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Triste fim da pesca artesanal

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É noite. Junto a mais dois pescadores, Jodilson Claudino de Souza, de 23 anos, empurra a jangada à vela contra as ondas. Ao saltar sobre a pequena e frágil embarcação, faz o sinal da cruz. Pede proteção à Nossa Senhora dos Navegantes. Nessa vida do mar ele só tem a certeza de que vai. Não sabe se volta. Em tempos difíceis, de pouca quantidade de peixe, se apega ainda mais à santa protetora dos pescadores. Roga a ela por uma boa pescaria.

Manhã do dia seguinte. A jangada de Jodilson volta do alto mar, já quase na praia. De longe, ele ergue os braços, exibindo uma enorme guaiuba como se fosse um precioso troféu. Os pescadores fazem força para tirar da embarcação e levar até a areia os cordões de guaiuba, cioba e serra. A pescaria foi boa. “Quando a gente volta assim, dá graças a Deus, porque tem dia que não pega nem pra comer”, comemora Jodilson.

Após uma noite inteira no mar, às voltas somente com água e céu e munido apenas de vara e linha, ele tem motivo de sobra para estar eufórico, pois a vida do pescador artesanal nunca foi tão dura. Há uma reclamação geral quanto à diminuição acentuada na quantidade de peixes e espécies. Os pescadores artesanais culpam a utilização do covo, armadilha empregada pela pesca industrial. No entanto, por ser seletivo, esse método é considerado o mais ecologicamente e legalmente correto. E no mais a pescaria industrial se volta para o oceano, onde estão os peixes para a exportação — o atum é o carro-chefe do RN.

O desaparecimento de muitas espécies está relacionado, de fato, à sobrepesca (demanda grande em relação aos estoques pesqueiros) e, principalmente, à devastação dos mangues. Segundo estudos de especialistas, 185 espécies de peixes, 86 tipos de aves, 51 tipos de crustáceos e 33 espécies de moluscos dependem do mangue para reprodução e alimentação.

Com a devastação criminosa praticada há anos contra esse ecossistema no Rio Grande do Norte — para dar lugar a construções, salinas, atividade agrícola, carcinicultura e usinas — não é de admirar a diminuição da quantidade de peixes e espécies. “Esse processo tem levado ao desastre ambiental dos estuários”, diz o assessor especial da Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca (Seap), Antônio Alberto Cortez.

Profundo conhecedor da atividade pesqueira — no governo FHC ele percorreu da Amazônia ao Rio Grande do Sul para desenvolver o Plano Nacional de Pesca Artesanal — Cortez trabalha no momento para finalizar um diagnóstico no RN.

Reunindo importantes dados sobre aspectos sócio-econômicos, o trabalho será entregue brevemente à Governadora Wilma de Faria, com o objetivo de nortear políticas públicas visando ajudar as colônias e o desenvolvimento da pesca artesanal, atividade praticamente estagnada no Estado, segundo Cortez. Já as famílias de pescadores vivem com bastante dificuldade, muitas em situação de grande pobreza. O alto índice de analfabetismo entre eles é um dos principais problemas — 80% não sabem sequer ler e escrever.

Pescadores perdem espaço

Não bastassem as dificuldades do mar, os pescadores da Redinha estão tendo que enfrentar um obstáculo em terra para poder exercer a atividade.

É que os ambulantes estão ocupando a areia da praia com mesas e cadeiras, tirando o espaço das embarcações. Cedinho, os pescadores saem para o mar, mas ao retornarem não conseguem desembarcar porque o espaço já está tomado por banhistas e turistas, sentados às mesas.

O problema é maior no fim de semana, quando o movimento cresce. A ocupação tem gerado discussões entre os pecadores, que se dizem prejudicados, e os ambulantes.

O pescador Enélio Pinto da Costa, 40, diz que ninguém consegue ir mais para o mar no fim de semana. “Se for, não tem como voltar”, reclama. Ele conta que a situação, que já dura alguns meses, está ficando insustentável.

“A colônia de pescadores de Natal está sabendo e ficou de procurar o órgão competente para resolver, porque isso (cadeiras e mesas na areia da praia) não é permitido que eu saiba”, disse Enélio.

O pescador Luiz Gomes de Andrade, 37, confirma o problema. Ele disse que já não está mais indo para o mar nos domingos. “A pesca já está difícil, e agora mais essa. E se você for reclamar, eles (os ambulantes) eles não gostam”.

Pescadores das colônias do RN chamaram a atenção para a situação da pesca artesanal no Estado em ato público realizado na última semana e entregaram aos governos estadual e federal uma pauta de reivindicação com 19 pontos. A TN publica abaixo algumas das exigências.  

1 – Incluir o pescado na cesta básica e na merenda escolar

2 – Tornar realidade a assistência e a extensão agrícola-pesqueira

3 – Desburocratizar os trâmites para a liberação de créditos aos pescadores

4 – Viabilizar o Programa de Equalização Econômica do Óleo Diesel

5 – Redefinir a política para a exploração de espécies ameaçadas de extinção

6 – Disciplinar e ordenar o uso das águas públicas continentais, considerando as particularidades eminentes a cada bacia e/ou corpo d’água

 

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