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Se essa rua… fosse um palco

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Sara Vasconcelos – repórter

A rua como palco. O chapéu como bilheteria. A arte em seu estado mais democrático e acessível. Estes são os elementos básicos da chamada arte de rua, que aos poucos vem perdendo espaço nas vias da cidade.  Artistas como o “Prateado” do calçadão da rua João Pessoa, no Centro, grupos de teatro mambembe, emboladores e cordelistas que dividem a calçada e atenção do público, ou os que  enriquecem a diversidade das feiras livres com seus cantos, contos e risos,  aos poucos, são obrigados a se recolher e sair de cena. Em alguns casos, seguir para outras cidades.

Artista ambulante já não pode mais parar na praça e fazer sua apresentação. A nova norma exige autorização para issoO motivo alegado pela classe artística seria uma determinação da Prefeitura de Natal, que desde 2009, vem limitando o uso dos equipamentos públicos. A interpretação da norma administrativa da Secretaria Municipal de de Serviços Urbanos (Semsur) que fiscaliza a ocupação e trânsito de pessoas em  praças, feiras livres, cruzamentos e outros logradouros tem cerceado  o contato direto do artista com o público e a sensação de liberdade, uma vez que condiciona a  a apresentação neste pontos a  documentos de autorização previa.

“Com isso o artista perde o palco que é a praça. Autorização pra atuar? Que direito a Prefeitura tem de proibir o artista se manifestar?”, questiona o Lenilton Lima, produtor cultural e coordenador da antiga República das Artes, que reúne onze grupos culturais.

Os direitos culturais são parte integrante dos direitos humanos. Estão indicados no artigo 27 da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), e nos artigos 13 e 15 do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966). Mas parecem ser ignorados por gestores públicos, observa o produtor.

O processo de revitalização das feiras públicas, ao contrário do esperado, não devolveu a arte e a cultura aos logradouros – pontos autênticos  de manifestação popular. Ano passado, lembra Lima, o grupo que há décadas se apresenta na feira livre do Alecrim, zona Leste da cidade, foi proibida, devido a burocracia, de comemorar o aniversário do bairro. “A vigilância dos fiscais da Semsur demonstra o tratamento dispensado aos artistas. Trabalhamos com medo de violência contra os equipamentos e contra nós”, diz Lima, em referência às notificações aos que se apresentam nos mercados a céu aberto.

No mesmo ano,  artistas argentinos, oriundos de Rosário, província de Santa Fé, na Argentina, que percorriam cidades brasileiras apresentando sua música foram impedidos de realizar seu espetáculo na feira das Rocas. Natal seria a apresentação de número 200 em solo brasileiro. A repressão, embora pacífica, motivou o “Ninguém me cala”, movimento da ala artística potiguar contrário a intervenção da Secretaria, à época.

Renata Marques, produtora cultural do Circo Tropa Trupe, conta que para viabilizar  espetáculo de um grupo de rua gaúcho foi preciso recolher não só a assinatura na Semsu, como também junto à Capitania das Artes, Corpo de Bombeiros, Polícia Militar e Samu. Uma burocracia desnecessária, segundo ela, para aglomerações que reuniram até 200 pessoas. “Cria-se um problema com isso. Afasta-se cada vez mais o artista do público. A arte precisa está principalmente nas ruas para ser vivida. A rua é o palco mais popular”.

As regras não se limitam a capital. Em outras cidades do estado e do país, a ordenação dos espaços públicos tem causado prejuízos a categoria. “Pedir a autorização não existe”, reforça o coro a integrante do grupo Pessoal do Tarará, de Mossoró, Ludmilla Albuquerque, que já foi vítima da força da polícia para inibir um espetáculo há alguns anos em praça pública daquela cidade. A medida foge à lei e fere os princípios constitucionais, segundo a artista. 

Segundo ela, é necessário que as leis levem em consideração as diversas formas não só de  trabalho, mas de arte. Em locais que comprometam a circulação de pessoa, causem tumulto ou propiciem baderna a regulação não só é necessária, quanto bem-vinda.

Norma inibe a arte mambembe

Ao contrário do que se pensa, os cuidados não são dispensados a shows maiores. A performance de estátuas vivas, artistas que ficam paralisados para atrair a atenção do público, também necessita do aval da prefeitura, adverte o diretor de Fiscalização da Semsur, Antoniel Emiliano Carneiro.

O diretor informa não se tratar de decreto ou lei municipal, mas normativa da secretaria para organizar os espaços de modo a beneficiar o trabalho de comerciantes, artistas, moradores e garantir a livre circulação de pessoas. Para isso, é necessário procurar a secretaria e informar local, horário e tipo de manifestação. A permissão é dada   em consentimento com os empresário, comerciantes e moradores do local, no intuito de evitar prejuízos. Em locais de maior trânsito de pedestre, como o calçadão da João Pessoa, esclarece o diretor, é indicado outras alternativas como a Praça Presidente Kennedy. “Em caso de fiscalização, o artista pode ser abordado e notificado da necessidade de permissão. Nunca retirado do local ou ter o trabalho interrompido”, conclui Antoniel Carneiro.

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