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“Sinto que a vingança já começou”

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Cláudia Trevisan – Correspondente/AE

PEQUIM – Em contagem regressiva para deixar a China rumo aos EUA, o ativista cego chinês Chen Guangcheng disse ao Estado que continua a ter medo do que possa acontecer com ele e o restante de sua família que ficou na Província de Shandong, onde as autoridades o mantiveram em prisão domiciliar ilegal por 19 meses.
Chen Guangcheng passou seis dias refugiado na embaixada dos EUA e espera pela extradição
“Eu sinto que a vingança desvairada já começou”, disse Chen em entrevista por telefone, do hospital onde está internado em Pequim há nove dias. “Eu tentei falar com minha mãe por telefone hoje, mas não consegui. Meu sobrinho foi preso e não tenho nenhuma informação sobre ele”, afirmou. “Quanto a mim, não posso dizer que estou totalmente seguro. Na verdade, enquanto eu continuar na China, minha segurança será sempre um problema.”

A mãe e o sobrinho continuam na vila rural de Donshigu, de onde Chen escapou no dia 22 para se refugiar quatro dias mais tarde na Embaixada dos EUA em Pequim, abrindo uma crise diplomática entre as duas maiores economias do mundo. O sobrinho, Chen Kegui, está preso sob a acusação de ter ferido com uma faca de cozinha três homens que invadiram sua casa no dia 27, quando a fuga de Chen Guangcheng se tornou pública. “Ele agiu em legítima defesa”, ressaltou o tio. Seu irmão e sua cunhada são mantidos dentro de casa, ainda que sem fundamento legal claro.

“Eu temo que minha fuga traga mais miséria à minha família e o governo local continue a agir ostensivamente contra a lei e a opinião pública” afirmou o ativista chinês. Chen parecia relaxado e otimista durante a conversa com o Estado. Disse que aguarda a emissão de passaportes para ele, a mulher e os dois filhos para poder sair da China. Os três o acompanham no hospital em Pequim.

Segundo Chen, seus principais objetivos nos EUA são descansar e estudar. “Eu não desfruto de um domingo há muitos anos e, depois de tanto tempo de prisão, meu conhecimento jurídico necessita de atualização, portanto tenho de estudar”, observou.

O destino será mesmo a New York University, onde seu amigo Jerome Cohen ensina e para a qual tem um convite como acadêmico visitante. Apesar de a experiência histórica indicar o contrário, Chen disse acreditar que não terá problemas para voltar à China depois dos estudos. “Eles não têm nenhuma razão para me manter fora do país. Estou otimista em relação a isso.”

Mas ele reconheceu não saber se conseguirá manter seu ativismo político nos EUA. “É difícil dizer agora. Não posso fazer nenhuma promessa”, ponderou. A maioria dos dissidentes políticos chineses que se refugiam no Ocidente enfrenta dificuldades para manter sua influência e relevância política depois de alguns meses. Essa foi uma das razões que levou Chen a dizer desde o início que não buscava asilo nos EUA. Sua intenção é ir ao país por um período determinado e voltar à China.

Cego desde a infância, Chen foi analfabeto até os 20 anos, quando conseguiu começar a estudar. Depois de fazer cursos de acupuntura e massagem – ocupações tradicionais de deficientes visuais na China – frequentou aulas de Direito como ouvinte e se tornou um advogado autodidata.

Em 2005, ganhou notoriedade internacional ao expor casos de milhares de mulheres submetidas a abortos e esterilizações forçadas na cidade de Linyi, onde fica sua vila rural. Os procedimentos são proibidos pela legislação que rege o controle de natalidade na China, mas eram amplamente utilizados por autoridades ansiosas por cumprir as metas de nascimentos fixadas pelo governo central.

A atuação de Chen levou ao afastamento de alguns dos responsáveis pela aplicação da política de filho único em Linyi, mas o transformou em alvo da ira dos chefes locais do PC. Em 2006, o advogado foi condenado a 4 anos e 6 meses de prisão sob a acusação de organizar multidão para atrapalhar o trânsito, em um julgamento visto como uma farsa.

Governo chinês promete investigação

O governo da China prometeu discretamente que vai investigar os abusos sofridos por Chen Guangcheng e a família nas mãos das autoridades locais, num raro exemplo no qual Pequim atende às exigências de um ativista.

A aparente disposição de Pequim em levar em consideração as reclamações do ativista é mais um sinal de que sua fuga, no mês passado – quando deixou sua casa, onde estava em prisão domiciliar, numa vila rural e conseguiu chegar à embaixada dos Estados Unidos – foi um sucesso, já que graduadas autoridades passaram a dar ouvidos a sua reclamações.

Chen disse que um funcionário do organismo do governo central que cuida das reclamações dos cidadãos o visitou quatro vezes no hospital em Pequim e que numa delas, na quinta-feira, seu testemunho foi tomado.

“Após tomar meu testemunho, ele disse que iniciaria uma investigação sobre os fatos e que se tiver havido fatos ilegais a questão será abordada de forma aberta”, disse Chen à Associated Press em entrevista na segunda-feira.

Mas num sinal de que o governo não quer que o caso de Chen se torne um precedente que possa encorajar outros dissidentes, Pequim não tornou públicas suas reuniões com o ativista e a cobertura pela mídia doméstica – que é praticamente toda estatal – tem se limitado a despachos feitos pela agência oficial de notícias Xinhua e editoriais que criticam os Estados Unidos.

Chen declarou também que funcionários do governo disseram a ele que vão ajudá-lo a conseguir um passaporte para deixar o país. Por outro lado, amigos e funcionários da embaixada norte-americana continuam a ser impedidos de visitá-lo no hospital.

O ativista declarou também que ele e sua mulher não conseguem sair do hospital, onde ele recebe tratamento para ferimentos sofridos durante sua fuga e para um problema estomacal do qual ele sofre desde que saiu da prisão.

O ativista passou seis dias na embaixada dos Estados Unidos em Pequim após fugir da prisão domiciliar em sua casa. Falando por telefone, do hospital, Chen disse que os funcionários do governo o visitaram na segunda-feira e disseram que o ajudariam a iniciar os procedimentos que vão permitir que ele saia da China.

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