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Santo palhaço

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Yuno Silva – Repórter

O artesão potiguar Guimarães Bezerra, de Cerro Corá, cismou com uma encomenda que mudaria radicalmente seu destino profissional: fazer um São Francisco de barro com cara de palhaço. Neto de artesã índia e avô marceneiro, Guima resolveu pedir conselhos a um religioso antes de produzir a peça e ouviu o que precisava – o frade italiano é visto pelos católicos como o santo da alegria e o trabalho não seria visto como pecado. E lá se vão cerca de cinco anos desde o primeiro santo-palhaço, personagem que catapultou seu trabalho no Brasil e exterior, transformando o que era hobby em principal fonte de renda. Radicado há 16 anos no Recife, o artista é o homenageado deste ano pela Feira Internacional de Artesanato (Fiart), evento que permanece em cartaz no Centro de Convenções da Via Costeira até o próximo domingo dia 27.
O São Francisco circense foi a criação que destacou a obra do artista Guimarães Bezerra. Atualmente ele possui outros 300 personagens
O estande dele é fácil de encontrar, tem o formato de um circo e está logo na entrada da Fiart, mas não adianta se animar pois todas as 35 peças que trouxe foram vendidas no primeiro dia da feira. A mais barata custava R$ 300 e a altura média das esculturas, delicadamente moldadas em barro, tem cerca de 40 cm. Cada figura é única, personalizada, e as feições das cerca de 300 personagens diferentes contém traços do próprio artesão – cada uma tem nome e uma historinha próprias. “Todo artesão tem um pouco de narcisista”, confessa Guimarães.

Esculturas refletem a paixão do artista pelo circoQuando recebe uma nova encomenda, o artesão permite apenas que o cliente escolha o personagem, que pode ser um malabarista com claves, um trapezista ou um músico. Atualmente o artesão se especializa em design de interiores e também trabalha com reciclagem e recuperação de móveis antigos.

No começou da carreira, Guima, nome com o qual assina as peças, criava os palhaços sob encomenda e para amigos, até a hora que precisou decidir se seguiria a carreira estressante de executivo em uma multinacional – ele é graduado em Administração com especialização em Marketing – ou se trabalharia com prazer no que gostava.

Radicado no Recife, Guimarães Bezerra aprimorou sua técnica com o mestre santeiro Ivaldo de Tracunhaém“Na medida que as esculturas começaram a ter uma boa receptividade”, disse o artesão de 39 anos que iniciou sua relação o barro aos 12, “buscava novos espaços para expor e levei uma peça para Célia Novaes conhecer. Célia é autoridade em arte popular e coordena o Programa de Artesanato em Pernambuco, e quando viu os palhaços fez a encomenda do São Francisco”.

O santo-palhaço abriu portas, levou o artesão para feiras de artesanato de todo o país e além fronteira: participou com destaque de um evento no Chile e a expectativa é repetir a dose no segundo semestre deste ano. Também estão pré-agendadas participações em feiras de Portugal e da França. “Sempre gostei de palhaço, dessa coisa dele poder misturar cores e estampas sem preocupação, desde os tempos de menino quando ia àqueles circos do interior que só tem lona nas laterais e um bode amestrado”, justifica Guima ao explicar o fascínio pelo personagem. “Me apaixonei de vez quando assisti um espetáculo do Cirque du Soleil nessa viagem que fiz ao Chile”.

PEDRA DE RIO

A técnica usada por Guimarães foi apurada pelo mestre Ivaldo de Tracunhaém, um santeiro pernambucano conhecido por ser especialista em reproduzir com leveza o movimento do tecido em barro. “Um realismo e uma delicadeza que até então não dominava”, reconhece o discípulo, que hoje utiliza os fornos do mestre para queimar suas peças. Mas ele conta que o maior segredo do seu trabalho herdou da avó, que dava o retoque final na argila utilizando uma “pedra de rio” para aparar rebarbas e lixar as peças.

No início Guima era responsável por todo o processo, desde o preparo do barro até os croquis que dão origem às esculturas. “Agora tenho um assistente para me ajudar com a matéria-prima e estou começando a trabalhar com uma cartunista (Regina), que faz os desenhos enquanto estou produzindo”, informa o artesão, que trabalha de 6h a 12h por dia, produz entre 30 e 50 peças por mês e atende encomendas periódicas de lojas do Rio de Janeiro e de São Paulo. No Recife, é possível encontrar seus trabalhos na loja do embarque internacional do aeroporto Guararapes e no recém-inaugurado Centro de Artes, no Marco Zero do Recife Antigo.

Serviço

Guimarães Bezerra. Contato e encomendas através dos telefones (81) 9769-4250 e 8757-1873.

Artesanato versus quinquilharias

A edição 2013 da Feira Internacional de Artesanato trouxe para o pavilhão do Centro de Convenções, Via Costeira, artesãos dos cinco continentes. Produtos de 14 países estão espalhados pelos 385 estandes, e os potiguares ocupam pelo menos 40% do espaço com produtos criados a partir do barro, palha, madeira, pedra sabão e material reciclado. Quitutes coloridos de todos os sabores também garantem presença no evento: castanhas de caju com cobertura de pimenta ou chocolate, os famosos biscoitos de Caicó, doces cristalizados de Goiás, chocolates de Gramado (RS), entre outras iguarias, disputam espaço com rendeiras de bilro de Ponta Negra e anéis de prata da Bolívia.

Há opções para todos os gostos e bolsos, e se alguns estandes chamam atenção pela originalidade dos produtos outros pecam por não incorporar o ‘espírito da coisa’ – muitos vendedores tentam ‘empurrar’ produtos ‘xing-ling’ encontrados com facilidade nos camelôs do Alecrim ou da Cidade Alta. Afinal qual o artesanato típico de Uganda? Com certeza não são cópias de relógios suíços fabricados na China! E os artesãos paquistaneses tem traços orientais(!) e fabricam artigos amazônicos? Uma coisa não se pode negar, a globalização também afetou a Fiart.

O REI DO BARRO

O imenso estande montado pela Sethas-RN, na entrada da Fiart, destaca a produção de ceramistas de São Gonçalo do Amarante: objetos decorativos e utensílios domésticos podem ser adquiridos com preços bem competitivos; de quebra o cliente ainda pode acompanhar ao vivo o trabalho de mestres artesãos, como José de Santana, 43, ceramista há 26.

José de Santana é presidente da Cooperativa de Produção Artesanal do Potengi em São Gonçalo do AmarantePresidente da Cooperativa de Produção Artesanal do Potengi, Santana é conhecido como “rei do barro”. “Me chamam assim por ter assumido a missão de repassar essa arte aos mais jovens”, acredita. Ele tem aprendizes em todo o RN e sua atuação visa manter a tradição ceramista da região conhecida como Santo Antônio dos Barreiros.

Ele começou a trabalhar com barro por curiosidade, como aprendiz do mestre Gonçalo Gonçalves – mais conhecido por Gonçalo Caminhão. “Percebi que muitos artesãos não passaram essa arte para os filhos, por isso peguei essa missão de não deixar o movimento da cerâmica se acabar”, disse sem parar de moldar um pote de barro.

CORDEL, POESIA E VÍDEO NA CASA DE TAIPA

Apesar de não ser propriamente um artesão, o poeta popular Paulo Varela é figura certa em eventos do gênero. Criador de causos e uma das atrações da programação cultural da feira, ele montou uma casa de taipa na praça de alimentação da feira onde vende lanches típicos da culinária nordestina como tapioca, bolo preto, cuscuz com ovo e mungunzá.

Paulo Varela mostra seu cordel multimídiaInquieto, Varela aproveita a oportunidade para adiantar detalhes do novo espetáculo, “Sertão InVerso”, ao público que visita seu cantinho, que também pode adquirir CDs e DVDs de artistas nordestinos. “Olhe cabôco, vai ser uma apresentação diferente, com projeção de vídeos e fotografias do sertão que vão servir como cenário. Uma mistura de poesia, música e cinema, tudo inédito”, informou. A data de estreia ainda não foi definida, mas a intenção é apresentar no Teatro Alberto Maranhão. “Depois do Carnaval vamos ver isso direitinho”, disse. A direção artística é de Efe Carlos, de Currais Novos.

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