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Sem medo de soltar a voz

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Tádzio França
Repórter

Cantar não é apenas a demonstração de um “dom” ou de uma técnica aprendida em conservatórios de música. O canto também envolve a expressão de sentimentos e posturas que podem atuar de forma benéfica sobre a mente e o corpo. Baseado nesse fato, surgiu a Cantoria Terapêutica, projeto da psicóloga e psicoterapeuta corporal Ana Augusta Moreira, que permite a pessoas sem grandes dotes vocais, a possibilidade de soltar a voz para se conhecer melhor e também se sentir melhor. A afinação e a harmonia vão além das cordas vocais.
Na Cantoria Terapêutica, não tem inibição. Ninguém precisa fazer um solo para praticar o canto
Na Cantoria Terapêutica, não tem inibição. Ninguém precisa fazer um solo para praticar o canto

A primeira barreira derrubada pela terapia cantante, é a do desafinado com medo de soltar a voz. “Não ter uma boa voz nunca foi empecilho para não cantar. Para muita gente isso é um bloqueio. Por isso pensamos no canto com um recurso terapêutico”, explica Ana Augusta, que convidou o preparador vocal Venícius Viana para conduzir as sessões de canto terapêutico, que são realizadas uma vez por semana, com turmas de 15 a 20 pessoas. O projeto existe desde março do ano passado. Está em recesso, mas voltará com novas turmas em março.

Venícius esclarece que a terapia não é voltada para a performance, mesmo que futuramente a pessoa possa se aperfeiçoar numa aula de canto profissional. “Nosso alvo são pessoas que não têm experiência com o canto, mas desejam se expressar e são admiradoras dessa arte. Simplesmente soltar a voz e cantar é um processo mais simples do que se pensa”, afirma. O preparador acompanha os alunos apenas com um teclado, conduzindo as sessões onde todos cantam juntos – para não gerar inibição.

Corpo e voz

Durante os encontros musicais e terapêuticos, os participantes não exercitam apenas as cordas vocais. No primeiro momento, Ana Augusta conduz um trabalho corporal, com a finalidade de fazer o aluno soltar o corpo, relaxar e soltar as tensões. “É fato que a gente também canta o corpo, por isso é essencial que ele também esteja afinado com a música”, ressalta. Em seguida, essa consciência corporal é colocada a favor do canto, trabalhando respiração, vocalização e emissão de som. Venícius e Ana ressaltam ainda a importância das vocalizações, os exercícios melódicos que fazem os participantes emitirem as notas mais harmônicas.

“São nesses exercícios que as pessoas encontram a própria voz. É pura consciência corporal”, afirma a psicoterapeuta. “A expressão do corpo se atrela à da voz. A gente trabalha a percepção do ritmo com a melodia”, completa. Outro item que deixa as pessoas bem à vontade durante as cantorias terapêuticas, é o repertório. É um apanhado de canções populares, entre bossa nova, samba, pop/rock e forró. “São músicas que todo mundo gosta, conhece, e que propiciam sensações de liberdade e bem estar para cantar. O Roupa Nova, por exemplo, é bastante cantado por aqui”, diz.

O fato de a cantoria não ser uma aula de canto convencional deixa as pessoas muito mais à vontade para participar. Venícius explica que as dinâmicas são diferentes. “Na aula de canto profissional, há o objetivo de fazer com que o aluno se aperfeiçoe na técnica através da prática rígida. É bem diferente do que fazemos aqui, em que o processo se dá de uma forma mais tranquila e maleável. Não há a exigência dos resultados. O resultado é o bem estar. Aqui a pessoa canta até olhando a letra da música”, explica Venícius. “Nossa cantoria é para quem não canta nem no chuveiro”, brinca Ana.

Males espantados

Cantar, primeiramente, alivia a pressão. Do momento, do dia-a-dia. A partir desse alívio, a cantoria permite variados benefícios a quem a pratica. O canto é um aliviador de estresse, angústias e ansiedades geradas pelo cotidiano. A cantoria é um relaxante natural. Cantar também ajuda a soltar as emoções presas e  diminuir a timidez. Soltar a voz funciona como um grande ampliador de auto-estima, já que  ao descobrir a própria voz, as pessoas perdem o medo de errar (e desafinar), parando de se preocupar com a opinião dos outros.

Os benefícios físicos também fazem parte do repertório. O canto atua diretamente na respiração, fazendo com que ela seja mais profunda e controlada. A repetição dos exercícios faz com que a respiração flua melhor. Cantar também promove o massageamento do diafragma, que se contrai ao inspirar e relaxa ao expirar e soltar o ar dos pulmões. E já que o corpo se conecta com o cantar, também promove uma melhora na postura.

Há uma série de estudos sobre as benesses de se cantar em grupo. Um estudo alemão de 2004 constatou que a prática afeta de forma positiva a produção de cortisol, hormônio ligado ao controle de estresse, imunidade e presença de açúcar no sangue. Cantar desencadeia a produção de endorfina, ligada à imunidade a dor e à sensação de prazer. Alguns locais já experimentam o estímulo ao canto coral como uma forma de amenizar os efeitos do  Alzheimer entre pessoas afetadas por esse mal. O canto em grupo é trabalhado como uma terapia complementar.

A servidora pública Renata Avelino é participante da cantoria desde o início do projeto. Ela, que sempre se considerou nada habilitada para o canto, conta que foi atraída pela proposta terapêutica da cantoria. “Eu tinha um bloqueio para cantar, mas o nome do projeto já foi uma motivação pra mim, já que meu objetivo não era ser cantora, eu queria apenas me sentir bem cantando. Eu queria bem estar”, afirma. Renata afirma já superou a desafinação, mas confessa que não gosta de soltar a voz sozinha. “Claro que cantar em grupo me deixa muito mais à vontade. É uma experiência ótima”, diz.

Segundo Ana Augusta Moreira, a cantoria terapêutica favorece o uso da subjetividade para explorar a sensibilidade de quem canta. Amplia a cultura e torna a pessoa mais sociável. “A gente vive diante de muitas tensões, como síndrome do pânico, ansiedade e depressão. As pessoas ficam desconectadas do corpo e uma das principais partes bloqueadas é a garganta, que é o nosso principal canal de expressão. Eu sinto que há uma vontade de gritar que as pressões sociais inibem. Esse grito de liberdade pode ser emitido através do canto”, analisa.

Após um ano de experiência bem sucedida, a Cantoria Terapêutica chegará ao ambiente universitário em 2018, como um Projeto de Extensão na Escola de Música da UFRN, o “Soltando a Voz”. Terá a mesma proposta, e também aberto  à comunidade. “Foi uma maneira interessante de ampliar o nosso projeto”, diz Ana Augusta. As turmas da Cantoria também continuarão normalmente em seu espaço original. Interessados podem se informar pelo 98844-0050.

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