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Rock in Rio

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Ivan Maciel de Andrade – advogado

Ninguém quer abdicar de sua individualidade. Todos fazem questão de ter ideias próprias, de escolher suas opções, de aderir a determinados rumos ou de contestá-los com o ardor de quem luta pela própria salvação nesta e na prometida vida futura. Estou convencido de que as pessoas gostam de refletir sobre o significado de sua presença na terra e sobre as razões que as conduzem a situações felizes ou infelizes. Procuram explicações sobre o que lhes acontece ou deixa de acontecer. Por isso é que os “best-sellers” mais tolos contêm tentativas paupérrimas de produzir raciocínios filosóficos que agradam em cheio aos leitores. Afinal, o prazer e a dor vão muito além de meras sensações pela repercussão psicológica que causam, passageira ou duradoura. Até mesmo as angústias e os desesperos servem para particularizar as pessoas, marcando-as mental e moralmente. Há em cada ser humano um complexo de fatores que resistem às padronizações.

Mas na verdade há algo que cria uniformidades: as modas padronizam. E há modas que ditam não só a forma de vestir, mas a preferência ou rejeição por diferentes coisas (eletrônicos, automóveis, filmes, músicas, arte, objetos de maior ou menor valor financeiro). O próprio comportamento das pessoas se adapta à moda vigente. Há, ainda, o jeito de expressar-se com palavras ou gírias que de tão marcantes servem para identificar épocas, grupos sociais, tribos e gangues. O indivíduo perde-se nesse universo de influências coletivas que o modelam da cabeça aos pés, do íntimo da personalidade até sua simples aparência. E as modas vão mudando caprichosamente de acordo com as imposições do mercado e vários outros fatores aleatórios.

Ao lado disso, existem fenômenos de transitória massificação. O Rock in Rio é um deles. No meio daquela alegria programada e regida pelos ídolos que se exibem no palco, percebe-se no pranto convulsivo ou nas lágrimas que descem silenciosamente no rosto de muitos jovens, rapazes e moças, em seus gritos histéricos e movimentos espasmódicos, uma nítida carência emocional. Seriam frustrações domésticas que se expressam nos gestos de total doação ao artista vitorioso e consagrado cujo desempenho é ampliado até limites hipnóticos pela grandiosidade do espetáculo? Sei que essas reações acontecem com plateias de todo o mundo. Mas a carência emocional que leva às drogas e à violência, nas escolas e fora delas, é também um fenômeno universal, próprio de sociedades que vivem exclusivamente em função de fatores materiais, submissas às inexoráveis leis do mercado, com desprezo de princípios e valores cristãos que, acima da fé que se tenha, funcionam em qualquer fase histórica como diretriz fundamental de equilíbrio e de bom senso.

E o que dizer de uma espectadora ainda jovem que perguntada como se sentia em meio a tanta gente que freneticamente ria, gritava, aplaudia e, às vezes, até mesmo cantava, explicou que esquecera seus problemas e vivia o momento do show como se não tivesse passado nem futuro? Estava ali de corpo e alma imersa anonimamente na multidão. Era a melhor sessão de psicoterapia por que tinha passado. Não sentia sequer interesse de iniciar novo relacionamento amoroso.

Comecei a imaginar hipóteses absurdas. Se, em pleno Rock in Rio, aparecesse uma orquestra tocando a Nona Sinfonia de Beethoven. Haveria, sem dúvida, protestos. Mas até onde eles iriam? Se fosse uma orquestra internacional de grande fama – anunciada com todos os seus títulos pelos alto-falantes – amplificada num sistema de som que abala as estruturas do palco e das pessoas, será que não poderia acontecer um milagre? Pressinto alguém resmungando que não acredita em milagre e que a orquestra sairia com os instrumentos quebrados e os músicos, depois de muita pancadaria, teriam de ser protegidos pela polícia. E se invadisse o palco uma escola de samba com boazudas seminuas e a alegria que agita nosso carnaval? Mas não estou contra o Rock in Rio – um “evento” (como se costuma dizer) de enorme sucesso. Massifiquemo-nos…

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