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Sexo e fisiologia (2)

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Jorge Boucinhas
Médico e professor da UFRN

Tendo o passado Artigo lidado com interessantes aspectos da relação entre aspectos da sexualidade humana e aspectos fisiológicos seus, procura-se hoje ampliar tal visão.  Uma primeira coisa a ser considerada vem de exame dos seres mais próximos ao homem em termos evolutivos.  Bonomos e chimpanzés vivem trocando de parceiros, até misturando os sexos.  Gibões são monogâmicos e gorilas formam haréns, com um macho dominante arrodeado por fêmeas solícitas. Orangotangos machos e fêmeas só se aproximam para a fecundação e passam o grosso de suas vidas como eremitas.  Dentre os humanos são encontradas todas variações encontráveis nos antropoides. E associadas, embora a tendência a ter parceiro único predomine, devendo-se atentar, porém, para o fato de que isto está sujeito a fortes influências culturais e sociais.

Bases biológicas para a monogamia foram observadas em cães da pradaria (marmotas) da América do Norte.  Formam casais fixos, cuidam esmeradamente dos filhotes.  Já seus parentes que habitam as Montanhas Rochosas, ao contrário, mudam de parceiros sempre e largam a prole à própria sorte.  A aparência física e o parentesco genético entre essas duas espécies é enorme, mas dois hormônios presentes no hipotálamo apresentam diferenças notáveis entre os 2 grupos: a oxitocina e a vasopressina.  Os monogâmicos apresentam um número bem maior de receptores cerebrais para ambas que seu parente promíscuo.  Seus níveis sangüíneos aumentam durante o flerte e o coito nas fêmeas, enquanto nos machos a vasopressina aumenta durante a expectativa sexual e a oxitocina durante o orgasmo.  O macho das pradarias, de cérebro mais rico em vasopressina, cria vínculos fortes com parceira e prole; nas fêmeas a oxitocina estimula a atenção com as crias, a vasopressina reduz o apelo sexual.

Também entre humanos a vasopressina e a oxitocina parecem ter, ao menos em parte, similares funções.  Considerar o amor como função hormonal dá o passo inicial para a compreensão biológica do mesmo, embora influências sociais, quais educação, possam prevalecer sobre a influência exercida por um hormônio específico.

Como se articulariam amor e funções cerebrais?  Há centros de prazer e neurotransmissores da felicidade?  Na década de 50 os neurocientistas norte-americanos Olds e Milner implantaram no cérebro de ratos eletrodos que descarregavam microestímulos elétricos.  Os animaizinhos gostavam tanto que buscavam permanecer nos locais em que eram submetidos aos choques.  Outrossim, aprenderam a pressionar a alavanca que lhes propiciava satisfação, tendo chegado ao ponto de negligenciar a alimentação e o sexo, o que lembra a dependência pesada a drogas psicoativas, tendo-se passado a pressupor que haveria ativação de centro cerebral de prazer.  Os estudos posteriores fizeram suspeitar serem feixes neurais que percorrem a região estimulada, sendo que um sistema de células nervosas que se origina numa área denominada mesencéfalo percorre lateralmente o hipotálamo e abastece, com o neurotransmissor dopamina, grande parte de outra área, dita prosencéfalo.  Aumentou o interesse nas funções desempenhadas pela dopamina, que passou a ser encarada como mediador do  prazer, tendo-se verificado produção aumentada quando de ocasiões agradáveis, seja ingestão de comida saborosa, cópula, uso de canabina, nicotina, cocaína, anfetamina, heroína.  Se o sistema é desativado cirurgicamente, as “recompensas” deixam de ter efeito, como se sumisse a capacidade de sentir prazer.

Significaria isso que as pesquisas chegaram a identificar o centro e os neurotransmissores do prazer?  Não exatamente.  Estimulação elétrica isolada do hipotálamo lateral leva à simulação de prazer.  Sensações gostosas semelhantes a um orgasmo foram elicitadas pela estimulação de regiões do septo lateral.  Nos últimos anos, com o auxílio de métodos como as tomografias nuclear e por emissão de pósitrons, pôde-se estudar seres humanos.  O estudo das imagens identificou um rol de regiões cerebrais que, diante de emoções, revelam intensa atividade, embora uma mesma reaja tanto ao prazer quanto à raiva ou ao medo, parecendo inexistirem centros específicos de regozijo.  Os mesmos métodos revelaram que são semelhantes em homens e mulheres os padrões de mudança de atividade encefálica ao se contemplar pornografia.  Viu-se, assim, que os cérebros masculino e feminino processam sensações eróticas de forma bem assemelhada (pelo menos nisso os homens não perdem!).

Mas, pelo exposto, sensações e sentimentos seriam tão somente frutos de matéria e energia em movimento, unidas bioquímica, física e fisiologicamente?  Não! Sabe-se que há muitos fatores mais sutis, de outras esferas, muitos já dissecados nesta coluna, mas é bom ver também o lado corporal da complexidade humana!

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