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“Temos dois gargalos principais: a infraestrutura e o capital humano”

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A economista Zeina Latif estará em Natal, no próximo dia 24 de abril, para fazer palestra sobre ‘Oportunidades no Atual Cenário Econômico’. Em entrevista à TRIBUNA DO NORTE, ela falou sobre momento atual da economia brasileira, reforma da previdência e sobre o mercado de investimentos, além da atual conjuntura nos bancos e mercado financeiro. Zeina aponta dois gargalos principais no País: a infraestrutura e o capital humano.  Confira a entrevista.

Economista Zeina Latif

A economista Zeina Latif fará palestra em Natal, no próximo dia 24 de abril, sobre ‘Oportunidades no Atual Cenário Econômico’

A aprovação da Reforma da Previdência é um passo para economia do Brasil decolar?
A Reforma da Previdência é o alicerce do crescimento. Não é isso que vai fazer o país voltar a crescer como o resto do mundo, não é isso que de fato vai gerar uma aceleração de crescimento em relação ao patamar atual, na casa de 1%, mas é o alicerce. Por que? Porque sem a reforma da previdência a gente não vai ter perspectiva de resolver o nosso problema fiscal, a dívida pública que está em trajetória de elevação nos últimos anos vai assim seguir e já estamos em patamares elevados muito acima de países parecidos com a gente, então é uma questão de tempo a gente voltar a ter problema inflacionário, desconfiança dos investidores, pressão cambial, e obviamente isso gerando inflação e Selic elevada. Se a gente volta a ter um quadro como esse, que lembra o quadro com a Dilma, que a gente não sabia para onde ia o dólar, a inflação, não existe como discutir crescimento no país. Por isso chamei de alicerce. Então a Reforma da Previdência é a espinha dorsal do ajuste fiscal, e o ajuste fiscal é o elemento chave pro país sedimentar esse ambiente para o crescimento econômico. Só isso não é suficiente, mas já é um passo muito importante.

Qual o principal gargalo que o país enfrenta na atual conjuntura econômica?
O Brasil tem dois gargalos principais. O mais gritante é o da questão da infraestrutura. Nós fizemos muitos investimentos equivocados no país, a gente viu um país construindo estádio olímpico, fazendo proteção de política de campeões nacionais do BNDES, muito intervencionismo estatal reduzindo apetite de investimentos no Brasil, tudo isso obviamente acabou implicando no baixo investimento em infraestrutura. Claro que aqui eu estou falando do setor público e do setor privado. O setor público reduziu muito o investimento e o que teve foi de baixa qualidade. O setor privado um desinteresse em investir por causa da confusão regulatória, a insegurança jurídica no Brasil, o ambiente econômico e instável, quer dizer por uma série de fatores. Esse é um tremendo gargalo. O segundo gargalo é o capital humano. A baixa qualidade da nossa mão de obra. Nós temos apesar de ter investimento em educação, a gente gasta 6% do PIB, mesmo assim os nossos indicadores de escolaridade são muito ruins, mostram que a gente está gastando mal esse recurso da educação. Um número que chama atenção é que algo que 65% dos nossos jovens não tem uma formação técnica ou acadêmica, 70% dos nossos jovens do ensino médio não sabem a matemática básica, 23 % dos jovens que nem trabalham e nem estudam, então essa questão do capital humano é um gargalho. Uma grande reclamação das empresas, que dependem de mão de obra mais treinada, é que mesmo com a taxa de desemprego elevada tem dificuldade de encontrar mão de obra qualificada. Estes dois gargalos são cruciais.

Como é o mercado de investimentos hoje no Brasil?
Quando a gente olha investimentos de longo prazo no Brasil, claramente nós estamos perdendo oportunidades. Tem até um volume de recursos importantes de investimento direto estrangeiro, teve queda é verdade, mas a gente observa que o grosso dos recursos que vem pra cá não são ‘green fildes’, quer dizer, são para aquisição e não para começar uma planta nova. Além disso, esse investimento que vem direto para o Brasil não é mais, é menos que 10% do investimento total. Certamente o Brasil poderia está atraindo mais investidores estrangeiros. As cifras, olhando em termos absolutos, parece um número razoável, mas quando a gente olha nos detalhes são valores modestos. Sobre investimento de curto prazo, existe um compasso de espera em relação da reforma da previdência e porque é um país que não está crescendo. Existe um receio de aumentar risco, como foi em 2017 no governo Temer. Estamos muito a quem do que poderíamos estar. Agora é importante colocar que houve uma redução de estrangeiros na aquisição da dívida pública. Não estamos conseguindo atrair capitais como seria o necessário.

O modelo do sistema bancário está fadado a mudar?
Os bancos enfrentam uma regulação bastante dura no Brasil. O Brasil tem regras prudenciais para dar segurança ao sistema que são mais rígidas em comparação com o resto do mundo. Isso por se só já coloca um pouco peso muito grande nos bancos com custos elevados. A outra questão é o crédito direcionado, então a gente tem uma participação importante de crédito com taxa subsidiada e isso faz com que a outra parcela do crédito livre acabe tendo de fazer um subsídio cruzado. Então as taxas de juros acabam ficando mais elevadas no crédito livre para compensar o crédito direcionado. Isso também atrapalha as funções do banco. Temos também uma tremenda insegurança jurídica no mercado de crédito, que faz com que a capacidade de recuperação de ativos no caso de inadimplência seja muito baixa. Então empréstimo com garantia na hora que ocorre a inadimplência, os bancos no Brasil conseguem recuperar apenas 14% daquilo que foi emprestado. Nos países do CDE a recuperação é de mais 70% e nos EUA mais de 80%. Todos esses fatores fazem com que os bancos acabem desviando de sua função de emprestar. Os lucros dos bancos acabam vindo muito mais de outras atividades de serviços, as próprias taxas de serviços e as tarifas do que na sua função de conceder crédito. Outra coisa que precisa ser levada em consideração é que o tal custo Brasil, que impacta todo esse sistema, impacta também o setor bancário por isso a concentração. A concentração bancária ela é fruto do custo Brasil. Pra você ser competitivo você precisa ter escala pra diluir esses custos e a gente vê isso na economia como um todo. A gente vê muitos bancos estrangeiros que chegam no Brasil e acabam desistindo.

Quais os cenários da economia são mais promissores para se investir?
Quando a gente fala em investimento produtivo, precisa se vê um ambiente macroeconômico previsível, vê se tem ideia, um quatro econômico muito volátil, você obviamente inibe investimentos. Você tem que ter um ambiente regulatório que também de dê segurança para ter a certeza que não terá problemas no futuro. A terceira questão é que precisa ter oferta de crédito, situação que os investidores tenham acesso a crédito para poder investir. Um sistema de crédito mais eficiente. Um mercado de capitais ágil. A instabilidade das regras, previsibilidade das regras, das regras inclusive não só regulatórias, mas tributárias, ambientes macroeconômicos, são ingredientes essenciais para a gente vê aumento de investimento produtivo no país. O papel do mercado financeiro é fazer essa intermediação, mas sem dúvida há um potencial que a gente precisa explorar e que ainda não está fazendo muito bem.

O brasileiro culturalmente não investe muito?
O brasileiro poupa pouco, de uma forma geral a taxa de poupança é baixa. Uma possível explicação para isso é o próprio previdência pública que a gente tem. A taxa de reposição de quanto você vai ganhar depois que se aposenta, e muitas pessoas que acumulam a aposentaria com salário, isso gera uma baixa poupança. Essa segurança de uma aposentaria no Brasil pode ser uma das rações das pessoas pouparem pouco. Outra questão é a falta de educação financeira. Estamos num país que as pessoas mal sabem matemática, muito menos vão saber de educação financeira para se planejar para aposentadoria. Uma visão de curto prazo e muitos acham que a previdência vai garantir recursos e tudo isso faz com que a taxa de poupança muito baixa. Antes de pensar sobre investimento, temos que pensar em fazer o brasileiro poupar mais. 

Quem
Zeina Latif, é doutora em economia pela Universidade de São Paulo (USP) e economista-chefe da XP Investimentos. Trabalhou no Royal Bank of Scotland (RBS), ING, ABN-Amro Real e HSBC. Escreve colunas semanais para o Broadcast da Agência Estado.
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