quinta-feira, 28 de março, 2024
29.1 C
Natal
quinta-feira, 28 de março, 2024

STJ reconhece que protesto é legal

- Publicidade -

Ricardo Araújo
Júlio Pinheiro
repórteres

Natal, 15 de junho de 2011. Um dia histórico, uma nova página escrita na política potiguar. O ministro do Superior Tribunal de Justiça, Hermann Benjamin, deferiu habeas corpus cassando os efeitos da ordem do TJRN para desocupar o prédio da Câmara Municipal com o uso de força policial.
Manifestantes estão há 10 dias ocupando o pátio da Câmara Municipal. Direito de protestar foi reconhecido por ministros do STJ
A saída dos manifestantes com uso da Polícia Militar, caso fosse necessário utiliza-la, havia sido determinada pelo desembargador Dilermando Mota. De acordo com o documento assinado pelo ministro do STJ, cabe à Prefeitura e à Câmara Municipal de Natal, negociarem a saída dos ocupantes. Hermann Benjamin não determina até quando isto poderá ser feito.

Na decisão do ministro relator constam as seguintes determinações: “Defiro parcialmente a liminar pleiteada para cassar os efeitos da ordem de desocupação mediante reforço policial, sem prejuízo de a administração ingressar em juízo com as medidas adequadas para fazer valer a pretensão”. O comunicado foi feito às partes envolvidas no processo logo após a decisão.

Às 18h32min, os telegramas MCD2T-143 e MCDT2T144, foram expedidos ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte e à Câmara Municipal, respectivamente. A decisão está prevista para ser publicada no  Diário Oficial da União hoje.

Com a determinação do ministro Hermann Benjamin, cabe à Prefeitura e Câmara Municipal de Natal entrar com uma ação de reintegração de posse no juiz de primeiro grau, esclareceu o conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB RN), Daniel Pessoa. “Porém, como a Câmara Municipal é um prédio público a ação não cabe, não tem razão de ser”, ressaltou o conselheiro. Daniel Pessoa definiu os estudantes acampados como baluartes da “nossa constituição”.

Para o vice-presidente da OAB no Rio Grande do Norte, Aldo Medeiros, a decisão do STJ é técnica. “Existiam duas possibilidade que poderiam ter sido analisadas: o mandado de segurança ou reintegração de posse. A Câmara optou pelo mandado”, destacou. Aldo comentou que para a OAB é uma pena que a situação tenha chegado ao STJ. “No final, teve que haver a decisão judicial devido à intransigência das partes”.

Já Paulo Eduardo Pinheiro Teixeira, presidente da entidade, afirmou que a determinação do ministro foi mais uma fase nesta história – a ocupação da Câmara Municipal. No entendimento dele, o ministro interpretou que o “remédio utilizada pela Câmara e Prefeitura não foram os corretos”. Paulo reafirmou que a OAB defenderá os jovens enquanto o movimento #ForaMicarla mantiver o foco nas reivindicações sem radicalizar ou deteriorar o patrimônio público.

O vereador do PRB, Raniere Barbosa, ressaltou que a decisão legitimou o movimento e mostrou que a população foi respeitada. “A prefeita deveria renunciar. Quem não representa a população é quem defende esse governo. Se fosse independente, não seria assim”, declarou Raniere.

Às 18h01min, a decisão do Supremo Tribunal de Justiça foi publicada no site do órgão. Às 18h04min a líder sindical Soraia Godeiro recebeu uma ligação e gritou. Todos pararam, sem entender o que estava acontecendo. “Não acredito! Nós vencemos em Brasília”, esbravejava a sindicalista. Ao comunicar a decisão do ministro aos acampados, iniciou-se a festa.

Um misto de felicidade e alívio tomou conta dos acampados que esperavam ser retirados pela Polícia Militar de dentro da Câmara Municipal. Entre abraços, beijos e gritos de guerra, os jovens, adultos e idosos presentes, compartilhavam de um momento sem precedentes na história política natalense. Para comemorar, cantaram o Hino Nacional Brasileiro embalados pelo som dos tambores de plástico.

A TRIBUNA DO NORTE tentou, durante várias vezes ao longo da quarta-feria, um contato com o vereador Edivan martins, presidente da Câmara, para ele comentar as duas decisões judiciais do dia. Sem sucesso. O vereador não retornou nenhuma das ligações.

Decisão do TJRN era por desocupação

Durante a manhã, o pleno de desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado negou o recurso dos manifestantes para permanecerem acampados no pátio da Câmara Municipal. A maioria dos magistrados acompanharam o voto do relator Caio Alencar e decidiram pelo cumprimento da decisão de desocupação. Na sessão, que se estendeu por mais de duas horas, houve divergências quanto ao horário da retirada e a utilização da polícia.

No total, treze dos quinzes desembargadores votaram contra o recurso dos estudantes e fizeram valer a decisão do colega Dilermando. Saraiva Sobrinho e Cláudio Santos não acompanharam o voto do relator Caio Alencar e deferiram o recurso. Houve divergências quanto ao horário de cumprimento da decisão. A presidente Judite Nunes seguiu o voto da maioria e aprovou a desocupação para ocorrer até às 18h – três magistrados requeriam a retirada imediata dos estudantes.

Antes de entrar  no cerne do julgamento, os magistrados negaram outro pedido da defesa. Dessa vez, os manifestantes apontavam irregularidade no fato de o procurador-geral do município, Bruno Macedo, fazer parte do processo que pede a desocupação da CMN. Os desembargadores, em sua maioria, sustentaram a interferência como legal pelo fato de o procurador responder pelos interesses da cidade e não da Prefeitura.

“Espero que prevaleça o bom senso e a serenidade. A OAB estará até o último minuto buscando uma forma pacífica de desocupação”. A frase é do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Paulo Renato Teixeira, que intermedia o contato entre as partes envolvidas na manifestação. Para ele, a decisão do STJ dá mais tempo para prevalecer o diálogo na resolução do conflito.

Tarde foi de preparativos para resistir à PM

Clima de despedida. Assim foi a  tarde de ontem na Câmara Municipal do Natal, onde os manifestantes ocupam o pátio interno da Casa desde a terça-feira (7). Depois da decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, os manifestantes discutiram desde formas de dificultar a possível ação da Polícia Militar em desocupar o local, até no habeas corpus que ainda não havia sido julgado pelo Superior Tribunal de Justiça, garantindo a permanência do grupo na CMN. A única convicção que os integrantes tinham era de que o movimento, mesmo que tivesse acabado ontem, já teria entrado para a história.

Mantendo a rotina normal do acampamento, os manifestantes brincaram de peteca, tocaram violão e montaram a trilha sonora local com reggae e músicas que marcaram a época de resistência a ditadura, com composições de Chico Buarque e Geraldo Vandré. Alguns membros do movimento discutiam formas de dificultar a desocupação, planejando uma corrente humana e até cantar o hino nacional quando a Polícia Militar entrasse no pátio da CMN. Aos poucos e com o passar das horas, a CMN ia recebendo cada vez mais gente. Eram líderes políticos, populares e sindicalistas que chegaram para apoiar os manifestantes.

O ex-vereador e professor Hugo Manso foi um dos que elogiou a atitude dos manifestantes em protestar na CMN. Relembrando a ocupação da Reitoria da UFRN em 1984, quando quase 800 universitários invadiram o prédio para protestar contra o aumento do preço do bandejão no restaurante universitário e permaneceram por seis dias acampados, o petista disse que a iniciativa do grupo mostra a união em torno de um objetivo comum, que é mostrar a insatisfação com a Prefeitura e cobrar investigação aos contratos firmados na gestão de Micarla de Sousa. “São várias tribos reunidas aqui, gente de classe média, mostrando que o movimento é plural. Já é um marco na história da cidade, seja lá o que venha a acontecer”, disse Hugo Manso, que também aproveitou para disparar contra o presidente da CMN, Edivan Martins. “É uma incompetência política sem precedentes. Discutiu com os manifestantes, todos gostaram da conversa, mas depois levou uma ‘chave de roda’ e voltou no que havia combinado”, criticou.

Mesmo com as conversas demonstrando que o movimento faria de tudo para permanecer no pátio da CMN, os ânimos só ficaram exaltados quando restavam 30 minutos para as 18h, prazo dado pela Justiça potiguar para que o grupo deixasse o prédio. Cantos contra a prefeita foram entoados, na maioria com bom-humor e nenhum com mensagens pejorativas. A ordem era “persistir e resistir” depois que houvesse a notificação oficial para a desocupação.

No entanto, quando o oficial de Justiça chegou ao Palácio Padre Miguelinho, acompanhado por três policiais militares, e informou a decisão judicial, já era tarde. A notícia sobre a resposta positiva do STJ já havia sido repassada aos manifestantes, que comemoravam a chance de permanecerem no prédio pelo menos até nova decisão da Justiça – ou o cumprimento das reivindicações.

- Publicidade -
Últimas Notícias
- Publicidade -
Notícias Relacionadas