Recife”, sobre contos de terror pernambucano; as aventuras do herói negro Hakim; o humor de “Botamem”; as poéticas histórias de “Orixás” de Alex Mir; as crônicas de Archimedes e seu bar na esquina do universo, e os zumbis da “São Paulo dos Mortos”. Entre muitos outros traços e viagens.
Zé Wellington espera que esse projeto também sirva como um aperitivo, a introdução ao quadrinho nacional para muita gente. “Às vezes é a primeira história de uma história maior. Para conhecer, quebrar esse preconceito com o autor nacional, e a partir disso buscar o trabalho do artista pela internet, redes sociais, e até mesmo comprar esse trabalho, que será algo muito importante nesses tempos que virão. O impacto do corona na economia será grande, especialmente para as pessoas que vivem da arte, como nós”, lamenta. 
O quadrinista e ilustrador Brum subiu seis produções autorais: Ideia surgiu de uma hashtag no twitter chamada “coronacon”
Rodrigo Brum, quadrinista e chargista da TRIBUNA DO NORTE, está presente na campanha com seis produções autorais – inclusiva a mais nova, “TriBRUMna”, que apesar de ainda estar em campanha de vendas, foi inserida no projeto para fortalecer o movimento. Além desta, estão disponíveis também as três coletâneas de tirinhas “Não quero sou nerd”, “Prapai” e “Itismailaifi”, além do álbum infantil “Tijolo”, com as histórias do Menino da Laje, e as tiras do “Barriga de Rato”.
O chargista ressalta que o momento é difícil, mas também criativo para quem desenha arte seqüencial com conteúdo crítico. “Quem é de uma área como a minha já está calejado. O governante atual do país é uma fonte inesgotável de inspiração. Sempre tem algo escabroso pra gente ver, e ainda acompanha as reações dos seguidores fervorosos dele”, diz. Quanto à pandemia, Brum afirma que o momento é mais de educação e crítica do que de piada. “Eu me policio para não ser tão humorístico nas charges sobre o corona, prefiro fazer alertas. A não ser quando se junta corona e presidente numa mesma situação. Aí a coisa fica surreal”, conclui. 
SERVIÇO
Para ler ou baixar os quadrinhos, basta acessar o link. O acesso é por tempo limitado. 
- Publicidade -
Últimas Notícias
- Publicidade -
Notícias Relacionadas