Sara Vasconcelos
Repórter
O turismo no Rio Grande do Norte abre novas perspectivas com a entrada no segmento de resort. Com investimentos de R$ 100 milhões, o Grupo português Vila Galé lança neste sábado (04), as obras do Vila Galé Touros Hotel Resort, na Praia de Touros, a 84 quilômetros de Natal. Com redução de receita e ocupação, a projeção é de retomada de crescimento de longo prazo. “Essa retomada de economia depende da retomada de confiança que não acontece de uma hora para outra. Sabemos que vai acabar. Mas pode ser mais breve se o país fizer o dever de casa, a começar pela reforma política”, observa o presidente do Grupo Vila Galé, Jorge Rebelo de Almeida. O novo resort deverá ser o maior do estado com 514 quartos, três restaurantes, spa, centro de convenções, piscinas e quadras multiusos. A expectativa é de geração de 300 empregos diretos, na fase inicial de operação, e 1 mil indiretos. Com abertura prevista para setembro de 2018. A solenidade de pedra inaugural ocorre no local onde será erguida a oitava unidade hoteleira do Grupo, no Brasil. Na última terça-feira (31), Rebelo falou com exclusividade para a TRIBUNA DO NORTE e detalhou os planos de investimentos, projeções para 2017 e analisou o turismo no Brasil, que segundo ele, ainda é pouco aproveitado e priorizado como estratégia de desenvolvimento.
Eis a entrevista:
O ambiente de negócios aqui no Rio Grande do Norte é atrativo para o investidor?
Assim que cheguei aqui para anunciar o investimento ano atrás, havia muito questionamento, parecia que as pessoas estavam jogando contra. Ora, eu sei do investimento que vou fazer. Nas épocas de crise, fomos muito bem recebidos no Brasil. Nos órgãos outros aqui, demorou bastante para conseguir a licença. Precisamos mudar a área. Começamos em outubro de 2015 e conseguimos em dezembro de 2016. Há muita burocracia. Mas tivemos apoio do Idema no sentido de orientar no que devíamos fazer, o que foi bastante positivo essa colaboração, quando definiu o projeto para ter a melhor solução para a preservação ambiental e paisagística.
Isso atrasou o início das obras?
Sim, a demora pra obtenção das licenças levou bastante tempo. Mas isso ocorre em todo o Brasil, em Cumbuco levamos muito mais tempo. E na Praia do Futuro, o primeiro no Brasil, foi o mais rápido muito pela questão da gestão. O governo e o Idema aqui também agilizaram, mesmo tendo a burocracia.
No sábado (hoje) haverá a inauguração da pedra, mas quando as obras iniciam de fato e quando começam a operar?
Já começou, fizemos a terraplenagem, já começamos a construir o muro, o canteiro. Devemos levar 18 meses de obras e inauguram em setembro de 2018. Este é um hotel com 514 quartos, quatro restaurantes, um spa Satsanga de padrão internacional, quadras poliesportivas, três piscinas externas, o nosso maior Centro de Convenções com capacidade para 1.500 pessoas.
É o primeiro resort do Estado. Isso deve influenciar de que forma o turismo potiguar, que tipo de perfil de turista deve atrair?
Muda o perfil, porque vai atrair um perfil que é do cliente de resort no estilo all inclusive (tudo incluído). No Ceará também tem só um resort que é nosso, que estamos também ampliando. Lá tem o Beach park e um resort pequeno. E nós fazemos uma oferta muito consistente de ‘all inclusive’, com famílias, que foi muito bem aceita. Antes havia uma dificuldade muito grande da classe média ir a resort porque se cobrava R$ 1,2 mil por diária com acomodação e café da manhã apenas. E nós democratizamos, conseguimos oferecer por um pouco menos deste valor todo a estrutura no sistema all inclusive, não na alta estação. Isso faz com que a nossa ocupação nos resorts se mantenha. A única coisa que está fora do all inclusive é o spa.
Qual o plano de investimentos do Grupo, há outros empreendimentos previstos para o Brasil?
A abertura de Touros vai ajudar a consolidar a nossa posição como a maior rede de resorts do Brasil. Estamos com investimentos de R$ 100 milhões. Fora isso estamos ampliando o resort de Cumbuco (CE) com a abertura de mais 72 apartamentos. E em Portugal, vai inaugurar quatro novos hotéis nas cidades de Porto, Sintra, Braga e Elvas.
Quantas vagas serão geradas aqui no Estado?
O hotel numa fase inicial deve trabalhar com 300 pessoas, 300 empregos diretos, podendo chegar a 450 quando estiver pleno. E cerca de 1 mil indiretos.
Vocês têm tido dificuldade em encontrar pessoal qualificado para trabalhar no novo resort?
Sim e isso acontece em todo o país. O Brasil como um todo tem muita necessidade de qualificação. Para um estado como o Rio Grande do Norte, que tem essa vocação turística, penso que é muito importante ter uma escola de gestão hoteleira. O Ceará começou as obras, mas parou. É preciso entender que, em qualquer área, em qualquer país para dar um salto em desenvolvimento tem que se investir em educação. É primordial. Nós temos no Vila Galé o projeto Academia Vila Galé de formação contínua. Em que os funcionários aproveitam as horas vagas de trabalho para receber formação. Para este hotel aqui [em Touros] esperamos junto ao Governo do Estado e a Prefeitura qualificar por meio de cursos e capacitação cerca de 600 pessoas, número maior do que o que iremos absorver como emprego direto. Mas esta qualificação poderá proporcionar que a pessoa consiga trabalho na cadeia do turismo, em outros empreendimentos. Como fizemos no Cumbuco (CE), mais de 800 e aproveitamos menos que isso. Na Bahia também com a parceria. E no turismo as pessoas evoluem muito.
Como foi 2016 para os negócios do Grupo Vila Galé no Brasil? A crise afetou os negócios?
Entre Portugal e o Brasil houve uma diferença grande. Enquanto tivemos um ano fabuloso no turismo em Portugal, aliás os dois últimos anos, depois de quatro anos anteriores ruins. No Brasil tivemos queda, não nos nossos resorts de praia que não tem sentido muito devido a um fenômeno de compensação aqui de que os turistas que antes viajavam para o exterior, devido a crise e a desvalorização do real frente ao dólar, estão fazendo turismo doméstico. E isso acabou sendo bom para os nossos resorts de praia. No Brasil estamos sentindo dificuldade em nossos hoteis de cidade como o de Salvador está em queda, o de Fortaleza também caiu, o nosso hotel do Rio de Janeiro teve um ano fraco com apenas um aspecto positivo com as Olimpíadas, o que salvou o ano lá. O hotel do Rio de Janeiro é muito bonito, restauramos um antigo palácio, na Lapa, na parte histórica. E eu tenho muito orgulho do Vila Galé ter dado essa contribuição para a restauração dessa parte do Rio. Lá, com a Copa e com a Olimpíadas, aumentou muito o número de leitos nos últimos cinco anos, triplicou praticamente e está com uma oferta enorme.
Essa queda na ocupação é de quanto? E como reflete no faturamento?
Nós tivemos uma queda tanto em ocupação, quanto em faturamento. Em Salvador e Fortaleza chega a 15% em relação ao ano passado. A ocupação e a receita acabam andando juntos, a não ser quando a gente consegue subir os preços, mas como a situação no Brasil não está boa não temos como pensar em aumentar os preços. Ao contrário, os nossos resorts tiveram que nesse período não ajustar. Na Bahia, no Ceará e no Rio de Janeiro, onde temos um resort em Angra dos Reis, este teve um bom ano com 72% de ocupação em 2016.
Qual foi o faturamento do grupo Vila Galé em 2016?
Em Brasil e Portugal o faturamento foi de 170 milhões de euros, no Brasil ficou com R$ 280 milhões.
Quais as projeções para 2017, deve ser de aquecimento ou recessão para o turismo?
Eu receio de que, como a crise aqui não dá sinais de passar, nós tenhamos queda ainda este ano. Este início de ano já dá sinais negativos, todos os nossos resorts vão fechar janeiro com menos ocupação e menos receita do que no ano passado, em pelo menos 10%. Exceto o Angra dos Reis que tem um bom desempenho. Essa retomada de economia depende da retomada de confiança que não acontece de uma hora para outra. Sabemos que vai acabar. Mas pode ser mais breve se o país fizer o dever de casa, a começar pela reforma política e moralização, retirar essa imagem de envolvimento em corrupção.
Essa queda no faturamento e ocupação se deve somente a crise econômica ou há outros fatores que puxam esses números para baixo?
Não é só a crise. O turismo no Brasil não é tratado como deve ser. O turismo poderia ser um setor da atividade econômica para alavancar muito o crescimento e o desenvolvimento. O Turismo tem várias frentes: indústria da paz, quando se constrói um hotel fica no local para sempre, e o mais importante é a geração de emprego, em que as pessoas são qualificadas. O Brasil tem muita vocação para ser um país turístico, mas vemos outros menores, as vezes com menos recursos naturais e extensão que estão mais qualificados, estruturados e recebem muito mais turistas. Portugal é bem menor, pouco maior que o Rio Grande do Norte, e recebeu em 2016 17 milhões de turistas. A Espanha recebeu 60 milhões de turistas e é do tamanho da Bahia, mas isso porque um dos pilares de desenvolvimento de lá é o turismo. A República Dominicana que é infinitamente menor do que o Brasil tem mais turistas também, o Brasil recebe 6 milhões de turista por ano. O que falta para o Brasil é ampliar a malha aérea, ter estratégias que permitam isso, facilita a negociação com as companhias aéreas, é fundamental. O trecho de Madri para Cuba é muito mais barato do que o trecho de Madri para qualquer lugar no Brasil. Lisboa também. Porque há charteres. Depois um plano estratégico de longo prazo com aéreo, com a questão de insegurança pública, de reforçar a limpeza, a saúde pública e a segurança nessas áreas de turismo. Pode parecer injusto, mas acaba que isso reflete no longo prazo na melhoria e extensão desses benefícios não apenas para o turista como para quem mora no local. Um turista que vê na mídia fogueira humana e cabeças decepada em rebelião em presídio não vai querer vir para Natal, para Manaus. É preciso melhorar essa imagem negativa que é veiculada lá fora. Há reformas urgentes que o Brasil precisa fazer, precisamos de investimentos e eles vem do setor privado. Para atrair o investidor privado é preciso ter regras claras. Aqui, a tributação é algo que não se entende e nem dá para prever. Diferente dos outros países, não há uma regra clara, sem contar na burocracia para abertura de negócios. Além de cara, é burocrática, não há unidade de entendimentos, a administração fiscal no Brasil trata mal os investidores.