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“Tudo piora durante a Copa”

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Cidades lotadas e “caras” durante a Copa do Mundo de Futebol deverão, em vez de catapultar, reduzir o interesse dos turistas estrangeiros pelo Brasil em 2014, prevê o vice-presidente da companhia área portuguesa TAP, Luiz da Gama Mor. Em entrevista concedida à TRIBUNA DO NORTE esta semana, ele expôs o que enxerga como lado negativo do evento, criticou o endividamento público para realizar o mundial e disse que a construção de estádios não vale o investimento. Eleito em 2011 um dos 50 homens mais poderosos do Turismo pela Panrotas, publicação especializada no setor, o vice-presidente da TAP, que é brasileiro, também critica a onda de concessões de aeroportos no Brasil e diz não enxergar força no aeroporto de São Gonçalo do Amarante para competir com aeroportos em estados vizinhos. Essas e outras análises estão na entrevista a seguir, concedida durante o 4º Fórum de Turismo do Rio Grande do Norte. No evento, realizado nos dias 13 e 14 em Natal, o executivo proferiu a palestra “Nordeste – o portão de entrada do turista europeu”.
Luiz da Gama Mór - vice-presidente da TAP
O senhor viajou pela TAP até o Nordeste e desembarcou no aeroporto Augusto Severo. Como avalia a estrutura do aeroporto?

Eu considero normal. Não vi nenhum problema.

Os nossos aeroportos, de uma forma geral, estão muito longe, em termos de estrutura, dos aeroportos da Europa?

Não. Não estão. O que ocorre é que o crescimento do turismo se dá numa velocidade maior do que o investimento nos aeroportos. Um aeroporto demora, muitas vezes, dez anos para ficar pronto. São situações que muitas vezes criam constrangimentos nos aeroportos. O problema maior do Brasil não é a realidade dos aeroportos. Os aeroportos do Brasil sempre foram muito bons. O problema do Brasil é que os aeroportos ficaram de repente pequenos. Todo o drama do Brasil é o tamanho dos aeroportos. O de Natal não deve ser dos piores. Sei que Rio, São Paulo, Santos Dumont, Congonhas, Guarulhos, Galeão, Brasília estão com bastante dificuldades.

O RN ganhará um novo aeroporto, o de São Gonçalo do Amarante. Espera-se que ele se transforme num hub (centro de conexão) de cargas e passageiros no país. O que ele precisa para se transformar na porta de entrada de estrangeiros no país?

Onde fica este aeroporto?

A poucos quilômetros de Natal, na esquina do Rio Grande do Norte e do país…

E aí fecham o Augusto Severo?

Fecham para operações comerciais. Está no contrato.

Deixa eu dizer assim: avião não é que nem passarinho. Passarinho se você botar um pote de alpiste, ele desce e come o alpiste. Avião não é assim. Não é por causa do aeroporto … Tem que ter tráfego, tem que ter fluxo. E Natal compete com, por exemplo, Recife, para ser um hub. Quando eu era diretor da Varig, fizemos de Recife o hub do Nordeste, o que fazia muito mais sentido. Pernambuco tem crescido barbaramente, do ponto de vista econômico. O Ceará tem feito um trabalho muito maior do que Natal. Eu não acredito que no curto prazo Natal possa se transformar num hub maior que esses outros. Não acredito.

E se grandes companhias aéreas se interessassem pelo projeto?

Uma empresa colocada no estrangeiro tem hub lá, não precisa ter hub aqui. Este é o nosso caso. Quando a empresa é daqui, ela tem que capturar gente do país inteiro, criar um hub para levar. A TAP tem o hub na sua casa. Não precisa construir hub na ‘casa dos outros’. O que tem que acontecer em Natal é que o Rio Grande do Norte precisa crescer como destino turístico, mas isso não depende dessa competição específica.

O presidente da TAP diz o que considera negativo do evento e critica o endividamento público para realizar a Copa do MundoO aeroporto de São Gonçalo do Amarante foi o primeiro no Brasil a ser concedido à iniciativa privada através de leilão. Como a TAP enxerga a privatização dos aeroportos brasileiros?

Eu não sei como a TAP enxerga, mas posso responder como eu enxergo. É muito importante fazer essa separação, porque eu sei que tem opiniões diferentes, inclusive dentro da minha direção da TAP. Minha opinião é: eu compreendo que pode não haver alternativa melhor, mas eu não gosto. Sou uma das poucas pessoas que diz que não gosta. Por que não gosto? Eu não gosto de monopólio privado. O aeroporto é monopólio. Quando é monopólio, prefiro que seja público. É muito melhor monopólio público do que privado. O que está acontecendo no Brasil é que a privatização está sendo a única saída para os aeroportos brasileiros. A história que está por trás é a seguinte: nós falhamos. Porque na realidade a Infraero era bem gerida há muito tempo atrás. A Infraero foi mal gerida nos últimos anos, devido a muita influência política. Isso destruiu a Infraero e a sua credibilidade. O próprio governo federal não confiou na Infraero para colocar o dinheiro necessário nos aeroportos, até que chegou ao ponto de precisar de muito dinheiro para tantos aeroportos e ter um prazo pequeno – porque tem a Copa do Mundo – e tiveram que pedir ajuda para a iniciativa privada. Eu particularmente não gosto disso.

A TAP está para ser privatizada, e segundo Sérgio Monteiro, secretário nacional dos Transportes de Portugal, o processo só poderia ser relançado depois que se encontrasse uma solução para os prejuízos causados pela operação de manutenção e engenharia da companhia no Brasil, que já somariam, segundo a imprensa portuguesa, 300 milhões de euros (R$ 774,12 milhões, considerando a cotação do último dia 15).

A operação de manutenção no Brasil está dando prejuízo, mas está numa recuperação muito acelerada. Então estamos muito otimistas com a manutenção no Brasil e ela não é impeditivo para a privatização. A dificuldades para a venda da TAP não estão na TAP. A dificuldade da venda da TAP está colocada nos potenciais compradores e no momento econômico que estamos vivendo. Os potenciais compradores estão tendo prejuízo e a economia está em recessão, sobretudo a economia portuguesa. Então não um é momento favorável, do ponto de vista econômico. Agora o interesse do governo é dar uma solução para isso num prazo tão rápido quanto o possível.

Há rumores de que empresas brasileiras como a TAM estariam interessadas em comprar a companhia. Há brasileiras interessadas?

Não posso dizer.

O senhor proferiu palestra sobre o Nordeste como porta de entrada dos estrangeiros. O fluxo de turistas internacionais caiu no país como um todo – no RN, não foi diferente. Há perspectivas de retomada?

Vai depender do câmbio. O Brasil está muito caro. E para esse preço de Brasil, o produto tinha que ser melhor. E o produto não está melhor, e em alguns aspectos está pior. Existe uma certa deterioração da hotelaria, uma certa deterioração das cidades. O destino, comparativamente com os destinos competidores, piorou, em compensação está mais caro. Então com essa lógica vai ficar muito difícil. Ou se mantém com certa dificuldade ou se faz uma alteração. Agora para fazer uma alteração substancial uma de duas coisas tem que ocorrer: ou se melhora muito e para valer o produto ou cai o preço. E aí depende de câmbio.

A Copa não ajuda a reverter esse cenário?

Vamos lá. Novamente eu vou responder algo polêmico. Durante a Copa tudo piora. Os fluxos turísticos ficam menores. Os aviões ficam mais vazios. Durante a Copa é assim, porque todo mundo que não viria para Copa é aconselhado a não vir, desde já. O pessoal diz: “não vai para o Brasil durante essa época, porque com a Copa tudo vai estar cheio e os preços vão estar altíssimos”. Os próprios operadores dizem isso. O pessoal que não está interessado em futebol não vem para cá nessa época. Adia para o mês seguinte. E os brasileiros durante a Copa preferem não voar. Ficam em casa para ver os jogos. Deixam para viajar depois da Copa. Isso aconteceu em Londres, com as Olimpíadas. Existe menos turista durante a Copa, do ponto de vista do fluxo externo, do que fora da Copa. As pessoas perguntam: “mas quantos voos você vai colocar a mais?”. Eu respondo: “tomara que eu consiga manter os voos durante a Copa”. Imagina que dos países que podem ficar em Natal para jogar um seja europeu. Eu posso ter um aumento de fluxo desse país, mas de todos os outros ninguém vem para cá. Quer dizer se a França está em Curitiba, o fluxo francês vai para Curitiba e não para Natal e hoje eu tenho um fluxo francês para Natal, que é para fazer feiras. Esses não virão. Ou irão para outro lugar ou adiarão a viagem, porque Natal durante a Copa vai ficar muito caro. A Copa do Mundo não é uma coisa necessariamente boa. Ela traz um endividamento para o país muito grande. E traz uma ressaca do outro dia. Fica todo mundo nesse oba oba e termina a Copa e nós temos uma conta para pagar durante uma geração. O que pode  e necessariamente será bom – e acredito que vá ser muito bom no caso brasileiro – são os investimentos que se fazem. Não os investimentos para a Copa, mas para o país. Eu não falo estádio. Estádio não serve para nada. Serve só para Copa e depois não serve mais para nada. Estádio não se paga, nunca. Não vale o investimento. O que vale são os investimentos que se faz em infraestrutura. Isso é uma maravilha. A Copa é uma grande oportunidade – e eu estou percebendo que o Brasil está sabendo aproveitar essa grande oportunidade – de dar salto de qualidade na infraestrutura. E é uma grande oportunidade de promoção. O importante da Copa é o depois da Copa, que não é futebol. Saber usar a promoção e melhorar a qualidade de tudo que precisa melhorar. As ruas, os viadutos, as estradas. Não sei o que Natal está fazendo para melhorar a infraestrutura para Copa, mas deve estar fazendo muita coisa. É isso que vale.

Resultados e planos da TAP para o RN?

Divulgamos os balanços agora. Foi o quarto ano consecutivo de lucro da companhia. Fomos uma das poucas empresas do mundo que tiveram lucro, pelo menos da Europa e América, e continuamos tendo. Pequenos, mas continuamos tendo. Planos para o Rio Grande do Norte? Quando iniciamos os voos, nosso objetivo era ter voos diários. Foi assim que ocorreu com Fortaleza. Mas na realidade houve uma inversão muito grande no fluxo do turismo. O Brasil passou a ter uma moeda cara e o turismo de lá para cá caiu. Nós conseguimos continuar crescendo na maior parte de nossos voos. Natal tem uma emissão mais fraca do que Fortaleza e Recife. Uma cidade menor que tem uma emissão mais fraca. Então estamos conseguindo manter os voos que já temos, e no curto prazo é esse o nosso objetivo. Nós gostaríamos que houvesse um relançamento da promoção do Brasil no exterior, principalmente com a reabertura dos escritórios da Embratur na Europa. O fechamento foi muito duro para nós. O problema do aumento ou diminuição da oferta depende da demanda. Se houver passageiros, haverá assentos. O problema não é a oferta, são os passageiros. Natal não tem que pedir mais voos, Natal tem que conseguir mais turistas. Hoje são quatro voos por semana. É preciso fazer por onde a companhia  tenha demanda. E isso Natal não faz.

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