Ramon Ribeiro
Repórter
O professor Everardo Ramos mostra peças da coleção do importante
pesquisador e folclorista pernambucano Roberto Benjamin, uma das poucas
com matrizes no Brasil. A transferência para Natal só foi possível numa
operação envolvendo o Museu e a Fundação Norte-Rio-Grandense de Pesquisa
e Cultura (FUNPEC)
A coleção é composta por matrizes de gravura popular que foram utilizadas em rótulos de produtos, álbuns e, principalmente, serviram para ilustrar capas de folhetos de cordel. O diretor do MCC, professor Everardo Ramos, afirma que o acervo, embora não tão numeroso como o de outras instituições, é um dos mais importantes do gênero no país, sobretudo pela abrangência. “A coleção do Roberto Benjamin cobre um período que vai do início até o fim do século XX. As matrizes são de diversos artistas e em diversos tipos de suporte, como linóleo (borracha), madeira e zinco. Alguns usados para cordel, outros para imprensa e até mesmo rótulos”, diz o professor, que é especializado em Arte Popular.
“A maioria das coleções são de folheto de cordel e de gravuras soltas. De matrizes não existem muitas coleções públicas. O MAUC (Museu de Arte da Universidade do Ceará) tem uma coleção riquíssima, mas mais focada em xilogravura. E a Casa de Rui Barbosa, no Rio, também tem uma coleção importante de matrizes. A que o MCC adquiriu se destaca pela grande variedade de tipos de matrizes”.
Everardo explica que a matriz é o suporte onde o artista trabalha pensando no resultado final, no caso, a imagem gravada. Nesse sentido, essas peças são importantes porque podem revelar melhor o processo criativo e a técnica do artista. “Estando com as matrizes a gente tem acesso a informações que somente com as gravuras impressas não era possível ter. Se pode estudar a maneira como cada artista trabalhava”, comenta.
Matrizes eram usadas para imprimir cordel, rótulos, jornais e até
cartazes de cinema, que depois eram reproduzidos nos folhetos
Sobre as placas de zinco, o professor também lembra de uma curiosidade. “Muitas dessas placas de zinco vinham do exterior. As distribuidoras de Hollywood mandavam para os jornais já com os rostos dos atores e atrizes para fazer a divulgação dos filmes que iriam estrear. Depois de usados, os artistas populares compravam essa placas e usavam para fazer capas de folhetos de cordel, aproveitando as imagens dos atores. O engraçado é que as histórias não tinham nada a ver com os filmes. Tem clichês de zinco que são muito raros”, conta Everardo. Ele informa que para que o ano que vem, quando o MCC completará 60 anos, deve ser apresentada uma exposição junto com a publicação de um livro detalhando o acervo.
“Uma doação importante como essa que recebemos fazia muito tempo que o Museu não tinha. Nem sei dizer quando foi a última. A gente tem doações pontuais, de uma obra, por exemplo. Coleção é muito raro. E no formato em que a Funpec adquiriu, doando para o museu, acredito que seja a primeira vez. O MCC não tinha acervo referente a cultura popular. Estamos construindo agora. É recente. E é uma expressão muito forte na nossa região”, diz o professor, que torce para que esse tipo de doações ocorra mais vezes. “É importante que isso continue. Seria maravilhoso que a elite econômica da cidade tivesse essa preocupação cultural”.
Coleção Roberto Benjamin
O acervo de matrizes pertencia ao importante pesquisador e folclorista pernambucano Roberto Benjamin. Ele faleceu em 2013, mas ainda em vida pediu que sua coleção fosse doada a Marcelo Soares, amigo de longa data e famoso xilógrafo popular. Em posse das obras, Marcelo passou a oferecê-las a instituições culturais, despertando o interesse de uma universidade americana, que já havia comprado a rica coleção de 4 mil folhetos de cordel deixada por Roberto Benjamin.
Para impedir que mais uma preciosa parte da cultura brasileira fosse para o exterior, a FUNPEC apareceu para comprar a coleção, que será doada agora ao Museu Câmara Cascudo. No museu, as obras serão cadastradas como “Coleção Roberto Benjamin/FUNPEC de gravura popular”.