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Riva 76

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Rubens Lemos Filho
O menino, teimoso, tapeava o pai, siciliano sangue quente e orgulho disfarçado. Banco para o garoto, nem o da escola. O curso natural da vida era a bola jogada com os amigos humilhados por dribles homéricos e indecentes. “ Sai da rua, Roberto”, berrava seu Nicola.
Roberto, Rivellino com dois éles abreviados pelo tempo e a fama, desafiava o cinto grosso de couro e a autoridade paterna enfileirando colegas e desafiantes de quadras de rua. Um gênio genioso no pé esquerdo.
No entreato de 1971 a 1978, viuvez de Pelé,  Rivellino  carregou nas costas sinalizadas pela camisa 10, as esperanças e devaneios do torcedor romântico, fanático e bêbado de tanta elasticidade canhota. Rivellino  enganava seus inúteis perseguidores com uma goma de mascar escondida em algum detalhe da chuteira.
Corria  1975. Vivíamos num apartamento alugado de esquina na avenida Hermes da Fonseca, em frente ao Quartel do Exército. O pai vascaíno fanático pelo timaço de Walter Marciano e Vavá de 1956, gozava seu segundo ano de liberdade. Fora destroçado fisicamente pela Ditadura, desprezado por amigos e parentes medrosos e colaboracionistas da tirania.
Não raro, aos domingos de clássico, dominava a cozinha, fazia pratos extravagantes até ser admoestado por agentes do Dops, um departamento de tortura de pancada e de esfarelamento psicológico.
Levavam meu pai até a delegacia para “averiguações”, humilhavam-no  e o soltavam com risadinhas cínicas. Tenho menos ódio dos orangotangos do passado do que dos néscios do presente, nulidades que pedem ditadura sem colhão para tomar um cascudo. Numa dessas perseguições, perdeu a hora do jogo no Castelão( Machadão) e voltou para o pequeno apartamento aos impropérios.
Chegou a tempo de ligar o televisor , tomar uma dose de Cachaça  Caranguejo e sintonizar  a TV Universitária. Brincávamos, eu e minha irmã, minha mãe, católica, apostólica e americana contra a maioria, rezava seu terço. Ouvimos o berro: “ Filho da puta!”.
Não era delator ou espancador o alvo. Papai xingava o dedicado volante Alcir, do Vasco, paralisado pelo drible dos mais debochados  de todos os tempos do Ex-Maracanã. Rivellino, bola colada à pata boa, produzira um efeito especial.
 A bola foi e voltou em centímetros latifúndiários sem sair do seu domínio. Parado estava, parado Alcir ficou. Levou uma caneta, Rivelino passou no meio dos zagueiros Moisés e Renê feito raio, esperou a queda do goleiro Andrada e tocou a bola rasteiro.
O Fluminense – eu que apreciava Durango Kid e Daniel Boone – heróis de seriado, saberia depois, ganhava de 1×0 e avançava para o título carioca. Seria o primeiro da vida de Rivellino  em clube, ele que havia sido fantástico no Tri da seleção no México e escorraçado do Corinthians na perda do Campeonato Paulista de 1974 para o Palmeiras.
Rivellino me encantava nos primeiros flertes do amor ao futebol. Jogava brincando, esbanjava categoria, driblava e driblava e traria a Copa de 1978, que praticamente não jogou, machucado e depois barrado pelo técnico Cláudio Coutinho, retranqueiro convicto. Batista, aplicado volante do Internacional tomara o lugar de Rivellino.
Mascote do ABC, minha timidez impediu de lhe pedir um autógrafo no amistoso contra o Vasco em 1979. Rivellino estava entediado, abusado, queria cachê e tabelou cinco ou seis vezes com o maestro Danilo Menezes, seu companheiro de meia-cancha. A partida acabou 1×1 com Noé Macunaíma, substituto de Rivellino, empatando para o ABC. De cabeça, Noé nanico, vencendo o pernóstico Leão, goleiro da seleção brasileira.
O mágico Rivellino fez 76 anos de vida no Reveillon . Nasceu na passagem de 1945 a 46. Uma transição definidora, espetacular. Vi Rivellino jogar depois pelo Brasil de veteranos, lançando com efeito, escravizando marcadores em deslocamentos e fintas deliciosas. Era gostoso ver Rivellino desfilar.
 Melhor que ele, em 1970, só Pelé. Rivellino empatava com Gerson e Tostão. Geração luminosa. A meninada nem sabe quem foi Rivellino  e fica boba com firulas de Robinho. Vantagem minha, que sou velho. Fã do bigodudo, amante requintado de uma bola possuída em orgasmos gritantes. Rivellino ,  Roberto, foi pra rua. Ganhou o mundo.
Regressiva
A volta do futebol estava demorando. Futebol é indispensável o tempo todo, até porque, quando está de férias, a boleirada gasta o tempo em peladas de fim de ano. 
O campeonato estadual dá pinta de que será melhor do que o de 2021 pelos elencos montados por ABC e América, sem esquecer do Globo, merecedor de todo respeito, afinal é o campeão do Rio Grande do Norte. 
A volta do Potyguar de Currais Novos dá charme à disputa porque o Estádio Coronel José Bezerra, onde estreará o América, sempre foi palco de jogos acirrados e de craques formados lá mesmo, na Princesa do Seridó. 
O ABC remontou seu time depois do acesso à Série C. Trouxe jogadores que precisam ser testados pra valer, exceto Kelvin, atacante do Caxias(RS) que só não será sucesso se houver desaprendido, enquanto o América aposta no veteraníssimo Márcio Mossoró e no artilheiro Wallace Pernambucano.
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